Distraído que andava quase me esquecia de encerrar o meu blogue para "balanço"...
Já com meio pé em terreno do novo ano, tempo ainda para desejar a todos os que me visitam, um 2009 com muita saúde. Não vos desejo mais nada, porque com ela todo o resto se pode alcaçar.
Um conselho: Vive a tua vida "HOJE", porque o "AMANHÃ" não passa de uma esperança fugidia. que mesmo estendendo as mãos para a agarrar nunca temos a certeza de o conseguir.
quarta-feira, dezembro 31, 2008
quinta-feira, dezembro 11, 2008
Paixões
Quando Deus nos concede a graça de percorrermos com saúde e lucidez uma considerável etapa da caminhada da vida, raro é o dia em que, ao acordar, não sintamos como que uma espécie de mola, um forte impulso que nos faz erguer as mãos ao céu e agradecer!
Acontece comigo e penso que acontecerá com todos aqueles que, como eu, desde muito novos, e apesar das muitas marteladas que levaram e deram nos próprios dedos, souberam sempre encarar a vida com optimismo, humildade, tolerância, esperança e muita fé.
O artista, o cientista, o poeta, o ourives da imaginação, o arquitecto do diálogo e até o modesto artesão, todos eles devem sentir, embora cada um à sua maneira, esse sentimento de gratidão, essa bênção que é, afinal, como que a comunhão do divino.
Quando, percorridos muitos quilómetros do percurso, experimentamos o sentimento do dever cumprido sem que durante a corrida nunca tenhamos tentado molestar o companheiro que seguia a nosso lado, confessamos, sem vaidade, que nos sentimos imensamente felizes e contentes. E por que não dizê-lo, orgulhosos, até!...
Nesta etapa da vida em que as paixões esfriaram, em que já não temos necessidade de nos deixarmos arrastar pelo favoritismo tendencioso das competições que se realizam à nossa volta, devemos apenas pedir forças e saúde para que possamos continuar a percorrer, até ao apito final, estes restantes quilómetros da maratona que Deus nos impôs.
Viver apaixonado pela vida, sem, contudo, nos deixarmos dominar pelas paixões do passado, pelas recordações de uma juventude que já passou, cuja assumpção nos poderá tornar ridículos aos olhos dos outros é, quanto a mim, o melhor remédio contra sentimentos de tédio e de desistência.
Bem sei que com os “atractivos”cada vez mais cativantes desta vida moderna a "Arte de Saber Envelhecer" se torna mais difícil de aprender.
E o que piora ainda mais a aprendizagem é que muita gente teima em tomar como ponto de referência esse rectângulo plastificado a que dão o nome de Bilhete de Identidade! Bem sei que é obrigatório trazê-lo connosco, mas daí a deixar que ele nos escravize...
Contava-me há dias um Amigo que na Universidade Sénior do Rotary Cube de Tondela, uma senhora com a bonita idade de 84 (oitenta e quatro) anos de idade tinha começado a frequentar as aulas de informática e que passado pouco tempo, muito contente e feliz exultava de alegria por já saber servir-se do computador!
Velho e idoso não é a mesma coisa: o idoso renova-se em cada dia que começa; o velho vai acabando noite após noite. O idoso, olha o sol que desponta, conserva ainda um clarão de esperança; o outro, o velho, contempla o dia que termina, a escuridão, o tempo que já lá vai….
Talvez o tempo passe mais depressa quando vivemos apaixonados pela vida. Mas, cá na minha, essa paixão faz com que a velhice demore mais tempo a chegar.
Acontece comigo e penso que acontecerá com todos aqueles que, como eu, desde muito novos, e apesar das muitas marteladas que levaram e deram nos próprios dedos, souberam sempre encarar a vida com optimismo, humildade, tolerância, esperança e muita fé.
O artista, o cientista, o poeta, o ourives da imaginação, o arquitecto do diálogo e até o modesto artesão, todos eles devem sentir, embora cada um à sua maneira, esse sentimento de gratidão, essa bênção que é, afinal, como que a comunhão do divino.
Quando, percorridos muitos quilómetros do percurso, experimentamos o sentimento do dever cumprido sem que durante a corrida nunca tenhamos tentado molestar o companheiro que seguia a nosso lado, confessamos, sem vaidade, que nos sentimos imensamente felizes e contentes. E por que não dizê-lo, orgulhosos, até!...
Nesta etapa da vida em que as paixões esfriaram, em que já não temos necessidade de nos deixarmos arrastar pelo favoritismo tendencioso das competições que se realizam à nossa volta, devemos apenas pedir forças e saúde para que possamos continuar a percorrer, até ao apito final, estes restantes quilómetros da maratona que Deus nos impôs.
Viver apaixonado pela vida, sem, contudo, nos deixarmos dominar pelas paixões do passado, pelas recordações de uma juventude que já passou, cuja assumpção nos poderá tornar ridículos aos olhos dos outros é, quanto a mim, o melhor remédio contra sentimentos de tédio e de desistência.
Bem sei que com os “atractivos”cada vez mais cativantes desta vida moderna a "Arte de Saber Envelhecer" se torna mais difícil de aprender.
E o que piora ainda mais a aprendizagem é que muita gente teima em tomar como ponto de referência esse rectângulo plastificado a que dão o nome de Bilhete de Identidade! Bem sei que é obrigatório trazê-lo connosco, mas daí a deixar que ele nos escravize...
Contava-me há dias um Amigo que na Universidade Sénior do Rotary Cube de Tondela, uma senhora com a bonita idade de 84 (oitenta e quatro) anos de idade tinha começado a frequentar as aulas de informática e que passado pouco tempo, muito contente e feliz exultava de alegria por já saber servir-se do computador!
Velho e idoso não é a mesma coisa: o idoso renova-se em cada dia que começa; o velho vai acabando noite após noite. O idoso, olha o sol que desponta, conserva ainda um clarão de esperança; o outro, o velho, contempla o dia que termina, a escuridão, o tempo que já lá vai….
Talvez o tempo passe mais depressa quando vivemos apaixonados pela vida. Mas, cá na minha, essa paixão faz com que a velhice demore mais tempo a chegar.
segunda-feira, dezembro 01, 2008
A Alternativa
Nunca fui um fanático da bola, nem nunca a paixão por qualquer clube me dominou ou escravizou ao ponto de perder o sono ou a tramontana. Desde tempos longínquos que tenho um “fraquito” pela “Briosa” que vem de 1939 quando a sua equipa de Futebol foi a vencedora da primeira edição da Taça de Portugal.
Era no tempo em que a maioria dos jogadores eram estudantes universitários e em que o futebol era pobre e não suscitava ainda tantos excessos e tanta polémica.
No entanto não quer isso dizer que não goste de ver um bom jogo de futebol e que não torça pela equipa lusa, mormente quando joga com outros Países.
Esclareço também que na minha tribo há várias tendências clubistas, mas o “dragão” é o que mais “ordena”, ou não fosse a minha chefe a detentora da batuta quando há “concertos!...”
E não imaginam os “mimos” com que ela presenteia o “onze”, o treinador ou até o homem do apito quando as bolas só entram na baliza dos azuis e brancos!
Vem este intróito a propósito da derrota da equipa portuguesa frente à equipa dos nossos irmãos brasileiros.
Cá na minha nem foi assim uma vergonha por aí fora. Humilhação? Qual quê? Se tivéssemos perdido frente ao Burkina Fasu, talvez…mas com os nossos irmãos brasileiros… ficou tudo em família.
