sexta-feira, julho 31, 2009

A SEGUNDA FUGA




( 1964)

À ATENÇÃO DOS POSSÍVEIS LEITORES
Este relato está a ser feito ao "correr da pena" e, por isso, a narração dos acontecimentos, às vezes, não obedece a uma sequência lógica. A descrição é muitas vezes interrompida por factos que se interpõem, embora se interligam. Daí uma espécie de "baralhada" difícil de destrinçar. No entanto, uma correcção final colocará os episódios nos seus devidos lugares, os capítulos bem definidos e a pontuação bem colocada. Até lá, vou continuar o meu regresso ao passado... Com um misto de revolta... e de saudade!
I
A situação complicava-se de dia para dia e era através do pequeno "transistors" que escutávamos as Rádios das plantações de uma Sociedade belga que ia informando os seus gerentes da movimentação dos rebeldes.
As "tropas" dos revoltosos avançavam a partir da fronteira Norte e depois de terem chegado à vila de Djolu, preparavam-se para continuar a marcha em direcção a Mompono donde seguiriam para Boende e daí para a capital da província do Equador, a cidade de Bandaka.
As populações denotavam evidentes sinais de nervosismo e era necessário mostrar o maior sangue frio para não desencadear reacções incontroláveis. Uma ordem que se pronunciasse num tom de voz acima do normal, bastava para que da parte dos trabalhadores houvesse uma reacção hostil, e o trabalho, embora executado, o fosse por entre frases pouco dignificantes, em relação ao "branco".
Se durante o dia, era difícil fazer frente a esse clima de insegurança e até, algumas vezes, de pânico, com o cair da noite, a tensão aumentava de tal maneira que era impossível conciliar o sono. O mais ligeiro estampido da madeira ou de qualquer barulho no exterior, causava um mau estar indescritível e uma sensação de insegurança difícil de descrever.
Há alguns dias de cama devido a um problema numa perna, motivado pela má circulação, esse estado de coisas mais contribuía para que o moral estivesse bastante baixo. O medico amigo que me tratava, - um italiano que trabalhava numa plantação de borracha de uma Sociedade belga - todos os dias, via rádio, me aconselhava a deixar a Plantação e embarcar para Kinshasa, pois o meu estado carecia de cuidados particulares. Apesar disso e arriscando também a vida de minha mulher que teimava em não me deixar, fui protelando a partida, até porque meu sócio fazia questão de não abandonar o seu posto. Os dois tínhamos vivido momentos difíceis e não seria honesto deixá-lo só, para enfrentar essa horda de malfeitores que se aproximava.
Entretanto, o meu estado de saúde agravou-se e o médico depois de me ter administrado um tratamento à base de cortisona, intimou-me a partir, caso contrário não tomaria qualquer responsabilidade pelo que acontecesse.
Era desaconselhado o percurso por estrada a partir do cruzamento para Boende, pois segundo as rádios da Sociedade Belga que interceptávamos através dos pequenos "transistors" acima referidos, era natural que os revoltosos tivessem já postos de controlo nesses caminhos.
Optou-se então pelo percurso por estrada até Bokoli e daí até Baringa por rio. E começou então a odisseia da nossa "fuga". Com os revoltosos quase a chegarem à nossa Plantação, planeámos a nossa saída, - eu, minha mulher e a mulher de meu sócio. Este, por questões pessoais que eu, por respeito e amizade, nunca procurei saber, recusou-se, terminantemente, a abandonar o seu posto.
Auxiliados pelo médico italiano e com o concurso do pessoal da gerência da Plantação belga, numa tarde de Setembro de 1964 abandonámos o N'gongo, numa carrinha Opel. No trajecto, ao passarmos pelas aldeias indígenas, éramos insultados e ameaçados pelas populações, já industriadas pelos revoltosos no ódio contra o branco. Percorremos assim cerca de 160 quilómetros até chegarmos a uma outra Plantação da mesma Sociedade. Conduziram-nos então a um pequeno porto nas margens do rio Maringa onde nos esperava o Jean Marie, um amigo francês, com uma pequena baleeira a motor. Devido às dimensões da embarcação e à tempestade tropical que se avizinhava, mas que já se fazia sentir nas águas do rio, só minha mulher e a do meu sócio partiram para Baringa. Com o médico e o director da Plantação, o Vandervelt, um holandês de quase dois metros de altura, fiquei à espera no pequeno ancoradoiro.
Entretanto, a tempestade abateu-se sobre a região e o vento e a chuva fustigavam o armazém onde nos encontrávamos. Os relâmpagos zebravam o céu e as águas do rio começaram a agitar-se assustadoramente. Ao lembrar-me da baleeira que partira, pedi a Deus que a fizesse chegar depressa ao porto de Baringa e a mandasse de regresso para que eu pudesse partir, pois as atitudes dos indígenas que chegavam não indiciavam nada de bom... Eram muitos os boatos e sussurrava-se até que os rebeldes tinham já assassinado alguns brancos e se dirigiam para Bukulikila, precisamente a Plantação que evacuava os seus produtos pelo "beach" onde nos encontrávamos. A chuva era cada vez mais forte, o tempo passava e a preocupação aumentava!... Teria a embarcação conseguido chegar? Teria combustível suficiente para o regresso? Teria sido interceptada por algum grupo de insurrectos?!... Horas de angústia e desespero difíceis de descrever... O desânimo começava a apoderar-se de mim e não fossem as palavras de encorajamento dos dois amigos holandeses, não sei com conseguiria superar tanta ansiedade, tanta angústia e tanto desespero!
Há três horas que a pequena barcaça tinha partido e por mais que tentasse apurar o ouvido nos intervalos das rajadas do vento, não se ouviam quaisquer ruídos que anunciassem a sua chegada. A noite tropical aproximava-se e o desespero aumentava... De repente, muito longe, um barulho diferente... e logo a seguir Jean Marie acenando e, por gestos, indicando que era preciso partir rapidamente... Sem parar o motor, a barcaça chegou-se mais à margem e eu subi, limpando ainda as lágrimas que a despedida fez brotar dos meus olhos cansados. E já a bordo, abraçado a Jean Marie, eu chorei! Perguntei, implorei... Tudo correu bem?... «Que sim. Estavam a salvo as duas. Fora difícil a viagem. Muita chuva, muito vento, forte trovoada, ondas enormes... Foram mesmo obrigados a parar numa cabana de pescadores, á beira rio, para se enxugarem e se aquecerem... mas chegaram!...»
E, graças a Deus, eu também cheguei. A rezar!... São intraduzíveis as sensações que experimentei nessa altura - alegria por ter chegado e encontrado minha mulher bem, e preocupado pensando no que poderia acontecer ao meu sócio que se tinha recusado a acompanhar-nos.
Depois de uma noite em que acordava ao mais ligeiro ruído, chegou a manhã tão desejada. Era tempo de procurar transporte para chegar pela estrada de terra batida a Basankusu, distante de 200 quilómetros, de onde poderíamos tomar o avião para Kinshasa. Eram poucos os veículos disponíveis, pois os que restavam corriam o risco de serem confiscados por elementos armados, à solta, um pouco por toda a parte.
Depois de algumas diligências e graças à boa vontade de amigos que decidiram ficar e não abandonar o que lhes pertencia, um deles prontificou-se a conduzir-nos a Basankusu, antes que a situação se deteriorasse mais, pois todo o pessoal da Missão Protestante onde funcionava um Hospital de leprosos, já tinha sido evacuada por ordens do seu Centro de Coordenação da capital. E isso era um mau presságio. Os Missionários, quer se tratasse de católicos quer de protestantes, eram os últimos a abandonar os seus postos de evangelização do interior. A esse respeito é bom sublinhar a influência da religião nas populações do interior do país. Os missionários dos dois credos, mas sobretudo os das Missões católicas - pese embora o aspecto negativo de alguns procedimentos, entre os quais aquele que consistia em ministrar os sacramentos (baptismo, comunhão, casamentos, etc.) a troco de mão de obra barata - contribuíram grandemente para a educação moral e cívica dessas populações perdidas nos confins da floresta tropical. Muitas Missões possuíam oficinas onde ministravam ensinamentos relacionados com várias artes e ofícios. Tive ocasião de conhecer verdadeiros artífices saídos dessas escolas!...
