sexta-feira, setembro 11, 2009

RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - A Viagem

A minha primeira casa em África ( 1950 - 1955)

A floresta bordejava a estrada de terra batida e, por vezes, um macaco que saltava de um ramo para outro, um pássaro que, assustado, batia as asas e fugia ou um antílope que atravessava a pista, eram "novidades" que me faziam esquecer o desconforto e a dureza do transporte.
Quando parávamos em alguma aldeia, os nativos logo se aproximavam com cachos de bananas, ananases, ovos e outros produtos que ofereciam esperando qualquer coisa em troca – cigarros, sal, ou qualquer bugiganga. O motorista, um negro espadaúdo, sempre a sorrir, lá me ia pondo ao corrente dos usos e costumes daquela gente, no seu francês mascavado...
Seria fastidioso descrever toda a viagem...
Parámos em Samba, numa plantação de café de portugueses e logo a seguir atravessámos o rio Maringa com a camioneta sobre uma jangada movida por doze remadores que subiam primeiro contra a corrente e depois desciam em direcção à outra margem.
Chegámos ao destino a meio da tarde. Uma viagem um pouco longa e desconfortável, mas à qual os meus 24 anos enfrentaram com alegria e espírito de aventura.
À chegada, um homem branco, magro, de cabelos brancos, esperava-nos, sentado numa cadeira de verga, numa varada de uma casa coberta com uma espécie de colmo – a minha primeira casa sob os trópicos, longe de tudo, mas da qual guardo ternas recordações e cuja fotografia, velhinha, podem ver no começo desta crónica.
À volta um grande terreiro rodeado de seringueiras, e uma sebe de arbustos de cambiantes variados, como todas as plantas espontâneas que nascem nas densas florestas tropicais. A nossa chegada devia ter sido anunciada, dada a recepção que tivemos: muitos negros, homens, mulheres e crianças rodearam-nos e não paravam de gesticular e trocar impressões numa língua que eu não conhecia...
Seguiram-se as apresentações e a visita aos meus futuros aposentos. A casa tinha dois quartos, uma cozinha e um grande salão. A casa de banho estava no exterior da casa e vale a pena fazer a sua descrição: Imaginem um pequeno espaço redondo com um raio de dois metros com uma vedação de paus entrelaçados e folhas a tapar a vista; uma foça árabe que servia para satisfazer as necessidades fisiológicas e, lá no alto um balde de zinco com um crivo no fundo e um cordão que tinha a função de abrir uma válvula e fazer com que a água saísse – era o chuveiro!...
Na casa, a mobília, era a mínima necessária: nos quartos uma cama tosca com o imprescindível mosquiteiro, janelas todas com rede, sem portadas e nada mais; no salão uma mesa, algumas cadeiras muito puídas e dois maples aos quais era impossível atribuir idade; na varanda uma mesa rudimentar e três ou quatro cadeiras de verga. Na parte de trás da casa e logo na pequena escada que dava para a "casa de banho", uma bacia de zinco sobre um cavalete de madeira, uma encardida concha onde repousava um pedaço de sabão azul e uma toalha pendurado num prego... Havia ainda um pequeno compartimento que servia de despensa e onde eu arrumei logo os alimentos que tinha comprado, enlatados claro: manteiga (holandesa, muito boa); queijo (holandês também) conservas (portuguesas) bacalhau (ido de Portugal em caixas de alumínio); azeite (português, Galo d'Ouro); sardinhas, carapau e atum, também embalados em Portugal e...um garrafão de vinho tinto "Nabão", além de outras coisas...
Foi assim a minha chegada a uma localidade mesmo sob a linha imaginária do Equador e dessa maneira mais um português se juntou a muitos outros espalhados pelos mais recônditos locais desse imenso território que era o Congo Belga, hoje República Democrática do Congo.

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