Mas confesso que fiquei perplexo, não tanto com a derrota mas com a “insistência”... Seis “secos”contra dois!
Depois, como sempre acontece nessas andanças do futebol, vieram os pedidos de desculpas ao Povo português: pediu desculpas o seleccionador, os jogadores, o presidente da Federação e parece que até a estrela do onze português, o craque que sonha em ser o maior do mundo, não se mostrou à altura de merecer esse título. É tão bonita a humildade!
Mas voltando ao “desastre”, eu penso que tenho uma solução para evitar que uma nova hecatombe aconteça. Então é assim: O nosso Primeiro-Ministro à semelhança do que fez com as criancinhas das escolas oferece a toda a equipa, começando pelo Presidente da Federação e a acabando no homem que trata dos equipamentos, um Magalhães. Com o dito cujo entrega também um Kit com jogos de futebol para computador sem esquecer aquele do “Eu é que sou Burro?...”do Scolari. A seguir chama para formador o Manuel José que tem feito obra lá pelas terras dos Faraós. Seis meses depois nomeia uma comissão de avaliação presidida pelo camarada Chavez, emérito esquerdino e perito em jogadas duvidosas, e então veremos o resultado desse curso de formação profissional…
Caso este estratagema não resulte, resta-nos uma alternativa – mandar o Leixões representar Portugal.
sábado, novembro 01, 2008
Numa manhã de Outono
Desceu a temperatura, as noites começam a estar frias, os dias são mais pequenos e as noites mais longas. Chegou o Outono!
Ele vem – cumprindo o calendário de Deus que o homem ainda não conseguiu alterar completamente – ele vem, dizia eu, devolver à Terra as roupagens com que ela se vestiu no Verão…
Hoje é Domingo, a manhã está fria, mas o céu está azul. Todos os anos, nestes primeiros dias do Outono, gosto de passear pelo meu quintal e admirar todos estes mistérios da Natureza!
Como na vida, as estações do ano têm, também, cada uma, as suas belezas e os seus atractivos próprios. Como um pintor que mistura na sua paleta várias cores para fazer um belo quadro, assim o Outono pintalgou tudo isto com belos e variegados tons!...
E como agora está mais amena a temperatura, venham comigo e apreciem a beleza deste tapete colorido; vejam a beleza daquela mistura de cores das folhas das videiras, além, na parreira; apreciem este gigantesco porco-espinho que é o castanheiro, com os seus ouriços, alguns de boca aberta, rindo, mostrando os dentes – as castanhas!
Vejam aqui as romãs, coradas, macias, como a tez de um bebé recém-nascido!
Ali, à direita, a groselheira com os seus frutos vermelhos – o supermercado da passarada. Vejam aquele casal de rolas que esvoaçou mal me pressentiu, e que já vai de papinho cheio!
Lá ao fundo, o azevinho e as suas bolinhas: umas verdes, outras acastanhadas, outras cores do carmim; a nogueira, carregada de frutos, alguns com o invólucro ainda verde, outros já abertos com as nozes prestes a cair!
Aqui, a contrastar com o despontar de novos frutos das laranjeiras, o fim das rosas com a queda das pétalas que juncam o chão e fazem um tapete multicolor e viscoso. O princípio e o fim. Como na vida. Uns nascem e outros morrem!...
E este cheiro a mosto vindo da adega de algum vizinho onde o vinho ainda ferve e que ao misturar-se com esta fragrância que se exala da terra fecundada pela chuva que caiu há dias, produz em nós um sensação de tão indizível bem-estar e de tanta espiritualidade que se torna impossível descrever?!...
E a carícia deste brando vento vindo da Serra que faz estremecer as folhas das laranjeiras e desprender as gotas de água que caem na terra como lágrimas de alegria e de reconhecimento pela chuva – essa riqueza que veio do Céu!
Encham os pulmões com este ar puro e sorvam esta brisa fresca e saudável que tonifica o corpo e reconforta a alma!
É Outono, caem as folhas. Na Natureza como na Vida, há sempre Deus. Há fim, e há recomeço. Há sempre beleza. Há encanto, e há sempre um sonho que se desfaz, e uma esperança que renasce...
domingo, outubro 26, 2008
A alcateia
Fala-se muito em crise, mas poucos são aqueles que se interrogam e procuram saber quais os factores que contribuíram para que chegássemos a esta encruzilhada e ficássemos desorientados sem saber qual o caminho que devemos seguir.
A mim, simples e inculto cidadão deste País, o que mais me intriga é o facto de no meio de tantos especialistas, tantos intelectuais, tantos politólogos, tantas sumidades e tantos adivinhos não houvesse um que se apercebesse que, mais dia menos dia, isto ia acontecer!...
Era impossível que isto não desse o “estoiro”! Sem trabalho como seria possível aguentar o barco?!... Com tanta gente a viver à rica, a gastar à barba longa e a esbanjar “o nosso dinheiro”, o dinheiro dos que sempre trabalharam, que outro desfecho se poderia esperara que não este a que chegámos?
Diariamente os jornais e outros meios de comunicação trazem até nós casos flagrantes desta vida desregrada, destes gastos supérfluos que acontecem por esse Portugal fora. São cada vez menos os que trabalham e os que produzem, e cada vez mais os que estragam e comem à custa dos poucos que ainda vão trabalhando.
Infelizmente é na classe dirigente, nessa classe que deveria dar o exemplo, que surgem os maiores abusos, os maiores escândalos e a maior falta de vergonha e de honestidade.
Tenho à minha frente a notícia que nos dá conta de que três administradores da empresa da Câmara Municipal de Lisboa que gere os bairros sociais da capital gastaram só em restaurantes entre 2006 e 2007 um total de 64.413 mil euros em 621 refeições, pagando em média por cada uma 173 euros!...
Não há dúvidas de que grande parte dos que mandam tem a consciência na conta do Banco e a barriga no cérebro!...
Já em tempos éramos conhecidos por comilões e como escreveu Júlio Dantas, «somos um país de intoxicados. Não erraria muito quem fosse até ao extremo paradoxal de atribuir aos erros e às exuberâncias seculares da cozinha portuguesa todos os desastres seculares políticos que nos têm afligido. A nossa planturosa cozinha de artríticos, duma abundância monacal, com leitões e vitelas inteiras nadando em molho dentro de bandejas de prata, tem, pelo menos, graves responsabilidades nas grandes catástrofes nacionais…»
Todos os males que presentemente nos afligem têm origem em abusos. E o que me revolta e a muito mais gente é que apesar de não termos abusado, somos obrigados a pagar os abusos dos outros. E a revolta é ainda maior ao verificar que muitos dos membros dessa cambada de parasitas, saem quase sempre impunes das trafulhices que fazem. Mas como dizia meu Avô das barbas: “os lobos não se comem uns aos outros… “
Homónimos
O Outono tinha começado há dias. As folhas amarelecidas começavam já a fazer um tapete sob a parreira que dava acesso à casa. Nas videiras havia ainda alguns restos de cachos de uvas que tinham escapado à tesoura dos vindimadores.
O João, um petiz de oito anitos, mochila às costas e “Magalhães” pendurado na mão esquerda, de vez em quando parava e, em bicos de pés, lá ia depenicando os bagos dos moscatéis.
Tinha recebido o “Magalhães” naquele dia e estava ansioso por mostrar ao pai aquele brinquedo que lhe haviam oferecido na escola e que, segundo a professora, era “coisa” que tinha lá dentro tudo o que era preciso para fazer dele um verdadeiro homem…
Até o Anacleto que era pouco dotado para aprender, iria tornar-se um sábio, acrescentara a D. Matilde… Livros, borracha, calculadora, dicionários, tudo isso a máquina substituirá. Até o trabalho de pensar será aliviado. O “Magalhães” pensará por vós, acrescentara a professora.