Saímos então de Baringa e ao passarmos pelas aldeias que ladeavam a "estrada", os insultos e vaias repetiam-se e a frase mais ouvida era "Kenda na ndako na yo. Tika boka na bisu..." ( vai-te embora, deixa a nossa terra...), sempre pronunciada em tom ameaçador. Depois de cerca de três hora de viagem, sempre debaixo de enorme tensão sem saber o que nos poderia acontecer ao dobrar da cada curva, chegamos, finalmente ao aeródromo de Basankuso. A pista era de terra batida e, curiosamente, nela tinha desembarcado vindo de Leopoldville a caminho do interior, há cerca de catorze anos. Recordo ainda esse tempo distante e os dias que permaneci na pequena vila, onde tinha nascido a mulher com quem viria a casar e posteriormente também os meus dois filhos. Curioso também o facto de eles terem nascido no mesmo Hospital em que nasceu a mãe. Era um Hospital com uma equipa médica constituída por médicos de várias nacionalidades e de quase todas as especialidades, incluindo uma equipa de cirurgia com fama granjeada ao longo de muitos anos. Estava agregado à Missão Católica de Mill Hill e o serviço de enfermagem era assegurado por freiras. Cobria em termos de saúde uma extensão cujo raio devia medir cerca de duzentos quilómetros! Esclareça-se que na área abrangida as deslocações faziam-se através de picadas ou por via fluvial, em barcos a vapor, com uma espécie de dobadoira a fazê-lo deslizar pelas águas turvas desses grandes rios interiores do Congo.
Voltando à pista de terra batida, recordo-me que ela me fez viver nesses longínquos tempos, momentos de verdadeira alegria. Durante o tempo que estive na Vila de Basankusu antes de partir para o interior, para ocupar o posto de estagiário nas Plantações de borracha, palmeirais, café e cacau, situadas nas margens do rio Maringa, o "aeroporto" era um lugar de peregrinação todas as sextas-feiras. De facto era nesse dia que todas as semanas chegava no avião, vindo de Leopoldville, no velho DC3, juntamente com o correio, os víveres frescos que nos traziam os sabores da terra natal lá tão longe...
Quase toda a população da pequena Vila, tanto indígena como estrangeira, se dirigia por volta das 10 da manhã ao aeroporto para assistir à chegado do avião. Logo que começava a ouvir-se, lá ao longe, o roncar dos motores, todos os olharas se viravam para o céu pardacento. Ao fundo, junto às palmeiras que faziam a divisão entre a terra cultivada e a floresta, uma coluna de fumo erguia-se no céu. Eram duas as suas funções: mostrar ao piloto o começo da pista e ao mesmo tempo indicar-lhe a direcção do vento. O avião aproximava-se, ronceiro, tomando o rio como referência, e descia sobre ele como que a querer mirar-se nas suas águas. A pouco e pouco ia perdendo altitude e fazia a aproximação à pista por entre duas palmeiras que lhe servia de balizas. Depois... a aterragem, com uma nuvem de poeira vermelha a escondê-lo de todos. Sempre pachorrento ( a velocidade máxima para levantar voo não passava dos 300 quilómetros!...) lá se dirigia para a aerogare, uma casa térrea, em tijolo, e coberta com zinco. Depois era a descarga dos passageiros, uns que vinham pela primeira vez, outros que regressavam da capital onde tinham ido em negócios; seguia-se a retirada do correio e de várias caixas de víveres e outras mercadorias... Era de facto um dia inesquecível!...
Porém, naquele dia da fuga, tudo era diferente...
Muita gente no aeroporto. Muitos indígenas, freiras, alguns padres das Missões vizinhas e um avião bojudo que acabava de se imobilizar junto à aerogare, agora já sem cobertura e com os muros degradados! O avião com a sigla da ONU pintada no bojo vinha buscar os religiosos que ainda restavam. Um oficial congolês não sei a que título presidia à escolha daqueles que deviam embarcar. Como havia muitos europeus, ele decidiu que só embarcariam as senhoras, pois a lotação do aparelho não comportava todos os que queriam partir... Um sacerdote opôs-se a essa discriminação e pediu que se desse prioridade a senhoras sim, mas também a outras pessoas independentemente do sexo ou profissão. Como estava doente colocaram-me na frente da fila com minha mulher, mas logo o graduado e seus adjuntos se opuseram, objectando que eu seguiria, mas minha mulher ficava... Nessa altura uma freira que já subia para o avião ao ouvir a ordem do militar, voltou atrás, e com uma voz que não admitia réplica ordenou: «Este senhor vai e sua mulher acompanha-o, porque eu cedo-lhe o meu lugar. E eu fico!...» Estupefacção do militar e dos seus sequazes! Finalmente, e depois de alguma discussão lá embarcámos todos rumo a Kinshasa...
O pequeno "Dakota" com os seus dois ronceiros motores e o interior a denunciar a sua avançada idade, ao descolar, utilizou quase toda a pista, pois a carga que levava exigia mais esforço e maior distância. Com os motores a toda a velocidade, lentamente, lá começou a subir e foi com alívio que vimos os avisos luminosos da descolagem apagarem-se. Recordo-me que não havia lugares sentados para todos e muitos dos passageiros iam sentados no chão e agarrados às cadeiras...
Já no ar, o pensamento teimava em voltar ao N'gongo, numa esforço impossível de tentar imaginar o que por lá se passava. A hostilidade dos habitantes das aldeias por onde tínhamos passado, faziam-nos temer o pior e fazia prever as mais diversas situações, tais como as que tínhamos vivido em 1960 aquando da independência do país...
Entretanto, o voo continuava, e depois dos safanões da praxe sempre que passávamos Mbandaka, situada na linha do Equador, o velho DC3 desceu um pouco e podíamos ver o fumo de algumas aldeias indígenas ao longo do rio. Para quem não conheceu o Congo, deve esclarecer-se que, em todos os voos para o interior, os pilotos orientavam-se pelos rios e por isso, seguiam o mais perto possível dos seus cursos. Não havia qualquer serviço de balizagem ou sinalização e a navegação aérea era assim feita. Os pilotos, quase todos de nacionalidade belga, tinham grande experiência e possuíam vastos conhecimentos sobre a hidrografia do pais. Durante os tumultos de 1960, logo após a independência, esses homens do ar, realizaram verdadeiros milagres aventurando-se, em voos rasantes, arriscando a própria vida para salvar pessoas isoladas!...
Voltando aos rios do Congo, eles eram todos navegáveis e os barcos percorriam-no de lés-a-lés, abastecendo as feitorias de mercadorias, e transportando para a capital, no regresso, os produtos ali produzidos ou fabricados, como por exemplo: borracha, óleo de palma, coconote, café, cacau, arroz, etc. De quinze em quinze dias, durante o dia, ou alta noite, lá silvava a sirene anunciando a sua chegada ao "beach", ou cais. Recordo os meus primeiros tempos de Congo, na década de 50, em que a chegada do barco, quer fosse de noite, quer de dia, era motivo de grande alegria: nele chegava o correio da terra distante, os mantimentos que nos enviavam da sede da Companhia e as mercadorias para as cantinas da Plantação!... Sozinho, perdido no mais recôndito "buraco" da floresta tropical, com 350 homens, repartidos por plantações de palmeiras, de borracha, de café e de cacau, a chegada do barco da Otraco (Office des Transports du Congo) era, para mim, como que um bálsamo que vinha amenizar a solidão. Juntavam-se os trabalhadores e, muitas vezes, éramos obrigado a fazer a descarga ou a carga, consoante ele vinha, ou regressava, de noite. Muitas vezes, à luz do potente projector do barco alimentado pelo gerador do mesmo, os carregamentos de produtos com destino à capital, terminavam já de madrugada. Como o barco só navegava de dia, havia que aproveitar a noite para outros serviços...
