segunda-feira, maio 23, 2011

E LÁ VAI MAIS UM!...

Ontem, 22 de Maio, um dos membros da minha tribo não conseguiu escapar à imutável lei da Vida e teve de resignar-se perante a exigência do Tempo que lhe colocou na guia de circulação mais um carimbo!
Na circulação dos anos como na circulação pelas estradas há regras a cumprir e normas a respeitar.
Nas aulas que ministrei durante o tempo em que estive no activo, a minha preocupação foi sempre a de ensinar a cumprir escrupulosamente o código, seguindo à risca a indicação dos sinais de trânsito.
Em boa hora o fiz, pois é com satisfação que, depois de muitos quilómetros percorridos, não há a lamentar grandes desastres.
Houve, isso sim, alguns despistes, algumas saídas de pista, algumas carambolas mas, felizmente, sem consequências verdadeiramente trágicas!...
Por tudo isso ou apesar de tudo isso, e muito embora não estivessem presentes todos os membros da “esquadrinha” por motivos justificáveis, o certo é que a comemoração da data decorreu com muita alegria num ambiente de são e familiar convívio.
Todos os membros da tribo foram evocados por altura dos brindes e embora fisicamente ausentes, estiveram connosco em espírito, associando-se a esses inesquecíveis momentos de união e partilha.
Nesta nossa já longa caminhada – minha e da minha Chefe – foram mais uns momentos em que a vontade de continuar a luta se reforçou e em que ficou demonstrado que os juros dos investimentos feitos continuam a ser uma compensação dos sacrifícios passados e o testemunho dum verdadeiro espírito de família.
Na vida de cada um de nós há momentos em que as palavras não chegam para expressar o que nos vai na alma. E é nesses momentos indescritíveis que eu invoco alguém que não vejo, mas que pressinto a meu lado e, reconhecido, lhe digo OBRIGADO!
E a toda a minha tribo também…







sábado, maio 14, 2011

PASSEIO MATINAL

Hoje, logo pela manhã, céu azul e temperatura amena, dei um passeio pelo meu quintal. É uma espécie de terapia matinal, este contacto com a Natureza!
A orvalhada cobria a relva e o reflexo do sol nas gotículas das flores, era como que uma sementeira de pedrinhas reluzentes.
O sol nascente, como que ainda mal acordado, tentava afastar os farrapos brancos de uma nuvem que lhe toldava a luminosidade.
No velho tanque, que no Verão serve de piscina, as andorinhas, em voos rasantes, tocam na água com o bico, e levam nele algumas gotas que vão servir para fazer aquela espécie de argamassa que vai servir para a construção dos seus ninhos.
Da buganvília, ainda sem flores, desprendem-se gotas de água que salpicam os mosaicos castanhos do passeio, imitando os pingos grossos de chuva de trovoada.
A copa da árvore da tília tomou já o formato habitual e há já raminhos de flores a espreitar entre o verde das folhas. A vestimenta do castanheiro está mais atrasada, mas os rebentos já se vêem de longe.
De todo este conjunto de cores, em que as rosas e as azáleas se fazem mais notadas, é, no entanto o verde que domina. É a cor da esperança, a cor da Primavera, que reina em todo este pedaço de terra, este meu cantinho, meu confidente e meu refúgio.
Na aldeia, acordada há muito, ouve-se nos quatro cantos o roncar dos tractores, quer lavrando, quer transportado as ervas secas, que serão guardadas para alimentar os animais no Inverno.
À mistura com o chilrear da passarada, há zumbidos no ar e o ronronar dos atomizadores que combatem as pragas dos batatais e outras culturas, acaba por ser uma espécie de cantilena familiar.
Às vezes converso com quem passa, com essa gente que ainda conserva bem vivas as tradições e a identidade cultural da ruralidade do País, um povo que continua unido ao destino que Deus lhe deu – gente que ainda partilha entre si uma cabeça de alho ou um raminho de salsa, gente que ainda cultiva no seu quotidiano gestos de harmonia e de solidariedade.
As árvores, os pássaros e as rosas do meu quintal são os confidentes dos meus pensamentos, dos meus sonhos e, por isso, o repositório dos meus segredos.
Como disse no começo, uma visita matinal a tudo isto que me rodeia, às árvores e plantas que coloquei na terra, que reguei, que vi crescer e que agora dão frutos, é como que um bálsamo para a alma, uma vitória da perseverança e uma afirmação e reforço da Fé que sempre me acompanhou!
E é aqui, neste meu mundo, que esqueço os encontrões de todos os dias e ultrapasso as tristezas com aquele leveza de alma de quem ainda espera um nada de vida e uma réstia de sonho…











A ALDEIA DA MINHA INFÂNCIA

Penso que já uma vez vos falei dela. Da minha aldeia. Daquela aldeia antiga – sem luz eléctrica, sem automóveis, com uma fonte de chafurdo onde todos íamos beber água pura; com fruta bichada criada sem pesticidas; com bosta de vaca espalhada sobre o empedrado das calçadas; com gente abastada e com muita gente pobre, humilde, mas educada.
Já naquele tempo havia a senhora Dona Fulana, a Dona Sicrana e a Dona Beltrana, muito embora, por vezes, mal soubessem ler e escrever.
Dava-se-lhes esse título honorífico ou porque possuíam casas abastadas ou, então, porque eram casadas com as mais gradas individualidades da terra.
Analfabetas ou letradas, uma coisa lhes conferia essa diferença de trato – a educação e a maneira de conviver com todos sem distinção, quer fossem analfabetos, quer instruídos. E a reciprocidade de tratamento era, por isso, de regra.
Não havia desconhecidos, e a aldeia constituía um corpo social que reagia em uníssono. Todos se saudavam quando se cruzavam na rua e era desde o berço que os mais novos começavam a saber respeitar os seus semelhantes, não por obrigação imposta, mas pelo exemplo que lhes era dado em casa.
Recuei no tempo e recordei a aldeia da minha infância, porque são tantas as interrogações que me assaltam e é tamanha esta "pressa de viver» que me rodeia e atropela, que tentei encontrar refúgio nesses tempos em que a vida, como ainda hoje a Natureza, decorria serenamente, sem sobressaltos, com pouca tecnologia, mas com muito humanismo.
Mas é triste verificar que também nas nossas aldeias a educação e os costumes começam a abastardar-se, que os princípios da mais elementar moral começam a esquecer-se e que, por via disso, a Família, cada vez mais em crise, acabe por não ter significado.
Muitos dos nossos jovens não acatam os conselhos dos mais velhos, incluindo, por vezes, até os dos próprios progenitores. Olham-nos como de peças antigas se tratasse, rejeitando assim a experiência e a sabedoria que lhes poderiam servir de escudo protector para enfrentar os desafios do futuro cada vez mais desconhecido e incerto.
O desrespeito e a falta de educação que a certa altura da nossa vida julgávamos que só existiam nos grandes centros, alastrou, multiplicou-se e cá os temos mesmo à porta!
Sinto, por isso, de vez em quando, necessidade interior de me refugiar e voltar a esse tempo sem tempo, e de sonhar. Sonhar, sem humilhar o passado, mas também sem o usar como emblema. E escrevo. É uma arte de fuga. É um grito de vida. Às vezes afigura-se-me que Deus o ouve. Outras é o silêncio prolongado. Mas escrevo sempre. E recordo. É como quem faz uma peregrinação imaginária àquele pequeno cofre que, dentro de nós, continua a guardar a criança que outrora fomos...