O que é preciso é saber servir-se dele – tinha reforçado um senhor que, segundo a professora, devia ao “Magalhães” tudo o que era, e tudo o que tinha.” (O petiz não sabia que o fulano era comissionista no negócio do Tio Zé!...)
Mas, ingénuo ainda, o João, à medida que se ia aproximando de casa, mais eufórico se sentia pela surpresa que iria fazer. Sobretudo ao pai que estava desempregado e para afogar as mágoas passava os dias a beber, insultando e chamando aqueles nomes feios, que todos conhecemos, aos nossos digníssimos mandantes.
Pensava o petiz, na dele, que a “maquina,” segundo tudo o que ouvira, iria resolver todos os problemas incluindo o da falta de dinheiro lá em casa…
O pai, cigarro na mão e já bastante eufórico como geralmente acontece com os fiéis amantes do deus Baco, conversava na soleira da porta com dois amigos, também eles seguidores acérrimos dos preceitos do mesmo deus…
João, sorridente, nem se lembrou do «olá pai!» e disparou: Olha o meu “Magalhães!”…
E o pai, olhos esbugalhados: Não, eu não acredito! Não me digas que trazes nessa caixa esse safado do Magalhães que ainda me deve o dinheiro da junta de bois que lhe vendi há dois anos?!...
-Não, pai! Isto é um computador. Aquela caixa que agora dão na escola e que ensina tudo. É o Magalhães…
-Na escola disseram-te isso? Fia-te neles!... Eu também me fiei no Magalhães quando lhe vendi a os animais e até agora, nem bois nem dinheiro…
-Mas, ó pai, isto é uma máquina que nos ensina e tem, como diz a senhora professora, uma coisa que se chama tecnologia de ponta…
-Pois! Os bois também tinham pontas, mas agora não há ponta por onde eu lhes pegue. Raios partam o Magalhães…
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quinta-feira, agosto 14, 2008
Então e os velhos?...
Sempre que escrevo sobre as angústias, os medos e as incertezas ou sobre a falta de competência, de honestidade e de bom senso que caracterizam o actual momento em que vivemos, rara é a vez que não receba na volta uns “miminhos”, quer por palavras, quer por pérolas literárias, cuja transcrição a decência me impede de fazer.
Bem sei que de nada vale insurgir-me seja contra o que for, mas por mais que tente não consigo ficar indiferente perante tanta falta de justiça, tanta prepotência e, sobretudo tanto desprezo pelos mais velhos, pelos idosos.
É raro o dia em que através da Imprensa não surjam, promovidos pelas Autarquias, novos programas de lazer, culturais ou lúdicos destinados a jovens. Quanto a programas que ajudem os mais velhos a esquecer, ainda que por momentos, a sua condição de vulnerabilidades e carências, raramente se promovem… Os idosos são cada vez mais esquecidos e para além de um passeio anual ou um almoço em conjunto, pouco mais se faz para amenizar um pouco a sua solidão. Não! …
Não esqueço que os jovens são os homens de amanhã, mas seria bom que também os velhos não fossem esquecidos e lhes fosse dada, se não a mesma, pelo menos um pouco mais de atenção.
Os velhos – principalmente os anciãos – sempre foram peças essenciais da sociedade. Sempre, excepto na sociedade actual. Não vou falar das míseras pensões que auferem, porque por mais que se fale, de nada adianta.
Seria bom que os governantes em vez das visitas relâmpago que fazem para presidir a inaugurações onde por vezes se desbarata dinheiro em jantaradas e folclore, permanecessem alguns dias em Misericórdias e Lares para se inteirarem da situação dos utentes e ao mesmo tempo indagar da “ginástica financeira” que essas Instituições têm de fazer para proporcionar aos seus hóspedes um fim de vida com a dignidade e o carinho que merecem!
Em vez de um ritmo acelerado e desmedido, em vez de um crescimento anárquico, as autoridades deveriam apostar num desenvolvimento ponderado, colocando a pessoa humana sempre em primeiro plano. A economia do futuro deve ser um acto de solidariedade em todos os domínios da vida humana indo ao encontro das classes pobres e idosas, combatendo a desumanização e as injustiças existentes. Urge promover políticas solidárias e humanistas e redimensionar a prosperidade material com o fortalecimento espiritual. A cultura autárquica para ser posta ao serviço de todos os cidadãos tem de possuir uma dimensão humanista e social. Ela tem de apostar no envolvimento e na participação de todos – novos e velhos.
A verdadeira política é uma ciência que deve estar ao serviço das pessoas e do bem comum sem quaisquer excepções. Diz-me a experiência que em política não há amizades, há interesses. No entanto, tratando-se de idosos, de homens e mulheres que nos deram o ser, negar-lhes um sorriso no fim da caminhada, é negar a nossa própria condição de seres humanos.
sábado, julho 26, 2008
Dia dos Avós
Diz-nos a história antiga que um famoso esculápio de nome Cláudio Galeno que foi médico particular do imperador Marco Aurélio, teria afirmado algures num dos seus opúsculos que um País em que, pelo menos, oitenta por cento da sua população não ria a bom rir, poderia ser considerado uma necrópole de seres vivos!
Depois de ter reflectido um pouco sobre o assunto e apesar de todas as palhaçadas a que temos assistido, verifiquei que entre nós o riso está em queda livre. Dos trinta por cento que que ainda riem, grande parte é constituída por políticos, futebolistas e trafulhas…
Ora como dizem que a “crise” chegou a todos os sectores da vida nacional ao ponto de nenhum oferecer confiança, e como possuímos um autêntico alfobre de contadores de anedotas que são os políticos, sabem do que me lembrei? Isso mesmo… De contratar alguns deles e de investir no mercado do riso! Ainda isento de IVA, sem necessitar de receita médica, além de ser ainda mais barato que os “genéricos”é também a melhor arma para enfrentar o dia a dia que cada vez se torna mais difícil de gerir.
E a propósito, um amigo meu que, nas horas vagas, se dedica ao estudo das antigas formas de humorismo, lembrava-me há dias aquela antiga frase francesa: «Les portugais sont toujours gais!...»
Aqui está mais uma razão para não deixarmos cair por terra os nossos pergaminhos, a nossa fama de outrora. Aliás, não podemos também esquecer que, em cada página da nossa História antiga, é raro não aparecer um humorista!... Isto para já não falar da nossa História recente em que todas as páginas são democraticamente hilariantes!...
Posto isto, pensei na criação de mais um curso universitário, onde se ensinassem apenas as várias maneiras de fazer rir o pagode…uma espécie de terapia do riso. Com todo o pessoal a rir, muitas coisas mudariam no país, sobretudo no capítulo da saúde. Não dizem que «rir é o melhor remédio?»
Há tempos, dizia-me uma netinha, falando do seu Avô: «Meu Avô riu sempre muito. À aproximação dos cem anos, começou a rir mais, e ria por tudo e por nada. E como o riso é contagioso, todos nós ríamos com ele e divertíamo-nos muito. Num Domingo acordou ainda mais sorridente e não foi possível fazer-lhe a barba de tal maneira o seu corpo era sacudido por acessos de riso que impediam qualquer aproximação da navalha de barbear. De tanto rir as lágrimas deslizavam em catadupas pelo seu rosto enrugado. Depois, cerca do meio-dia, começou a olhar-nos de uma forma estranha rindo a bandeiras despregadas. De repente, notámos que ele não se mexia. Foi o fim!... O meu Avô conservava ainda um sorriso nos lábios, mas ia já a caminho dos anjinhos… E choraram?... – perguntei eu. - «Então acha que íamos chorar por uma homem que morreu a rir? Rimos todos, porque foi a melhor forma de homenagear na morte, quem sempre riu em vida…»
Eis um grande incentivo para a criação do tal curso de terapia do riso de que acima falei. Negócio lucrativo… Aceito sócios com capital. O riso forneço eu.