Todos os barcos, nessa altura, transportavam passageiros e tinham quartos para quem quisesse viajar neles. Havia um cozinheiro a bordo e bastava levar os ingredientes para que o cozinheiro preparasse as refeições que eram servidas numa sala de jantar com todo o asseio e educação. Quando minha mulher ficou grávida do primeiro filho, a conselho do médico que vivia a 160 quilómetros de distância, fizemos a viagem por barco até Basankusu. Foi uma viagem magnífica e inesquecível que durou três dias, Maringa a baixo... Era uma paisagem indescritível quando viajávamos durante o dia - nas margens, na densa floresta tropical, macacos, aves e outros animais habituados ao barulho da embarcação, deliciavam-nos com as suas traquinices!... Ao chegar da noite, o barco imobilizava-se nos ancoradoiros e esse espaço de tempo era aproveitado para carregar lenha que alimentava as caldeiras a vapor que faziam mover a tal dobadoira de que já falei. Às vezes era difícil dormir por causa do barulho dos carregadores e também por causa dos mosquitos que, mesmo com o mosquiteiro a cobrir o beliche, conseguiam chegar até nós e ferrarem... Os comandantes dos barcos eram congoleses e todos possuíam, não só conhecimentos da navegação fluvial, como também outros conhecimentos, a par de uma educação muito razoável, senão perfeita.
Voltando ao voo Bansankusu-Kinshasa, dizia eu que o avião tinha baixado e que era possível, lá do alto, distinguir as cabanas das aldeias e ver o fumo que delas saía. Entre os passageiros encontravam-se missionários, freiras e outros civis, homens e mulheres. Já quase a chegar ao destino, um dos motores começou a "tossir", fez-se silêncio no interior do aparelho e um padre, desapertou o cinto de segurança, ajoelhou-se e começou a rezar... Ao contrário do que acontece hoje em quase todos os voos, nesse tempo e nas linhas aéreas do interior do Congo, não havia hospedeiras. Geralmente eram três os membros da tripulação - o piloto, um co-piloto (às vezes) e um mecânico. Por isso nesse momento de inquietação, não houve ninguém que viesse tranquilizar ou explicar o que se passava. Cada qual podia fazer a sua avaliação pessoal. Assim aconteceu e quase poderia garantir que não houve propriamente pânico. Depois de sair do inferno... é difícil ter-se medo... Entretanto, e com a hélice do motor direito "em bandeira", o avião adernou um pouco e foi baixando, baixando... e de repente o asfalto da pista à vista! Dois ou três solavancos, uma pequena derrapagem, uns ziguezagues e, por fim o deslizar sereno do avião em direcção à aerogare.
Como já o disse os pilotos eram experientes, mas acrescente-se que durante a minha permanência de 30 anos não se registou qualquer acidente com os aviões apesar dos rudimentares, podíamos mesmo dizer "artesanais", meios de navegação aérea. Muitos sustos, é verdade, mas sem consequências de maior. Em viagens do interior para a capital ou vice-versa, quando passávamos a linha do Equador, raro era o voo em que não houvesse que contar. Muitas vezes era tal turbulência e os poços de ar, que todos os passageiros emudeciam. As trovoadas e as tempestades tropicais com chuvas intensas, eram tão fortes, que o comportamento do avião era o de uma cadeira de montanha russa!... Muitas vezes, a chuva, juntava-se a nós, entrando pelas minúsculas frinchas das velhas carlingas...
De vez em quando o avião era desviado da sua rota porque era necessário ir buscar um doente a uma Plantação perdida na floresta e então aterrávamos em pistas cobertas de capim e era um "espectáculo" estranho ver as asas do bimotor a ceifar as ervas que encontrava na pista. Sucedia que os passageiros não eram informados da alteração da rota e podem adivinhar a sensação de medo quando se acendiam as luzes para apertarmos os cintos e de repente, pelas janelas, víamos os arbustos a serem degolados e o avião a rolar envolto numa nuvem de pó!...
Aeroporto de Ngili. Estávamos, pois junto da aerogare. Calaram-se os motores e a pequena escada aproximou-se do avião...
O desembarque. Militares armados. Arrogantes, indisciplinados: - «As bagagens? Abram as malas...» Que bagagens, quais malas?!... Se não temos nada a não ser a roupa que temos vestida... Uma senhora da Cruz Vermelha interrompe o "assalto"... «Por aqui!...» - diz ela. Avançamos. Ninguém que conheçamos. E da nossa Embaixada em Kinshasa? Nem rasto... Aliás, já em 60 tinha acontecido a mesma coisa. Estávamos entregues a nós mesmos. Alguém se ofereceu para nos conduzir do aeroporto até à cidade. São cerca de 30 quilómetros e fizemos já o percurso de noite.
Não tínhamos notícias do que se passava no interior e eram tantas as contradições nas notícias ou nos boatos, que não sabíamos em quem acreditar. Tanto ouvíamos dizer que os rebeldes estavam de posse de toda a nossa Região, o Alto Congo, como se dizia que um grupo de mercenários os tinha rechaçado e eles fugiam em direcção a Gemena...
No dia seguinte e devido ao agravamento do meu estado de saúde, fui internado no Hospital da Universidade de Lovanium. Ali permaneci durante quinze dias. Registo aqui o facto de ter sido assistido por um médico angolano de apelido Andrade, formado pela Universidade de Coimbra, que tinha fugido de Portugal para Brazaville, e veio depois para Kinshasa, onde exercia a sua profissão no Hospital da Universidade. Evitei sempre abordar questões políticas, pois logo me apercebi que era um assunto que o incomodava, dada a sua condição de "foragido" à ditadura que então prevalecia em Portugal. Profissional competente senhor de um humanismo e de uma educação esmerada, foi o primeiro homem negro a convencer-me, - apesar de todos os efeitos negativos que dela possam advir - que a "colonização", quando feita como um verdadeiro sacerdócio, deixa marcas indeléveis da índole do povo colonizador.
No Hospital e por intermédio de minha mulher que diariamente me trazia notícias, eu ia sabendo o que se passava, ou o que se dizia lá fora. Mas eram muito vagas as informações que nos chegavam vindas do interior do país. No aeroporto vivia-se um clima de incerteza e desânimo. Os aviões que chegavam dos mais longínquos cantos do território eram "assaltados" por uma onda de pessoas, ávidas de saber notícias dos seus familiares que tinham ficado entregues a si próprios, só Deus sabia como!
Entretanto saí do Hospital e a realidade falou mais alto do que a doença: tinha perdido tudo pela segunda vez; tudo o que tinha resumia-se ao que tinha vestido!... Tudo o que possuía tinha ficado nas mãos dessa turbamulta industriada para destruir o que encontrava ela frente.
A certa altura correu o boato de que os rebeldes teriam feito reféns todos os europeus que se encontravam na nossa região, incluindo o meu sócio, e se dirigiam para a cidade de Kisangani. Com eles viria o médico italiano, o amigo que me tinha acompanhado na doença. E então começaram as viagens para o aeroporto sempre que constava que um avião chegava do interior. Um sentimento de esperança à chegada e um sentimento de desespero logo que do avião não saiam as pessoas esperadas! A presença da soldadesca era cada vez mais notada e como não era paga, todos os pretextos serviam para extorquir dinheiro... O aeroporto e instalações, que tínhamos conhecido com características aproximadas dos outras de então, no que diz respeito a pessoal especializado, - na torre de controlo, nos serviços da Alfândega e nos outros serviços subjacentes - estava transformado num acampamento de nómadas, em que as condições de higiene eram o primeiro sinal de que civilização nem sequer por ali tinha passado!...
