sábado, julho 26, 2008

Dia dos Avós

Diz-nos a história antiga que um famoso esculápio de nome Cláudio Galeno que foi médico particular do imperador Marco Aurélio, teria afirmado algures num dos seus opúsculos que um País em que, pelo menos, oitenta por cento da sua população não ria a bom rir, poderia ser considerado uma necrópole de seres vivos!
Depois de ter reflectido um pouco sobre o assunto e apesar de todas as palhaçadas a que temos assistido, verifiquei que entre nós o riso está em queda livre. Dos trinta por cento que que ainda riem, grande parte é constituída por políticos, futebolistas e trafulhas…
Ora como dizem que a “crise” chegou a todos os sectores da vida nacional ao ponto de nenhum oferecer confiança, e como possuímos um autêntico alfobre de contadores de anedotas que são os políticos, sabem do que me lembrei? Isso mesmo… De contratar alguns deles e de investir no mercado do riso! Ainda isento de IVA, sem necessitar de receita médica, além de ser ainda mais barato que os “genéricos”é também a melhor arma para enfrentar o dia a dia que cada vez se torna mais difícil de gerir.
E a propósito, um amigo meu que, nas horas vagas, se dedica ao estudo das antigas formas de humorismo, lembrava-me há dias aquela antiga frase francesa: «Les portugais sont toujours gais!...»
Aqui está mais uma razão para não deixarmos cair por terra os nossos pergaminhos, a nossa fama de outrora. Aliás, não podemos também esquecer que, em cada página da nossa História antiga, é raro não aparecer um humorista!... Isto para já não falar da nossa História recente em que todas as páginas são democraticamente hilariantes!...
Posto isto, pensei na criação de mais um curso universitário, onde se ensinassem apenas as várias maneiras de fazer rir o pagode…uma espécie de terapia do riso. Com todo o pessoal a rir, muitas coisas mudariam no país, sobretudo no capítulo da saúde. Não dizem que «rir é o melhor remédio?»
Há tempos, dizia-me uma netinha, falando do seu Avô: «Meu Avô riu sempre muito. À aproximação dos cem anos, começou a rir mais, e ria por tudo e por nada. E como o riso é contagioso, todos nós ríamos com ele e divertíamo-nos muito. Num Domingo acordou ainda mais sorridente e não foi possível fazer-lhe a barba de tal maneira o seu corpo era sacudido por acessos de riso que impediam qualquer aproximação da navalha de barbear. De tanto rir as lágrimas deslizavam em catadupas pelo seu rosto enrugado. Depois, cerca do meio-dia, começou a olhar-nos de uma forma estranha rindo a bandeiras despregadas. De repente, notámos que ele não se mexia. Foi o fim!... O meu Avô conservava ainda um sorriso nos lábios, mas ia já a caminho dos anjinhos… E choraram?... – perguntei eu. - «Então acha que íamos chorar por uma homem que morreu a rir? Rimos todos, porque foi a melhor forma de homenagear na morte, quem sempre riu em vida…»
Eis um grande incentivo para a criação do tal curso de terapia do riso de que acima falei. Negócio lucrativo… Aceito sócios com capital. O riso forneço eu.

terça-feira, julho 22, 2008

Obrigado

Permite, Senhor, que te dirija no dia em que completo mais um aniversário natalício este humilde, mas sentido agradecimento:
«Há mais de oito décadas que me concedeste o dom inestimável da vida. Desde que nasci nunca deixaste de me encher de graças e de me dar provas de amor infinito. Como acontece com toda a gente, estes anos foram anos em que muitas coisas se misturaram: alegrias, tristezas, sucessos, derrotas, pequenas faltas de saúde, desaparecimento de familiares…
Mas com a ajuda e o auxílio que me deste eu consegui transpor esses obstáculos e caminhar sempre em frente contigo ao lado.
Hoje sinto-me rico com a família que me deste e com a experiência que adquiri por sempre me teres protegido. Por isso e dentro de mim, numa religiosidade silenciosa, a minha alma canta o meu reconhecimento.
Todos os dias na minha roda de amigos encontro pessoas idosas que têm passado dolorosos momentos – homens que não podem andar, cegos, alguns estropiados que já não conseguem pedir-te qualquer coisa e outros que perderam as suas faculdades mentais. E eu olho essas gentes e pergunto-me: E se acontecesse comigo?!...
Perante isso, hoje mesmo, enquanto gozo de boa saúde e conservo todas as minhas faculdades mentais e motoras eu agradeço e ofereço-te antecipadamente toda a minha aceitação aos teus princípios e desde agora peço que se uma ou outra dessa situação me acontecer, eu a aceite resignadamente e ela possa servir e contribuir para a salvação de algumas almas.
Se um dia a doença invadir o meu cérebro e roubar a minha lucidez, desde já, Senhor, eu me ajoelho perante Vós e prometo uma humilde e silenciosa aceitação do que me reservares.
A partir de hoje peço também para protegeres todas as pessoas que, eventualmente, irão ter a ingrata missão de tratar de mim e de me ajudar em qualquer dessas enfermidades.
Perdoa-me e esquece os momentos em que blasfemei ou que não soube aceitar as provações por que me fizeste passar por não compreender os teus desígnios.
Se um estado de inconsciência prolongada tiver de me acontecer, eu quero que cada uma dessas horas que eu viver seja um seguimento ininterrupto de acção de graça, e que o meu último suspiro seja um suspiro de amor.
Faz então com que a minha alma guiada nesse momento pela mão de Maria, se apresente perante Vós para cantar e gozar das eternas graças.
Aos que ficarem dai-lhes coragem para suportar a minha ausência, pois um dia todos nos encontraremos de novo reunidos no milagre da ressurreição.
Obrigado, Senhor.»