Depois de ter reflectido um pouco sobre o assunto e apesar de todas as palhaçadas a que temos assistido, verifiquei que entre nós o riso está em queda livre. Dos trinta por cento que que ainda riem, grande parte é constituída por políticos, futebolistas e trafulhas…
Ora como dizem que a “crise” chegou a todos os sectores da vida nacional ao ponto de nenhum oferecer confiança, e como possuímos um autêntico alfobre de contadores de anedotas que são os políticos, sabem do que me lembrei? Isso mesmo… De contratar alguns deles e de investir no mercado do riso! Ainda isento de IVA, sem necessitar de receita médica, além de ser ainda mais barato que os “genéricos”é também a melhor arma para enfrentar o dia a dia que cada vez se torna mais difícil de gerir.
E a propósito, um amigo meu que, nas horas vagas, se dedica ao estudo das antigas formas de humorismo, lembrava-me há dias aquela antiga frase francesa: «Les portugais sont toujours gais!...»
Aqui está mais uma razão para não deixarmos cair por terra os nossos pergaminhos, a nossa fama de outrora. Aliás, não podemos também esquecer que, em cada página da nossa História antiga, é raro não aparecer um humorista!... Isto para já não falar da nossa História recente em que todas as páginas são democraticamente hilariantes!...
Posto isto, pensei na criação de mais um curso universitário, onde se ensinassem apenas as várias maneiras de fazer rir o pagode…uma espécie de terapia do riso. Com todo o pessoal a rir, muitas coisas mudariam no país, sobretudo no capítulo da saúde. Não dizem que «rir é o melhor remédio?»
Há tempos, dizia-me uma netinha, falando do seu Avô: «Meu Avô riu sempre muito. À aproximação dos cem anos, começou a rir mais, e ria por tudo e por nada. E como o riso é contagioso, todos nós ríamos com ele e divertíamo-nos muito. Num Domingo acordou ainda mais sorridente e não foi possível fazer-lhe a barba de tal maneira o seu corpo era sacudido por acessos de riso que impediam qualquer aproximação da navalha de barbear. De tanto rir as lágrimas deslizavam em catadupas pelo seu rosto enrugado. Depois, cerca do meio-dia, começou a olhar-nos de uma forma estranha rindo a bandeiras despregadas. De repente, notámos que ele não se mexia. Foi o fim!... O meu Avô conservava ainda um sorriso nos lábios, mas ia já a caminho dos anjinhos… E choraram?... – perguntei eu. - «Então acha que íamos chorar por uma homem que morreu a rir? Rimos todos, porque foi a melhor forma de homenagear na morte, quem sempre riu em vida…»
Eis um grande incentivo para a criação do tal curso de terapia do riso de que acima falei. Negócio lucrativo… Aceito sócios com capital. O riso forneço eu.
terça-feira, julho 22, 2008
Obrigado
Permite, Senhor, que te dirija no dia em que completo mais um aniversário natalício este humilde, mas sentido agradecimento:
«Há mais de oito décadas que me concedeste o dom inestimável da vida. Desde que nasci nunca deixaste de me encher de graças e de me dar provas de amor infinito. Como acontece com toda a gente, estes anos foram anos em que muitas coisas se misturaram: alegrias, tristezas, sucessos, derrotas, pequenas faltas de saúde, desaparecimento de familiares…
Mas com a ajuda e o auxílio que me deste eu consegui transpor esses obstáculos e caminhar sempre em frente contigo ao lado.
Hoje sinto-me rico com a família que me deste e com a experiência que adquiri por sempre me teres protegido. Por isso e dentro de mim, numa religiosidade silenciosa, a minha alma canta o meu reconhecimento.
Todos os dias na minha roda de amigos encontro pessoas idosas que têm passado dolorosos momentos – homens que não podem andar, cegos, alguns estropiados que já não conseguem pedir-te qualquer coisa e outros que perderam as suas faculdades mentais. E eu olho essas gentes e pergunto-me: E se acontecesse comigo?!...
Perante isso, hoje mesmo, enquanto gozo de boa saúde e conservo todas as minhas faculdades mentais e motoras eu agradeço e ofereço-te antecipadamente toda a minha aceitação aos teus princípios e desde agora peço que se uma ou outra dessa situação me acontecer, eu a aceite resignadamente e ela possa servir e contribuir para a salvação de algumas almas.
Se um dia a doença invadir o meu cérebro e roubar a minha lucidez, desde já, Senhor, eu me ajoelho perante Vós e prometo uma humilde e silenciosa aceitação do que me reservares.
A partir de hoje peço também para protegeres todas as pessoas que, eventualmente, irão ter a ingrata missão de tratar de mim e de me ajudar em qualquer dessas enfermidades.
Perdoa-me e esquece os momentos em que blasfemei ou que não soube aceitar as provações por que me fizeste passar por não compreender os teus desígnios.
Se um estado de inconsciência prolongada tiver de me acontecer, eu quero que cada uma dessas horas que eu viver seja um seguimento ininterrupto de acção de graça, e que o meu último suspiro seja um suspiro de amor.
Faz então com que a minha alma guiada nesse momento pela mão de Maria, se apresente perante Vós para cantar e gozar das eternas graças.
Aos que ficarem dai-lhes coragem para suportar a minha ausência, pois um dia todos nos encontraremos de novo reunidos no milagre da ressurreição.
Obrigado, Senhor.»
«Há mais de oito décadas que me concedeste o dom inestimável da vida. Desde que nasci nunca deixaste de me encher de graças e de me dar provas de amor infinito. Como acontece com toda a gente, estes anos foram anos em que muitas coisas se misturaram: alegrias, tristezas, sucessos, derrotas, pequenas faltas de saúde, desaparecimento de familiares…
Mas com a ajuda e o auxílio que me deste eu consegui transpor esses obstáculos e caminhar sempre em frente contigo ao lado.
Hoje sinto-me rico com a família que me deste e com a experiência que adquiri por sempre me teres protegido. Por isso e dentro de mim, numa religiosidade silenciosa, a minha alma canta o meu reconhecimento.
Todos os dias na minha roda de amigos encontro pessoas idosas que têm passado dolorosos momentos – homens que não podem andar, cegos, alguns estropiados que já não conseguem pedir-te qualquer coisa e outros que perderam as suas faculdades mentais. E eu olho essas gentes e pergunto-me: E se acontecesse comigo?!...
Perante isso, hoje mesmo, enquanto gozo de boa saúde e conservo todas as minhas faculdades mentais e motoras eu agradeço e ofereço-te antecipadamente toda a minha aceitação aos teus princípios e desde agora peço que se uma ou outra dessa situação me acontecer, eu a aceite resignadamente e ela possa servir e contribuir para a salvação de algumas almas.
Se um dia a doença invadir o meu cérebro e roubar a minha lucidez, desde já, Senhor, eu me ajoelho perante Vós e prometo uma humilde e silenciosa aceitação do que me reservares.