Eu continuava sem emprego, acolhido em casa de amigos e sem dinheiro para poder comprar roupa, pois nada tinha trazido!
Um dia, num avião vindo de Kusangani, chegou, finalmente, o médico italiano. Mas sozinho!... Logo que soube fui visitá-lo à clínica da Sabena onde tinha sido internado. Chorámos nos braços um do outro! Eram más as notícias que me trazia... O Rodrigues, com outros seis europeus, tinham sido assassinados, pelas costas, com rajadas de metralhadora! Os rebeldes tinham-no poupado a ele por ser médico. Podiam precisar dele e, por isso, o levaram de Mompono para Kisangani. Uma viagem feita ao longo de cerca de um mês, ora de camião, ora a pé, conforme o estado das picadas o permitia. Comida, era a que encontravam ou roubavam aos habitantes das aldeias por onde passavam. Arroz, frutos e mandioca conjuntamente com peixe seco ou carne de antílope ou javali, constituíam a base das refeições, que não tinham horas nem locais certos. O mais difícil de suportar tinha sido a sede e, como não havia outra hipótese, bebiam a água dos rios, alguns com cadáveres a boiar!... Por vezes era chamado para acudir a algum mutilado e como não tinha nada para remediar a situação, limitava-se a estancar o sangue com tiras da camisa que vestia e a aconselhar a evacuação para o Hospital mais próximo... E onde é que havia hospitais? E os que ainda existiam, tinham apenas as paredes direitas. E não eram todos... porque muitos, depois de pilhados tinham sido destruídos a tiro de morteiro. Uma selvajaria difícil de imaginar!
Muitas vezes tinha sido ameaçado de morte, chegando a estar encostado ao muro para ser fuzilado! Sensação estranha e inenarrável! Ao ouvir a descrição recordei os momentos por que tinha passado em 1960, no Campo militar de Boende, também eu ameaçado de morte e por várias vezes obrigado a encostar-me ao muro para ser passado pelas armas...
A independência tinha sido proclamada no dia 30 de Junho de 1960 e logo durante a cerimónia, o episódio do roubo da espada do Rei Balduíno por um congolês, deixava no ar um prenúncio de presumíveis convulsões! E foi o que aconteceu. A rebelião nos quartéis à volta de Kinshasa em breve se espalhou por todo o país e a soldadesca, embriagada e drogada tomou conta do país. Os oficiais belgas e os seus colegas congoleses em breve viram que eram incapazes de dominar as suas tropas. Alguns oficiais belgas foram presos, outros espancados e em poucos dias o país era um verdadeiro caos...
E não pude evitar que a minha imaginação recuasse no tempo e recordasse...
Para aqueles que nunca deixaram a Europa, e que conhecem África apenas através dos livros, ela é uma terra privilegiada - a terra do dinheiro, das aventuras, da caça e do mistério. Manhãs encantadoras, dias quentes e as noites frescas. O branco é rei, o trabalho não existe e nada lhe falta...
E para quê destruir esse mito e mostrar-lhes a verdade nua? Para quê mostrar-lhes esta terra despida de ilusões e miragens, no seu verdadeiro aspecto? Para quê fazer-lhes sentir esta "febre dos trópicos" contra a qual nem o quinino nem o uísque são eficazes? Para quê fazer-lhes ver que esta terra rouba tudo ao homem que a ela se entrega confiado no futuro?
E mais difícil seria ainda fazer-lhes compreender que que apesar de tanto sofrimento, há homens que amam essa terra e que não mais querem separar-se dela. Amam-na, porque nela sofreram e, amando-a, não a podem deixar...
Transcrevo aqui, a propósito, o que escrevi no N'gongo, em 15 de Novembro de 1960 e que encontrei depois aqui num Jornal regional, É a história verídica do velho Silva, nessa altura com 78 anos de idade, 54 passados no Congo:
«Sentado numa cadeira de verga, o velho espreitava o Sol que desaparecia lá ao longe por de trás da floresta verdejante e pensava ainda na carta que acabara de receber dum parente afastado que vivia na Beira, a sua Beira Alta, que há tanto tempo deixara!
Maquinalmente tirou a carta do bolso e releu-a pela terceira vez. Queria ver se, à força de tanto a ler, acabaria por seguir os conselhos do primo Silvestre que lhe dizia para deixar a África e fosse repousar para a sua aldeia que, talvez, já não conhecesse...
- Que se deixasse de mais trabalhos e que fosse até Portugal. Se não quisesse viver na aldeia, que diabo, iria para a cidade e passaria o resto dos dias da sua vida tranquilo e sem nada lhe faltar. Já era tempo que voltasse à terra onde nascera. Ou queria ele morrer nessas terras longínquas, sem amigos, sem ninguém!... Que vendesse o que possuía, que segundo constava era bastante, e que fosse, que fosse embora...»
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O Sol tinha desaparecido completamente e a noite começava a cair. Além na estrada, os homens passavam de regresso da caça com arcos e flechas, mas sem qualquer produto do seu esforço. Amanhã recomeçariam sempre esperançados. As mulheres voltavam do rio onde tinham ido buscar água, com os filhos às costas e os baldes na mão.
Aos ruídos variados do dia, sucedia o silêncio da noite - esse silêncio das noites tropicais que põe o homem frente ao homem, que o faz meditar, querer, chorar e Ter esperança. Esse silêncio que lhe transporta o pensamento mais perto de Deus em busca de um apoio, de uma companhia...
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Duas lágrimas rolaram-lhe pelas faces já enrugadas. A aldeia onde nascera passara-lhe pela mente numa visão saudosa e fugidia. Cinquenta e quatro anos. Tanto tempo!... Como o tempo passa! E ele que viera a África apenas para arranjar o suficiente para construir uma casita e amealhar uns patacos para a velhice... Era assim que ele pensava quando embarcou e, afinal, viera e nunca mais voltou! Tudo esqueceu a pouco e pouco. Tudo, menos os Pais que, enquanto foram vivos não deixou que lhes faltasse coisa alguma. Tinha a consciência tranquila. Pobres Pais! Deus os tenha em descanso.
Os lábios mexeram - talvez uma prece a Deus pelos Pais que nunca mais voltara a ver.
As estrelas cintilavam no céu e o luar fazia brilhar as folhas dos cefezeiros ainda orvalhadas da chuva que tinha caído de tarde. Também o luar quisera mostrar-lhe a beleza da sua obra, dando-lhe assim mais força para não seguir os conselhos que lhe davam na carta. Não podia abandonar assim o que tanto lhe custara a fazer e que, afinal, era agora um pedaço do seu ser. A sua mocidade ali estava enterrada naquela terra. As ilusões da sua juventude dormiam à sombra daquelas plantas. Aquela terra viu-o chorar de saudades quando chegou. Viu-o depois lutar para esquecer, entregando-se ao trabalho, despreocupado do resto. Viu-o erguer as mão a Deus em preces ardentes, pedindo força e coragem. Viu-o, enfim, sorrir quando os primeiros frutos amadureceram...
E as frases da carta dançavam-lhe na mente: - «Sem amigos, sem ninguém...» Como se enganam aqueles que nunca lutaram sozinho! Nunca sentiram a emoção forte de ver nascer do esforço próprio uma obra que é nossa, pela qual sacrificámos tudo e que de tudo nos afastou, mas que prova que o homem soube ser homem e marcou a sua passagem neste mundo que foi criado para ele.
«Que vendesse o que tinha...» - Vender! Será possível que se possa vender uma parte do nosso ser? Depois de tanta canseira, tanta privação, abandona-se assim, num momento, o que tanto nos fez sofrer?
Não é agora que as ilusões se desvaneceram, que as pernas trôpegas se recusam a grandes esforços, que a vida nada mais nos pode dar, e que a terra mostra ao homem o fruto do trabalho de tantos anos que se abandona o campo da luta onde se travou a batalha e onde as plantas cresceram com o sangue derramado...
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A brisa fresca da noite brincava com a s folhas dos cafeeiros fazendo deslizar as gotas d'água, lentamente, pelas nervuras, como lágrimas por uma face enrugada...»