Quatre vingt deux ans!...

«À 20 ans, j'avais tout mon temps,
La vie était belle, puis j'étais content.
Rien n'était trop dur, rien n'était trop haut,
Aux défis de la vie je levais mon chapeau.

À 30 ans j'étais encore un gamin !
Ah ! C'était facile, j'avais du temps !
Puis je m'amusais, je voyageais beaucoup
Faut dire que j'ai passé des heures de fous…

Mais à 40 ans, j’ai fallu tomber !...
On m’a pris tout un passé !...
Et il a fallu courir, regarder en avant
Pour ne pas rester au dernier rang.

À 50 ans, j'étais encore capable,
Mais j'suis devenu plus raisonnable.
Mon corps ralentit, fit quelques soubresauts
Pas question de vouloir monter trop haut !

Suis-je encore bon, suis-je encore fort ?
Je fais le possible, même contre le sort…
Aux nouvelles de 22 heures parfois je m'endors,
Sans compter des moutons et ce, sans remords.

À quatre vingt deux ans je veux être élégant
Mais mes yeux sont faibles, mes gestes plus lents…
Mes cheveux sont partis lentement,
Et la même sort ont eu mes dents !...

À quatre vingt deux ans j'écoute mon cœur :
Et il est tranquille et plein de bonheur!...
À quatre vingt deux ans ce que j'ai compris,
C’est que quand on a fait tout ce chemin,
En ouvrant la fenêtre le matin,
On doit penser à Dieu… et dire MERCI !...

(Inspirado no poema de Jean Gabin « Maintenant Je Sais», com uns pontapés na métrica aqui e ali…)
20 de Julho de 2008

sábado, julho 12, 2008

Meditações

Sinto que em cada dia que passa, alguma coisa muda em mim: os anos sucedem-se, os gostos da última estação já não são os mesmos desta. E quanto a amizades, umas secam outras renovam-se, fortalecem...
Antes da morte final deste ser móvel que tem o mesmo nome que eu, quantos homens já morreram em mim?
Se porventura me leres, amigo leitor, não penses que estou somente a falar de mim. Pensa um pouco e vê se não trata também de ti!...