A partir de hoje peço também para protegeres todas as pessoas que, eventualmente, irão ter a ingrata missão de tratar de mim e de me ajudar em qualquer dessas enfermidades.
Perdoa-me e esquece os momentos em que blasfemei ou que não soube aceitar as provações por que me fizeste passar por não compreender os teus desígnios.
Se um estado de inconsciência prolongada tiver de me acontecer, eu quero que cada uma dessas horas que eu viver seja um seguimento ininterrupto de acção de graça, e que o meu último suspiro seja um suspiro de amor.
Faz então com que a minha alma guiada nesse momento pela mão de Maria, se apresente perante Vós para cantar e gozar das eternas graças.
Aos que ficarem dai-lhes coragem para suportar a minha ausência, pois um dia todos nos encontraremos de novo reunidos no milagre da ressurreição.
Obrigado, Senhor.»
Quatre vingt deux ans!...
«À 20 ans, j'avais tout mon temps,
La vie était belle, puis j'étais content.
Rien n'était trop dur, rien n'était trop haut,
Aux défis de la vie je levais mon chapeau.
À 30 ans j'étais encore un gamin !
Ah ! C'était facile, j'avais du temps !
Puis je m'amusais, je voyageais beaucoup
Faut dire que j'ai passé des heures de fous…
Mais à 40 ans, j’ai fallu tomber !...
On m’a pris tout un passé !...
Et il a fallu courir, regarder en avant
Pour ne pas rester au dernier rang.
À 50 ans, j'étais encore capable,
Mais j'suis devenu plus raisonnable.
Mon corps ralentit, fit quelques soubresauts
Pas question de vouloir monter trop haut !
Suis-je encore bon, suis-je encore fort ?
Je fais le possible, même contre le sort…
Aux nouvelles de 22 heures parfois je m'endors,
Sans compter des moutons et ce, sans remords.
À quatre vingt deux ans je veux être élégant
Mais mes yeux sont faibles, mes gestes plus lents…
Mes cheveux sont partis lentement,
Et la même sort ont eu mes dents !...
À quatre vingt deux ans j'écoute mon cœur :
Et il est tranquille et plein de bonheur!...
À quatre vingt deux ans ce que j'ai compris,
C’est que quand on a fait tout ce chemin,
En ouvrant la fenêtre le matin,
On doit penser à Dieu… et dire MERCI !...
(Inspirado no poema de Jean Gabin « Maintenant Je Sais», com uns pontapés na métrica aqui e ali…)
20 de Julho de 2008
La vie était belle, puis j'étais content.
Rien n'était trop dur, rien n'était trop haut,
Aux défis de la vie je levais mon chapeau.
À 30 ans j'étais encore un gamin !
Ah ! C'était facile, j'avais du temps !
Puis je m'amusais, je voyageais beaucoup
Faut dire que j'ai passé des heures de fous…
Mais à 40 ans, j’ai fallu tomber !...
On m’a pris tout un passé !...
Et il a fallu courir, regarder en avant
Pour ne pas rester au dernier rang.
À 50 ans, j'étais encore capable,
Mais j'suis devenu plus raisonnable.
Mon corps ralentit, fit quelques soubresauts
Pas question de vouloir monter trop haut !
Suis-je encore bon, suis-je encore fort ?
Je fais le possible, même contre le sort…
Aux nouvelles de 22 heures parfois je m'endors,
Sans compter des moutons et ce, sans remords.
À quatre vingt deux ans je veux être élégant
Mais mes yeux sont faibles, mes gestes plus lents…
Mes cheveux sont partis lentement,
Et la même sort ont eu mes dents !...
À quatre vingt deux ans j'écoute mon cœur :
Et il est tranquille et plein de bonheur!...
À quatre vingt deux ans ce que j'ai compris,
C’est que quand on a fait tout ce chemin,
En ouvrant la fenêtre le matin,
On doit penser à Dieu… et dire MERCI !...
(Inspirado no poema de Jean Gabin « Maintenant Je Sais», com uns pontapés na métrica aqui e ali…)
20 de Julho de 2008
sábado, julho 12, 2008
Meditações
Sinto que em cada dia que passa, alguma coisa muda em mim: os anos sucedem-se, os gostos da última estação já não são os mesmos desta. E quanto a amizades, umas secam outras renovam-se, fortalecem...
Antes da morte final deste ser móvel que tem o mesmo nome que eu, quantos homens já morreram em mim?
Se porventura me leres, amigo leitor, não penses que estou somente a falar de mim. Pensa um pouco e vê se não trata também de ti!...
Antes da morte final deste ser móvel que tem o mesmo nome que eu, quantos homens já morreram em mim?
Se porventura me leres, amigo leitor, não penses que estou somente a falar de mim. Pensa um pouco e vê se não trata também de ti!...
domingo, julho 06, 2008
Metáfora
Quando sou confrontado com um problema numa das minhas máquinas e não sei resolvê-lo, para disfarçar a minha ignorância, coço a careca e com um franzir de sobrancelhas, solto a frase do costume: máquinas são máquinas!
E é justamente a propósito das ditas que hoje vou falar da minha. Da minha máquina. Da ambulante. É uma máquina antiga, não fora de moda, mas a pedir reciclagem... No tablier apenas o rádio lhe dá um tom de modernidade. Na capota são bem visíveis as falhas na pintura, embora a chapa seja resistente. No capítulo da condução o volante tem folgas, a alavanca das mudanças já não tem maçaneta, a tracção, às vezes, emperra; as ópticas são duplas e no capítulo das mudanças, a marcha-atrás não funciona. Como já tem muito uso os problemas aparecem com mais frequência. Sem anúncio. Foi o que aconteceu há dias. Devido a uma avaria no tubo de escape fiquei sem meio de locomoção e durante uma semana não pude sair dos meus domínios.
Máquinas são máquinas… Com o desgaste dos anos, de vez em quando lá me prega uma partida e obriga-me a fazer uma pausa. Pudesse eu comprar uma nova e outro galo cantaria!...
Mas, pensando melhor, talvez até nem comprasse. É que, mesmo assim, não tenho muitas queixas a fazer. Velhinha, velhinha, mas lá vai andando. Já não dá para fazer longos trajectos nem para entrar em competições, mas o que é certo é que até agora me tem levado sempre aonde quero.
Na garagem onde faço, por norma, a manutenção, o mecânico costuma dizer que máquinas destas, já não se fabricam. E ele sabe o que diz, pois tem uma registada dois anos antes da minha e apesar de alguns problemas que teve, está também bem contente com ela. E também não quer outra…
Cá p’ra mim e ao contrário do que muitos querem fazer crer não é uma questão de marca. É sorte… Há, é verdade, alguns cuidados a ter, mas nada de exagerar. No que diz respeito a velocidades e para evitar travagens bruscas ou derrapagens, é aconselhável respeitar distâncias e nada de prego a fundo. Condução regular, sem altos nem baixos. Isto é, e como dizia o outro, nem muito vinho, nem água de mais. E a propósito de líquidos é aconselhável ter cuidado com o combustível. Nada de mixórdias. Variar sim, mas evitar misturas que possam aumentar as octanas. Cuidado com os modernos aditivos que se vendem para aumentar a potência. Em máquinas muito usadas há depósitos que já não aguentam grande pressão e o aumento de volume pode provocar danos irreversíveis em todo o sistema electrónico…
Não sou mecânico. Os conselhos que acima deixo são fruto da experiência vivida durante os dias em que tive a máquina na garagem para reparação do tubo de escape…
Vaidades
Ser vaidoso não é um defeito. Ou se é, é um defeito universal, porque todos nós o somos. Uns mais do que outros, é certo, mas por mais modestos que queiramos parecer, lá bem no fundo do nosso "eu", embora cuidadosamente disfarçada, a presunção lá está a espicaçar-nos.