quarta-feira, julho 22, 2009

POEMA - Em dia de aniversário



A partir de certa idade parece que o tempo passa mais depressa, que passa a correr, sem quase nos apercebermos.
Parece que os anos, à semelhança dos bólides modernos, circulam a uma velocidade tal, que nem dá tempo para apreciar a paisagem.
É como se viajássemos numa cápsula com janelas de vidros foscos donde apenas se vê o desfilar de sombras, a passagem de objectos sem contornos definidos, a sucessão de imagens fantasmagóricas – tudo isso perpassando ao som do barulho infernal das preocupações do dia a dia que nos contagiam e se apossam das nossas mentes.
Nesta sociedade materialista que nos comanda e escraviza, nada podemos fazer para nos libertarmos desta engrenagem maldita a que por obra e graça do progresso fomos acorrentados. Elos da mesma cadeia, parte do mesmo todo, giramos à volta do mesmo eixo e sofremos a influência dos mesmos ventos.
Toda esta corrida desenfreada da vida moderna roubou-nos a paz de espírito, a religiosidade do silêncio de outrora e o sonho de sermos interiormente livres, o sonhos da criança que fomos!
E assim vai passando o tempo. Veloz, indiferente à nossa insatisfação, aos nossos desenganos, às nossas frustrações e aos nossos queixumes. É assim o jogo quotidiano da própria vida, feito de competições e indiferenças!
Mas mesmo assim todos os dias fazemos planos, todos os dias gizamos projectos, todos os dias acalentamos esperanças, mesmo correndo o risco de ver o sonho transformado em pesadelo!... Mas é a voz da esperança a incutir "alma" no vazio da crescente desumanização; é um convite para reforçar, – neste tempo sem tempo em que vivemos – o hino à vida, fazendo ressuscitar o sonho perdido por intermédio de uma poesia humanista e solidária...
Falo de poesia, mas não sou poeta. O poeta é aquele que sente de outra forma. O poeta não se faz, o poeta nasce. O verdadeiro poeta aprofunda sentimentos e vivências e faz descobrir nas pequenas coisas grandes coisas, mostrando-nos que, afinal, o que somos e o que fazemos tem uma razão de ser mais profunda do que aquilo que pensamos. Há quem diga que a poesia é o homem. E como o homem tem sempre uma paixão a construir, um sonho a desabrochar, um combate a travar ou uma felicidade a atingir, a poesia tudo isso contém: amor, emoção, luta, esperança – uma amálgama de religiosidade e de mistério que são, afinal, os ingredientes de que é feita a vida. O tempo voa. Foge... Mas não será o tempo um aliado que Deus nos deu? Não é ele que dá consistência e valor às coisas? Quanto mais tempo passa, menos doem os desgostos... Façamos então dele um poema. Aliás, como disse o poeta, «uma hora não é uma hora. É um vaso cheio de perfumes, de sons, de projectos, de alegrias e de esperanças...»