domingo, julho 06, 2008

Metáfora




Quando sou confrontado com um problema numa das minhas máquinas e não sei resolvê-lo, para disfarçar a minha ignorância, coço a careca e com um franzir de sobrancelhas, solto a frase do costume: máquinas são máquinas!
E é justamente a propósito das ditas que hoje vou falar da minha. Da minha máquina. Da ambulante. É uma máquina antiga, não fora de moda, mas a pedir reciclagem... No tablier apenas o rádio lhe dá um tom de modernidade. Na capota são bem visíveis as falhas na pintura, embora a chapa seja resistente. No capítulo da condução o volante tem folgas, a alavanca das mudanças já não tem maçaneta, a tracção, às vezes, emperra; as ópticas são duplas e no capítulo das mudanças, a marcha-atrás não funciona. Como já tem muito uso os problemas aparecem com mais frequência. Sem anúncio. Foi o que aconteceu há dias. Devido a uma avaria no tubo de escape fiquei sem meio de locomoção e durante uma semana não pude sair dos meus domínios.
Máquinas são máquinas… Com o desgaste dos anos, de vez em quando lá me prega uma partida e obriga-me a fazer uma pausa. Pudesse eu comprar uma nova e outro galo cantaria!...
Mas, pensando melhor, talvez até nem comprasse. É que, mesmo assim, não tenho muitas queixas a fazer. Velhinha, velhinha, mas lá vai andando. Já não dá para fazer longos trajectos nem para entrar em competições, mas o que é certo é que até agora me tem levado sempre aonde quero.
Na garagem onde faço, por norma, a manutenção, o mecânico costuma dizer que máquinas destas, já não se fabricam. E ele sabe o que diz, pois tem uma registada dois anos antes da minha e apesar de alguns problemas que teve, está também bem contente com ela. E também não quer outra…
Cá p’ra mim e ao contrário do que muitos querem fazer crer não é uma questão de marca. É sorte… Há, é verdade, alguns cuidados a ter, mas nada de exagerar. No que diz respeito a velocidades e para evitar travagens bruscas ou derrapagens, é aconselhável respeitar distâncias e nada de prego a fundo. Condução regular, sem altos nem baixos. Isto é, e como dizia o outro, nem muito vinho, nem água de mais. E a propósito de líquidos é aconselhável ter cuidado com o combustível. Nada de mixórdias. Variar sim, mas evitar misturas que possam aumentar as octanas. Cuidado com os modernos aditivos que se vendem para aumentar a potência. Em máquinas muito usadas há depósitos que já não aguentam grande pressão e o aumento de volume pode provocar danos irreversíveis em todo o sistema electrónico…
Não sou mecânico. Os conselhos que acima deixo são fruto da experiência vivida durante os dias em que tive a máquina na garagem para reparação do tubo de escape…

Vaidades




Ser vaidoso não é um defeito. Ou se é, é um defeito universal, porque todos nós o somos. Uns mais do que outros, é certo, mas por mais modestos que queiramos parecer, lá bem no fundo do nosso "eu", embora cuidadosamente disfarçada, a presunção lá está a espicaçar-nos.
E se não soubermos dominá-la, ela extravasa, e a petulância, o ridículo e a futilidade fazem de nós uns bonecos animados, uns fantoches, uma simples e grotesca imitação do ser humano.
Para concluir o raciocínio podemos afirmar que a vaidade não é defeito quando sabemos delimitar o seu campo de acção e refrear o seu ímpeto. Ter vaidade naquilo que fazemos quando ela se traduz em esmero e perfeição, deixa de ser defeito para se tornar numa virtude.
Deixa de ser vaidade também a maneira como vestimos, como falamos ou como nos apresentamos perante os outros, quando essa forma de ser se coaduna com a nossa própria personalidade.
Exteriorizar o que somos interiormente, conscientes do que na realidade sabemos ou possuímos é, acima de tudo, a afirmação da nossa verdadeira identidade. Mas cautela!... É da má interpretação desse pressuposto que nascem as mais variadas situações de hipocrisia e de prepotência...
E isso porque raramente se faz uma introspecção para aquilatar das verdadeiras potencialidades da nossa vida interna. Tentar saber do que somos capazes e até onde podemos ir, é um exercício cada vez mais em desuso. Olha-se todos os dias, e logo de manhã, para o espelho – mais um cabelo branco, mais uma ruga, olhos papudos... e quantas vezes olhamos para dentro?!...
São inúmeros os exemplos de pessoas que não tendo conhecimento do que são, do que valem, nem das suas capacidades, desfilam pela "passerelle" da vida, tentando transmitir uma imagem muito forte em cores, mas pouco ou nada condizente com a realidade.
Infelizmente isso não acontece apenas nos extractos de menor cultura. E talvez porque a autopromoção está na moda, a vaidade alastrou também à classe daqueles que, supostamente, pelos seus estudos, deveriam saber fazer a destrinça entre fingimento e realidade.
E cá vamos vivendo num mundo cada vez mais cheio de velhacos, de barrigas grandes, mas também de muita gente com fome.
Entretanto, e paulatinamente, a vaidade, manifestada através de uma obsessão de se querer ir além do que somos, vai transformando a sociedade num enorme espaço de areia movediça que acabará por tudo engolir. Não será o fim do mundo. Mas será, com certeza, o fim de muita coisa boa.
Diz-se que o futuro a Deus pertence. Porém, se os homens não ajudarem na sua construção, será muito duvidoso que Ele, apesar da sua divina bondade, assuma, sozinho, essa responsabilidade!...