E se não soubermos dominá-la, ela extravasa, e a petulância, o ridículo e a futilidade fazem de nós uns bonecos animados, uns fantoches, uma simples e grotesca imitação do ser humano.
Para concluir o raciocínio podemos afirmar que a vaidade não é defeito quando sabemos delimitar o seu campo de acção e refrear o seu ímpeto. Ter vaidade naquilo que fazemos quando ela se traduz em esmero e perfeição, deixa de ser defeito para se tornar numa virtude.
Deixa de ser vaidade também a maneira como vestimos, como falamos ou como nos apresentamos perante os outros, quando essa forma de ser se coaduna com a nossa própria personalidade.
Exteriorizar o que somos interiormente, conscientes do que na realidade sabemos ou possuímos é, acima de tudo, a afirmação da nossa verdadeira identidade. Mas cautela!... É da má interpretação desse pressuposto que nascem as mais variadas situações de hipocrisia e de prepotência...
E isso porque raramente se faz uma introspecção para aquilatar das verdadeiras potencialidades da nossa vida interna. Tentar saber do que somos capazes e até onde podemos ir, é um exercício cada vez mais em desuso. Olha-se todos os dias, e logo de manhã, para o espelho – mais um cabelo branco, mais uma ruga, olhos papudos... e quantas vezes olhamos para dentro?!...
São inúmeros os exemplos de pessoas que não tendo conhecimento do que são, do que valem, nem das suas capacidades, desfilam pela "passerelle" da vida, tentando transmitir uma imagem muito forte em cores, mas pouco ou nada condizente com a realidade.
Infelizmente isso não acontece apenas nos extractos de menor cultura. E talvez porque a autopromoção está na moda, a vaidade alastrou também à classe daqueles que, supostamente, pelos seus estudos, deveriam saber fazer a destrinça entre fingimento e realidade.
E cá vamos vivendo num mundo cada vez mais cheio de velhacos, de barrigas grandes, mas também de muita gente com fome.
Entretanto, e paulatinamente, a vaidade, manifestada através de uma obsessão de se querer ir além do que somos, vai transformando a sociedade num enorme espaço de areia movediça que acabará por tudo engolir. Não será o fim do mundo. Mas será, com certeza, o fim de muita coisa boa.
Diz-se que o futuro a Deus pertence. Porém, se os homens não ajudarem na sua construção, será muito duvidoso que Ele, apesar da sua divina bondade, assuma, sozinho, essa responsabilidade!...
sexta-feira, junho 20, 2008
Mudanças
Vim ao mundo num tempo em que era necessário muito esforço, muito trabalho, persistência e força de vontade para levar a cabo trabalhos que hoje se concluem premindo apenas um simples botão ou ligando uma pequena alavanca.
Era um tempo sem tempo – um tempo em que havia tempo para se apreciar o tempo! Um tempo em que a vida desfilava natural e pacificamente, limitada que estava a horizontes reduzidos e a normas específicas que não podiam ser ultrapassadas.
Mas à medida que o tempo foi passando, as descobertas e as conquistas das ciências e das técnicas, têm-me feito assistir a transformações tão grandes e a progressos tão ousados que só na Natureza, posso ainda encontrar pontos de referência.
Ela continua indiferente e orgulhosa seguindo o seu caminho, sem alterar as leis imutáveis que lhe foram ditadas. Sem variações no seu tempo: os dias, as noites, os meses, os anos, como num desfiar de rosário puído, vão passando, compassadamente, indiferentes às velocidades vertiginosas dos homens, e às suas ousadas incursões pelos campos do desconhecido.
Esta manhã, e talvez porque a Primavera começou, olhando da minha janela, eu senti uma identificação interior com esse meu tempo sem tempo! As árvores floridas, o chilrear dos passaritos e até as gotículas de água das folhas das plantas que brilham com o Sol nascente, tudo isso é como que uma afirmação de que o homem nem tudo conseguiu mudar, ou desviar do seu rumo!
Mas, apesar de tudo isso, quão difícil se torna resistir à pressão do meio que nos cerca e não entrar neste labirinto infernal que a muitos cega e faz esquecer os próprios valores espirituais que enobrecem e nos distinguem dos animais?!...
À medida que os anos se vão amontoando, mais nítida se torna a ideia de que o progresso tecnológico só por si, além de não garantir o bem-estar da humanidade, pode até fazer perigar o seu futuro.
Tanto os homens como os Estados precisam urgentemente de um auto-domínio que, refreando as suas ambições, oriente as suas actividades pelos caminhos da razão e da justiça para que seja, não apenas apregoado, mas encontrado e construído, o verdadeiro bem-estar da Comunidade.
Tudo isso está na mão do homem.
Falta saber se há vontade e determinação para o concretizar. Mas parece que não!...
Vive-se para ganhar cada vez mais e para o gastar não só no necessário, mas sobretudo no desnecessário. E é esta ambição que impede que se viva o momento presente com tranquilidade e paz.
Hoje a causa da infelicidade de muitas pessoas reside na sua ambição desmesurada, no desejo incontido de ultrapassar o vizinho, de possuir mais e melhor, mesmo que para tal seja necessário espezinhar valores que lhes foram ensinados desde o berço.
A par disso as injustiças sociais crescem a um ritmo acelerado. Não há sentimento de partilha e a humildade é palavra que caiu em desuso. Os valores morais foram votados ao ostracismo, ninguém respeita ninguém. São mudanças cuja origem reside apenas e só no homem. Porém, o mesmo homem, apesar de todo o avanço das ciências em tecnologia não conseguiu, até hoje, mudar qualquer das leis que regem toda a Natureza. Quaisquer que sejam as nossas crenças filosóficas e religiosas que professemos as suas regras imutáveis conduzem-nos a uma profunda reflexão.
quarta-feira, junho 04, 2008
Pontapés
Um estudo recente feito pelo Centro Europeu de Pesquisa de Assuntos Sociais sobre “As paixões do futebol” concluiu que, na Europa, os portugueses são mais viciados no sexo do que na bola e que quatro em cada cinco indígenas preferem o sexo a um bom jogo de futebol!...
Nunca acreditei muito nos resultados dessas consultas de opinião e, então neste caso, são muitas as minhas reservas e dúvidas quanto às conclusões do referido estudo.
A euforia que se viveu aquando do Euro 2004 e a que agora se está a viver com a próxima disputa do Europeu 2008, bem condimentada com a moda do “casa – descasa”, reforça ainda mais a minha certeza de que os portugueses, tanto no sexo como na bola são os maiores!
Só quem não lê revistas cor-de-rosa , não vê, em cada esquina, o entusiasmo dos namorados ou não assiste a certos programas de alguns dos nossos canais televisivos é que pode duvidar da minha afirmação…
Mas falando agora apenas de bola, não há dúvidas de que não há melhor narcótico para adormecer o Zé do que o futebol. Há dias, na cidade aonde trabalho e no dia em que a Selecção veio fazer apenas um treino, tudo parou, todos saíram à rua para ver passar a camioneta dos craques. Os sortudos que conseguiram um bilhete para assistir ao treino, mostravam-no como se tivessem na mão a chave da entrada para o Paraíso!