VIVÊNCIAS

Não há nada melhor para minorar a nossa ansiedade, para acalmar as nossas emoções e para simplificar a nossa vida do que aceitar com confiança e resignação as coisas que nos acontecem e para as quais não existem quaisquer soluções terrenas.
É certo que por vezes a vida nos põe perante situações angustiantes e de extrema complexidade que quase nos roubam a nossa capacidade de raciocinar. Mas é precisamente nessas alturas que é posta à prova a nossa força interior, aquela mola invisível que muitas vezes deixamos enferrujar por falta de uso.
Quando tudo nos corre de feição, esquecemo-la, não nos servimos dela diminuindo assim a sua elasticidade e subestimando a sua amplitude. Ao proceder dessa maneira, mais difícil se torna despertá-la para a distender e nos servirmos dela nos momentos de amargura. Por isso é necessário mantê-la sempre em bom estado de conservação, e isso só se consegue se acreditarmos em nós próprios e confiarmos nos dons com que Deus nos dotou para fazer face às adversidades.
Há também quem desconheça essa força interior e, menosprezando-a, procure ajuda exterior, mas que nunca é tão genuína e sincera como aquela que possuímos dentro de nós.
A resolução da maior parte dos nossos problemas reside na arte de saber acordar essa força que dorme no interior de nós mesmos. E a maneira mais eficaz para esse despertar consiste em estimular os nossos sentimentos.
Fui há dias visitar um amigo que se encontra no hospital. Ao percorrer os corredores, e numa espreitadela furtiva pelas camas alinhadas nas enfermarias, olhando os doentes, (alguns bastante mal) espontaneamente, uma prece silenciosa, rompeu a atmosfera de dor e sofrimento que me envolvia e subiu até Deus num agradecimento mudo, mas sincero.
Não há melhor bênção do que a saúde! Mas, distraídos que andamos, só nesses lugares é que lhe damos o real valor. Para quê tanto egoísmo, tanto ódio, tanta inveja e tanta revolta?
Com tudo isto queria eu dizer que se na vida de cada um de nós há situações verdadeiramente inevitáveis, outras há – a que poderíamos até chamar de facultativas – às quais podemos muito bem fugir ou evitar.
Todos sabemos que a vida é uma teia urdida com as mais variadas dificuldades. Mas para melhor a suportar, para melhor vivermos, para termos paz, tranquilidade, e um pouco de bem-estar, por que não procurar combater as nossas angústias, os nossos medos e as nossas contrariedades recorrendo a esse legado espiritual, esse dom que Deus nos concedeu? Não é a Fé um incomensurável poder que alimenta a vida? Ter Fé e procurar nela a humildade, a tolerância e o perdão – é como que renovar a vontade de viver em paz com nós mesmos. E é dessa paz interior que vem a força para enfrentar todos os desafios e transpor os obstáculos que a vida coloca no nosso caminho.

domingo, julho 19, 2009

TOUT LE MONDE Y A DROIT



Un couple une fin d'après-midi, dans une gare, à l'heure de pointe.
Ils étaient là, debout, enlacés, en osmose sur ce quai bondé. Ils s'étaient planqués un peu en retrait de la foule, derrière une colonne. De leurs regards éperdus, ils se dévoraient mutuellement, ils ne faisaient qu'un. Leurs corps épousés, les bras entremêlés, leurs baisers étaient passionnés, fougueux, énormes de tendresse. Un sentiment fusionnel, exprimé avec l'urgence des amants adultères qui doivent se quitter momentanément et pour qui la séparation est intolérable. A l'évidence, ils étaient en train de se dire "au revoir".
Rien que d'assez banal me direz-vous ?
Peut être ... si ce n'est qu'ils avaient dépassé la soixantaine.
C'était des caricatures de grands parents prolos et misérables, mal fagotés, gris et ternes. Elle avait ses cheveux gris et sales ramassés à la diable dans une barrette minable de prisunic, des bas à varice. Il avait une casquette ringarde, pied de poule, celle avec le bouton pression, des bretelles. Ils étaient laids. Ils auraient pu faire pitié.
Seulement, là on était loin de la pitié. Très loin, ils s'aimaient comme des adolescents, ça suintait la chaleur et la passion. Une si torride étreinte, chez des gens de cet âge, avait quelque chose d'obscène.
Mais j'ai passé outre le dégoût qu'ils m'avaient spontanément inspiré de prime abord. Je me suis forcée à les regarder sans cet a priori. Je commençais à imaginer leurs doubles vies compliquées, leurs parcours, leur histoire, cet amour anachronique ...
J'ai viré les préjugés.
Je les ai contemplé.
Je les ai enviés.
Je les ai trouvés beaux.
L'amour ? Tout le monde y a droit

quinta-feira, julho 16, 2009

BANDEIRA


16-7-09

Guerra Junqueiro, deputado, jornalista, escritor e poeta, que viveu entre 1850 e 1923, autor de várias obras, entre elas, Os Simples, era também senhor de uma admirável veia satírica que o levou a escrever vários panfletos de combate político.
Lembro-me, a propósito, de que na minha adolescência, uma das suas obras, A Velhice do Padre Eterno, figurava no catálogo dos livros cuja leitura era proibida pela autoridade pontifical.
Escusado será dizer que o livro passou de mãos em mãos e apesar de muito esfarrapado, quase todos os que comigo romperam os fundilhos das calças nos bancos do Colégio Tomás Ribeiro, o leram. Fruto proibido...
Se hoje evoco o poeta de Freixo de Espada à Cinta é porque li há dias, num excerto de um dos seus opúsculos políticos, uma frase que apesar de ter já sido escrita há muitos anos mantém ainda uma actualidade desconcertante. Escreveu ele que «a política é uma enxerga podre cheia de percevejos...»
Não acham que a mensagem que a frase encerra continua pertinente e actual?!...
A enxerga é a mesma. Pode não cheirar mal, mas a factura dos desodorizantes é elevada. Os percevejos, esses famigerados e fedorentos bichinhos que só atacavam de noite, foram substituídos por outros parasitas que atacam a qualquer hora e em qualquer sítio...
São os chamados doutores da política – esses pretensos defensores do povo que se arranham e insultam em público e que depois se juntam e se empanturram à volta de mesas recheadas dos mais requintados e exóticos manjares!
Os vergonhosos acontecimentos a que ultimamente temos assistido ao vivo e em directo, mostram-nos o que o futuro nos reserva se continuarmos a confiar em pessoas tão irresponsáveis, tão imaturas e tão incompetentes.
Não vale a pena entrar em pormenores, mas é bom que reflictamos um pouco naquele "sacudir da água do capote" por parte de quase todos os que deviam assumir a responsabilidade (ainda que indirecta) dos erros que têm sido cometidos.
Veja-se ainda o que se não tem dito e feito, corrido e saltado, para encontrar um bode expiatório para justificar uma falha que, afinal, poderão ter sido muitos a concorrer para que ela se verificasse!
Quanto a mim tudo isto não passa de uma constante e hipócrita encenação. E tanto os que nos governam como os que lhes fazem oposição não acreditam nem naquilo que dizem, nem naquilo que fazem. Vivem a sonhar. E, entretanto, o País, sem dono, parece estar à venda. Vem aí a liquidação total. E o trespasse...
Por isso não se admirem se daqui a uns anos, ao acordar, e ao olharem para a torre de menagem, depararem com um sujeito desconhecido, barrigudo, disfarçado de eurocrata, a hastear uma bandeira, que não a nossa!