Mas vem de longe este fenómeno. Se fizermos uma digressão através dos tempos, encontramos em todas as épocas exemplos das reacções dessas multidões desportivas. Desde a antiguidade, passando pela Idade-Média até aos nossos dias, o fenómeno repete-se embora com roupagens diferentes. O comportamento psicológico dos adeptos pouco tem variado e a síntese do especialista brasileiro Inezil Marinho é bem elucidativa: «O torcedor é em geral um indivíduo habitualmente morigerado, que trabalha durante toda a semana, cumpre fielmente as suas obrigações, obedece às ordens dos seus superiores e é incapaz de ofender ou agredir alguém (…) Mas quando na multidão, como um dos integrantes da claque, sofre transformação radical. É capaz de dirigir os maiores insultos ao árbitro ou aos jogadores da equipa adversária, atirar-lhes garrafas ou pedras e é até capaz de agredi-los (…) Não raciocina com lucidez e é vítima de grande número de erros de percepção pela paixão que o domina, pelo partidarismo que o impede de analisar os factos como são…»
Com esta citação não quero, evidentemente, “vestir” toda aquela gente que ontem vi quase em êxtase, boca aberta e olhos esbugalhados, seguindo embevecidos os chutos dos seus deuses.
Devo dizer, no entanto, que me alegra o facto de ver que há cada vez mais adeptos do pontapé!
Pena é que eles (os pontapés) se fiquem apenas pela bola…
domingo, junho 01, 2008
Domingo
Hoje é domingo, é o dia do Criador, o dia em que parece querermos fugir do tempo: repousar, deixar de pensar nas obrigações que nos apoquentam ao longo da semana. Viver o domingo em paz, sem pressas, interiorizando o seu verdadeiro sentido é uma virtude, vivê-lo com humildade, olhar mais para nós e para os outros, praticar a solidariedade e tomar um banho espiritual. Domingo é o dia do Senhor! Mas…Escravo de hábitos antigos, de África, onde tudo ficava longe, mas ao mesmo tempo “perto”, habituei-me a participar na missa de sábado, na missa vespertina, porque me permite uma melhor interiorização dos mistérios de Deus, não só porque não há aquela ostentação de Domingo, mas também porque me parece mais humilde e propícia a um recolhimento mais verdadeiro.
No entanto, aqui estou, hoje, Domingo, e permitam que partilhe convosco uma oração de S. Francisco de Assis que traduzi para vós:
«Senhor, faz de mim um instrumento de paz:
E onde estiver o ódio, ajuda-me a pôr o amor
Onde estiver a ofensa, ajuda-me a pôr perdão
Onde estiver a discórdia, ajuda-me a pôr a união
Onde estiver o erro, ajuda-me a pôr a verdade
Onde estiver a dúvida, ajuda-me a pôr a fé
Onde estiver o desespero, ajuda-me a pôr a esperança
Onde estiver a escuridão, ajuda-me a pôr a luz
E onde estiver a tristeza, ajuda-me a pôr a alegria.»
Bom domingo para todos!
sexta-feira, maio 30, 2008
Falando de mulheres
Para variar um pouco de tema, vou hoje contar-vos uma história. Antes, porém, queria pedir-lhe, minha senhora, que não veja nela qualquer afronta, qualquer insinuação, pois tenho pelas mulheres a maior admiração e respeito. Sou até daqueles que digo e penso que, tudo ou quase tudo o que fazemos, só tem graça e faz sentido por causa delas. Elas são a coisa melhor do mundo... embora alguns teimem em excluir a deles!
Mas vamos lá à história:
Rezam velhos manuscritos que São Miguel e o Diabo, num fim-de-semana prolongado quando conversavam acerca de um novo tratado de antropologia que tinha chegado clandestinamente à biblioteca celestial, ao abordarem o capítulo referente às diferenças entre o homem e a mulher, envolveram-se numa discussão. Enquanto o Diabo dizia que todas as mulheres eram linguareiras e diziam mal de tudo e de todos, São Miguel, pelo contrário, afirmava que devia, pelo menos, haver uma que não tivesse tais defeitos. Palavra puxa palavra e S. Miguel para fundamentar a sua afirmação, resolveu alugar uma nuvem e descer à Terra em busca de uma prova real.
Depois de calcorrear montes e vales, cidades e aldeias, o Santo cansou-se de tanto andar. E tão fatigado se sentiu que resolveu deitar-se à sombra de uma frondosa moita de madressilvas.
Sucedeu, porém, que do outro lado, estavam umas mulheres que, mal o lobrigaram por entre os ramos dos arbustos, começaram logo a sua sessão de maledicência:
Era com certeza um bêbado, porque tinha a cara muito vermelha. E devia ser um ladrão. A roupa que vestia de certeza que a que tinha roubado na Igreja, pois era exactamente a mesma do S. Miguel do altar da capela das Almas...Homem perigoso e de maus instintos...
Entre as mulheres que assim falavam, havia uma velhinha que não disse mal dele e que o fitava, sorrindo, com muito carinho no olhar. E o Santo viu-a. E retribuiu o sorriso. E a candura do seu olhar.
E depois, naquela noite, quando a velhinha dormia na sua cama, o Santo levantou-a com cautela, embrulhou-a num lençol, cobriu-lhe as madeixas brancas com as suas asas de Arcanjo e abalou com ela nos braços.
Ao chegar às portas do inferno, exausto, mas contente, gritou para o interior:
-Demónio de todos os demónios, anda cá! Aqui te trago, para que vejas, a única mulher que não é linguareira, não é intriguista, nem fala dos outros.
Ouvindo tais palavras, o Diabo que estava ocupado na manutenção das caldeiras do Inferno, veio à porta alagado em suor e, ao vê-los, desata a rir como possesso que era. E perante a perplexidade do Santo, sempre a rir, e troçando dele, o senhor dos Infernos, em tom diabólico, vomitando labaredas, disparou:
- Perdeste a aposta, pobre Arcanjo. Essa mulher eu conheço-a. É, de facto, uma excepção à regra... Mas é surda e muda de nascença!
Como vê, minha senhora, isto é apenas uma história tirada das milhentas que se contavam antigamente acerca da língua viperina das mulheres. Histórias do passado, de outras eras, de outros tempos. Desses tempos longínquos em que ainda não existia, como assunto de conversa, a actual casta de políticos tagarelas e maldizentes, nem a tribo desses arrogantes e mentirosos senhores da bola… e dos apitos!
domingo, maio 25, 2008
Os bois
Porque se trata de um “produto” que me entra em casa todos os dias, português refilão que sou, julgo-me no direito de protestar junto dos “fornecedores.” Com rótulos falsos, embalagens enganosas e conteúdos corrosivos, mal se roda o botão o “produto” é expelido pela caixinha mágica qual torrente de lava de cratera de vulcão. Sofrendo quase todos os canais do mesmo mal, convergentes e coniventes na corrida desenfreada para o primeiro lugar nas audiências, pouca diferença fazem uns dos outros. Seja qual for o canal que se sintonize quase não existem diferenças: política, politiqueiros, catástrofes, escândalos, tudo é parecido, tudo é chato, tudo é vulgar, tudo é tristemente igual.
Diz-se por aí que temos um canal público. Não acredito. Ou será que lhe chamam público só porque ele é suportado com o dinheiro dos contribuintes?
Fala-se muito em formação profissional, em mudança de mentalidades, em civismo, em educação… Fala-se. Só isso, pois ninguém parece interessado em passar das palavras aos actos e promover, por intermédio da “caixinha mágica”, campanhas de sensibilização abrangendo essas áreas.