A ENXERGA


16-7-09
A enxerga
Guerra Junqueiro, deputado, jornalista, escritor e poeta, que viveu entre 1850 e 1923, autor de várias obras, entre elas, Os Simples, era também senhor de uma admirável veia satírica que o levou a escrever vários panfletos de combate político.
Lembro-me, a propósito, de que na minha adolescência, uma das suas obras, A Velhice do Padre Eterno, figurava no catálogo dos livros cuja leitura era proibida pela autoridade pontifical.
Escusado será dizer que o livro passou de mãos em mãos e apesar de muito esfarrapado, quase todos os que comigo romperam os fundilhos das calças nos bancos do Colégio Tomás Ribeiro, o leram. Fruto proibido...
Se hoje evoco o poeta de Freixo de Espada à Cinta é porque li há dias, num excerto de um dos seus opúsculos políticos, uma frase que apesar de ter já sido escrita há muitos anos mantém ainda uma actualidade desconcertante. Escreveu ele que «a política é uma enxerga podre cheia de percevejos...»
Não acham que a mensagem que a frase encerra continua pertinente e actual?!...
A enxerga é a mesma. Pode não cheirar mal, mas a factura dos desodorizantes é elevada. Os percevejos, esses famigerados e fedorentos bichinhos que só atacavam de noite, foram substituídos por outros parasitas que atacam a qualquer hora e em qualquer sítio...
São os chamados doutores da política – esses pretensos defensores do povo que se arranham e insultam em público e que depois se juntam e se empanturram à volta de mesas recheadas dos mais requintados e exóticos manjares!
Os vergonhosos acontecimentos a que ultimamente temos assistido ao vivo e em directo, mostram-nos o que o futuro nos reserva se continuarmos a confiar em pessoas tão irresponsáveis, tão imaturas e tão incompetentes.
Não vale a pena entrar em pormenores, mas é bom que reflictamos um pouco naquele "sacudir da água do capote" por parte de quase todos os que deviam assumir a responsabilidade (ainda que indirecta) dos erros que têm sido cometidos.
Veja-se ainda o que se não tem dito e feito, corrido e saltado, para encontrar um bode expiatório para justificar uma falha que, afinal, poderão ter sido muitos a concorrer para que ela se verificasse!
Quanto a mim tudo isto não passa de uma constante e hipócrita encenação. E tanto os que nos governam como os que lhes fazem oposição não acreditam nem naquilo que dizem, nem naquilo que fazem. Vivem a sonhar. E, entretanto, o País, sem dono, parece estar à venda. Vem aí a liquidação total. E o trespasse...
Por isso não se admirem se daqui a uns anos, ao acordar, e ao olharem para a torre de menagem, depararem com um sujeito desconhecido, barrigudo, disfarçado de eurocrata, a hastear uma bandeira, que não a nossa!















sábado, julho 11, 2009

A VONTADE DO POVO ?!...



O problema já é velho e até Salazar dizia que «não se pode governar contra a vontade do povo». Porém, mutatis mutandis, agora como então, surge a mesma pergunta – o que é a vontade do Povo?...
É a vontade de cada cidadão, será a de uma dúzia, será a dos que governam, ou será a do maior número? Em qualquer dos casos, o certo é que o problema continua por resolver, pois ainda ninguém conseguiu fazer a destrinça e encontrar uma explicação convincente. Foi-se a ditadura e com o advento da democracia foram muitos os que acreditaram que a partir daí se poderia definir e explicar o sentido da expressão. Puro engano. Quem assim pensou esqueceu-se que qualquer sistema de governo tem as suas subtilezas, os seus disfarces e os seus embustes. Daí que no sistema democrático, para contornar a situação e evitar chatices convencionou-se que vontade popular é a que resulta da contagem das cores dos papelinhos saídos da caixa a que, não sei porquê, se deu o nome de urna. Porém, não existe qualquer verdade no denominado sufrágio universal. O que há, isso sim, é uma verdade convencional. E isso porque hoje mais do que em tempo algum, avança-se ou recua-se mercê de uma série de convenções. Nem sempre claras, diga-se em abono da verdade.
Como no passado, também no presente o povo vota, mas não manda; o povo paga, mas não sabe para onde vai o seu dinheiro; o povo sofre, refila... e cansado e rouco, acaba por desistir. Então e a tal vontade popular? Uma simples figura de retórica. Um ornamento que serve apenas para enfeitar os discursos hipócritas e ocos dos mandantes. E como o mal já vem de longe e não se consegue fazer a destrinça entre verdade e vontade, manda quem pode, obedece quem deve... Isto apesar de todos sabermos que o que convém à minoria que governa nunca coincide com a maioria dos que não governam. É dos livros e não queiram convencer-me de que – nesse capítulo – há formas de governo diferentes. Cada Governo, qualquer que seja a ideologia, tem de fazer sempre referência à tal vontade do Povo. Sem nunca saber o que realmente isso é...
Tenho à minha frente um Jornal onde leio que o Tribunal de Contas revelou que foram gastos 241 milhões de euros a mais em cinco obras públicas. E isto é um pequeno exemplo… Não haverá ninguém a quem pedir responsabilidades por este e outros esbanjamentos de dinheiro que acontecem todos os dias?
E ainda há quem diga que somos pequenos! Só se for no juízo. Porque na arte de "meter a mão na massa" somos os maiores...
Governados por umas dúzias de cidadãos – muito bem protegidos por "pequenas verdades convencionais" – cá vamos vivendo, assistindo impotentes a "desvios" sistemáticos de milhões. Mesmo contra a vontade do povo…

FINGIMENTOS



Hoje, mais do que nunca, é sob o manto da religião que se fazem, que se dizem e que se praticam os maiores atentados contra a moral cristã.
Muitas vezes, os comportamentos ostentados na Igreja são apenas um fingimento, uma espécie de cortina de fumo, para esconder as sementes de ruindade que germinam no interior.
Há muita gente que se esquece de que nada se consegue esconder de Deus…
E por mais atitudes de hipocrisia, fingimento ou disfarce que usemos, exibindo e apregoando virtudes que interiormente não possuímos, nada se diz, nada se faz, nem nada se ostenta, sem que Ele deixe de ter conhecimento.
De nada vale, pois, fazermo-nos passar por aquilo que não somos, porque um dia, toda essa farsa, toda essa imposturice, nos cairá em cima, transformando a nossa vida numa expiação contínua e dolorosa.
Só os ingénuos, os descrentes ou os utópicos acreditam num futuro fingido e hipócrita, recheado de falsos valores, assente na fantasia, no sonho, na ostentação e na vaidade.
São esses – sobretudo os hipócritas – que, confusos ou desorientados com a poeira que levantam no seu caminho, deixam de ter uma clara e verdadeira visão das realidades. Pensam enganar e acabam enganando-se a si próprios. De nada lhes vale ostentar uma religiosidade que não têm, nem exteriorizar sentimentos que não possuem.
Infelizmente a sociedade está cada vez mais cheia desses falsos profetas e de uma nova espécie de Judas que julgam tudo poder fazer!
A Mensagem do Evangelho é constantemente traída por todos esses novos «vendilhões» que frequentam o Templo e consigo levam e fazem alastrar sobre as sua seculares pedras do chão, nódoas de riqueza, de vaidade e de hipocrisia, sendo esta uma das mais difíceis de lavar.
«Os hipócritas mentem como cidadãos honestos, são falsos pregadores das coisas de Deus e não passam de sepulcros caiados, bem enfeitados por fora, mas cheios de podridão por dentro...» – são palavras de Cristo.
Todos nós temos defeitos, todos erramos, todos somos imperfeitos. Mas também a todos nós concedeu Deus o dom de pensar, raciocinar, de saber avaliar o bem e o mal.
Infelizmente, uns por falta de cultura, outros por vaidade, são incapazes de fazer uma avaliação interior e reconhecer que estão errados. Auto-elegem-se pregadores de moralismos de feira e de mãos erguidas e olhos no céu, é vê-los representar uma farsa que só a eles convence. Mas, como diz o provérbio, “o maior cego é aquele que não quer ver…”

A PAPAGÁLIA



Em tempos muito remotos – tão remotos que ainda toda a bicharada falava – existiu à beira mar, um país original habitado unicamente por Aves.
Fundado pela família dos Psitácidas que adoravam a água, o reino do Silêncio, (nome dessa nação da passarada) era banhada a ocidente por um mar de água doce, que não só contribuía para a fertilização das suas terras, mas que também, e graças às suas correntes, auxiliava os seus habitantes nas migrações que faziam.
Durante décadas, Havisrara I, ocupou o poleiro que lhe servia de trono sem que a existência pacífica dos seus súbditos sofresse muitas perturbações, pois os que não se sentiam bem, emigravam, e os que resolviam ficar, mais pena, menos pena, lá iam vivendo …
Porém, como a evolução dos tempos nem a passarada poupa, no Reino do Silêncio, começaram a aparecer os primeiros sintomas de mal-estar que iriam tomar o carácter de conspiração logo após a morte do monarca.
Sucedeu-lhe Havisrara II que no início do seu reinado tentou ainda conciliar as opiniões. Em vão!...Pouco tempo depois era acusado de imitador, porque, diziam, tendo aprendido a papaguear com o seu antecessor, outra coisa não poderia fazer que não fosse repetir o que tinha ouvido.
O descontentamento foi alastrando até que numa manhã de nevoeiro o inevitável aconteceu: rebentou a deplumação!
Um grupo de psítacos, que ficaria conhecido por Movimento dos Papagaios, do qual faziam parte também as Araras, as Catatuas e outra passarada miúda, atacou o Poleiro Real à bicada, desempoleirou o monarca, abriram as gaiolas e proclamara a Aviscracia, ao mesmo tempo que mudavam o nome à terra-mãe que de Reino do Silêncio que era, Papagália ficou a chamar-se.
À surpresa que tal facto causou, seguiu-se a euforia que caracteriza tais acontecimentos e que tanto entre os homens como entre os bichos, chega por vezes também a inverter o sentido dos mesmos.
Em palratórios emplumados, os chefes dos bandos que se tinham formado logo após a proclamação da Aviscracia, começaram os seus voos de propaganda. Ao mesmo tempo que denunciavam os erros dos antigos monarcas, prometiam à passarada o céu inteiro para voar. Não haveria mais discriminações, nem de plumagens, nem de vocabulário. Era preciso união entre todos, pois derrubada que foi a escravatura, os papagaios unidos jamais seriam vendido.
O bando dos papagaios roxos pintados às pintinhas (PRPP), o dos papagaios cinzento-pardos (PCP), o dos papagaios de penas sarapintadas (PPS) o dos papagaios de penas matizadas (PPM), o dos papagaios sem distinção (PSD) o dos papagaios com dois sinais (PCDS) e a união dos palradores (UDP), atroavam a floresta inteira com constantes papagueados, tentando, cada qual, conquistar o maior número possível de aderentes.
Atraídos pelo barulho, regressaram à terra-mãe papagaios há muito ausentes. Anchos, de pluma luzidia e bico adunco, com vocabulário aprendido na estranja espanejando vaidosos, eles deslumbravam a passarada incauta e confiante.
Autênticos realejos movidos por corda invisível, depressa dominaram toda aquela gente alada que durante muitos anos fora privada de outro vocabulário que não fosse o que os monarcas ensinavam…
Passaram os dias, meses e os anos foram também passando, mas como nem só de papaguear vive o papagaio…
A euforia inicial cedeu o lugar ao desencanto: as araras e as catatuas que tinham tomado parte no movimento, sentiam-se frustradas e algumas migraram até.
Os papagaios e sobretudo os estrangeirados eram agora os senhores e mandadores e ocupavam os melhores poleiros. O aumento da população motivado pelo regresso de milhares de Aves, fez com que começassem a escassear as bagas nas árvores e avizinhava-se um período negro de fome.
Tudo tinha mudado, é certo, mas com essa mudança nada tinha melhorado!
A Reforma Avícola que tinha sido imposta pelos dois bandos mais influentes, o dos papagaios cinzento-pardos (PCP) e o dos papagaios sem pintas (PSP), não fez mais do que exacerbar a paciência da passarada.
O bando dos papagaios sem distinção (PSD), de tão desiludido, abandonou os seus lugares na capoeira – uma espécie de anfiteatro natural, constituído pela copa de uma árvore frondosa onde se tomavam as decisões mais importantes – dissociando-se dos outros bandos.
Num esforço derradeiro para fazer face à degradação galopante da ecologia alada, foi pedida a intervenção de uns passarões chamados Etólogos e versados na ciência de depenar sem dor. Pertenciam à família dos milhafres independentes (FMI) mas trabalhavam sempre em associação com o bando dos milagreiros (BM) que era constituído por uma espécie de conirrostros exímios em resolver operações penosas.
Depois de várias auscultações fizeram o diagnóstico, mas como os bandos não se entendiam quanto às medidas sanitárias a adoptar, não puderam os «veterinários» mais fazer do que receitar uns pozinhos para prolongar durante algum tempo mais, a vida da já agonizante Papagália!
Muitos dos papagaios mudavam de plumagem e abandonavam o bando a que inicialmente pertenciam.
Outros perdiam o sentido da orientação e voavam em ziguezagues. Era o começo do fim.
Entretanto, o nome dos antigos monarcas começava a ser evocado como símbolo de um tempo em que sabia bem voar, embora, por vezes, os ventos fossem contrários e o céu bastante limitado!...
Possessos de uma histeria barulhenta, pássaros, passarinhos e passarões, atroavam a floresta numa cacofonia sem par. Finalmente, com a poluição das nascentes e o desequilíbrio ecológico, um surto de psitacose aguda dizimou toda a população que morria esvaindo-se em verborreia malsoante…
E assim desapareceu a Papagália!
Os turistas que hoje visitam esse espaço geográfico onde outrora existiu esse país de Aves, fazem, por vezes, aproximações bastante originais ao ouvirem contar esse passado longínquo, vendo desfilar um presente que parece não ter futuro.
Numa entrevista recente à RTP (Revue de la Transmigration des Perroquets), um desses turistas, ornitologista por desporto e antropólogo por necessidade, chegou mesmo a afirmar que «a Papagália continua a existir, tendo apenas mudado de fauna…»
O que parece corresponder à verdade, pois perante tão grave declaração, não se registou nenhuma reacção dos governantes.
Na dúvida!...
Janeiro de 1983

quinta-feira, julho 02, 2009

Será que ele vai mesmo marrar?!...



Para os que não estão bem enfronhados nessa coisa nojenta que é a política, informo que a foto é do ministro Manuel Pinho.
Que belo espectáculo para os estrangeiros verem até que ponto chegámos!
Incompetente, grosseiro e reles! O que nos espera...Pobres de nós se continuamos a ser governados por esta escumalha. Vamos lá ver se o primeiro ministro os "tem" no sítio e põe o figurão no olho da rua...Mas já!...