Ninguém duvida que hoje a televisão é o melhor veículo da informação. Haveria, por isso, toda a vantagem em o aproveitar fazendo e transmitindo programas que ensinassem, educassem e formassem os homens de amanhã. Mas é justamente o contrário que se verifica. Grande parte dos programas desaprendem, deseducam e desinformam. Acho que o papel da televisão em cada dia que passa mais desvirtuado aparece e menos pedagógico se torna.
Nos capítulos do civismo e da educação dos jovens, o seu papel bem orientado traria resultados extraordinários. Não devemos esquecer que o Mundo de amanhã será o que a Escola fizer da juventude de hoje. E como a Televisão, também a Imprensa escrita e falada têm o seu quinhão de responsabilidade nessa falta de preparação cujas principais vítimas são as camadas jovens. Por caprichos da história o país teve a infelicidade de ter televisão antes de adquirir hábitos de leitura. E os políticos, por interesses inimagináveis fizeram dela o único instrumento de informação e cultura. Daí que hoje muita gente considere o que se vê e o que se diz na televisão como a verdade verdadeira. E não é assim. A sociedade portuguesa com todos os seus defeitos e atrasos não é aquilo que ela quase sempre mostra. Há por esse Portugal fora muita coisa boa que mereceria ser divulgada. Em vez disso dá-se ao povo a droga que ele pede, em vez da verdade de que ele tanto precisa. Por que não se ministram através do pequeno ecrã aulas de civismo, de educação e de boas maneiras? De toda esta situação, também todos nós somos culpados. Acomodamo-nos e fatalistas, resignamo-nos…E é assim com tudo. Já dizia o nosso Eça:«o povo é um boi que em Portugal se julga um animal muito livre, porque lhe não montam na anca; e o desgraçado não se lembra da canga!...»
sexta-feira, maio 09, 2008
Invocação
Sou, por natureza, optimista. No entanto, quando olho para trás e vejo o começo da caminhada tão distante que já quase se não enxerga, confesso que só com muita força de vontade consigo manter o optimismo.
Nasci nos começos do século passado. Comecei por me deitar em lençóis de linho, tive fatos de burel, estudei à luz do petróleo, dancei ao som da grafonola, cresci aos solavancos, dei marteladas nos próprios dedos, paguei as facturas das dívidas que fiz, aprendi com os erros que cometi, atravessei a vida sem atropelar ninguém e eis-me agora no começo de outro século.
Velho? Quem disse?!...
Bem sei que o tempo está contra mim e que através do calendário e do relógio vai cumprindo a sua missão, modificando-me o corpo. E o que ele já não fez!...
Ao longo dos anos, dos meses, dos dias, das horas, dos minutos e dos segundos ele não parou, e sem dó nem piedade foi fazendo o seu trabalho: com a sua aiveca transformou um jovem rosto rosado numa cara sulcada de rugas que mais parece aquele mapa antigo da minha escola onde estavam assinalados todos os rios portugueses e seus afluentes.
O vento dos Invernos levou-me os cabelos deixando apenas umas repas que circundam uma calva luzidia muito parecida com a do santo patrono da minha aldeia. As pernas, outrora prontas a transpor qualquer obstáculo, tornaram-se pesadas e arrastá-las é o mesmo que puxar uma zorra carregada de calhaus. Do resto do esqueleto não vale a pena fazer a descrição, pois pelo que atrás disse, todos imaginam o seu estado.
Mas o que fazer se é assim que determina a lei da vida?
Nasce-se, vive-se e morre-se. Todos nascemos, vivemos e morremos. Passado, Presente e Futuro. Ora se o Passado já lá vai, se o Futuro a Deus pertence, não será lógico gozar o “agora”, o Presente, aproveitando viver os dias, as horas, os minutos e até os segundos? A vida vem de muito longe, mas ela conhece apenas o presente. Para ela, ontem é morte, e amanhã é um mistério indesvendável.
A felicidade está aqui e agora. Aqueles a quem Deus contemplou com uma velhice saudável devem aproveitar esse bem como uma bênção e agradecer-Lhe sendo generosos e solidários na vida em sociedade, partilhar sacrifícios e responsabilidades, ajudar os que mais precisam e acreditar que mesmo com a nossa pequenez podemos contribuir para um mundo mais fraterno e mais justo.
Dizia meu avô materno, – um homem de bela estatura, nariz adunco, longas barbas, que fazia lembrar um mestre da lei judaica – que a velhice era a última estação antes da paragem final. Palavras sábias!...
Todos sabemos que é impossível voltar atrás, que a carruagem não pára e que qualquer ideia passadista ou conservadora é sempre uma ideia fatalista, inquisidora ou frustrada. Mas sonhar não faz mal. O sonho é o estabilizador da alma. E muitas vezes é o que resta para alimentar o gosto pela vida. De vez em quando invade-me uma espécie de vazio, uma mão cheia de coisa nenhuma. Mas acabo sempre por inventar uma certa arte de fuga substituindo o medo pela alma. E é então que a fé me lembra que há vida para além da morte. Apesar disso e contrariando o poeta que disse que viver sempre também cansa, eu espero que Deus me ajude a suportar esse cansaço ainda por mais algum tempo.
quinta-feira, abril 17, 2008
Insónias
Há cinquenta e sete anos que tenho a mesma cozinheira. De mútuo acordo, além de tratar da paparoca, ela também passa a roupa, cose as meias, pregas os botões, escolhe as camisas que devo vestir, as gravatas que devo enrolar ao pescoço e, como já devem ter adivinhado, com toda esta promiscuidade, também me dá ordens. É ela quem manda, ponto final, parágrafo!
Por mais que lhe diga que não quero comidas fortes à noite, ela insiste e ainda ontem às sete da noite lá estava, sobre a mesa, uma açorda de marisco a piscar-me o olho… Refilei e a resposta foi a do costume: «Ó homem, se te faz mal, não comas…» Mas, (maldita gula!...) comi. Resultado: voltas e mais voltas na cama e sono… nicles!
Experimentei todas as artimanhas para que as pálpebras se fechassem e mesmo o truque de contar carneiros não resultou. A certa altura tive até a sensação de que o quarto estava cheio dos ditos lanígeros! Não havia dúvidas, Morfeu estava zangado comigo.
Levantei-me, e pé ante pé dirigi-me ao quarto que me serve de escritório. Não sei se já alguma vez vos disse que o considero como uma espécie de “esconderijo”. Sob o pretexto de que estou a trabalhar, consigo fazer com que ninguém me incomode. Se de vez em quando me batem à porta, basta eu levantar o braço para ela se fechar de novo… Bem sei que nem sempre “a minha chefe” acredita que eu esteja de facto a trabalhar a sério, mas lá faz de contas e assim evitamos a troca de algumas palavras menos meigas… Mas é ali naquele cantinho que me sinto rei e senhor.
Mas voltando à minha “espertina”, mal abri a porta do meu refúgio deparei com um cenário deveras insólito: na pequena mesa, mesmo em frente ao computador, as letras do alfabeto, estavam todas reunidas.
Do A até ao Z lá estavam elas e um pouco mais longe o K , o W, e o Y , com ar desconfiado pareciam aguardar qualquer decisão… A princípio pensei que se tratava das letras do teclado. Mas não. Elas mexiam-se sozinhas e não precisavam de dedos para se movimentarem. Eram mesmo as do alfabeto. Havia também alguns acentos gráficos e sinais de pontuação, mas o mais empertigado e que me pareceu mais nervoso foi ponto de interrogação.
Dos acentos, o til, era o mais descontraído. Das letras, as mais revoltadas pareceram-me o “C “e o “P”. Não me contive e quis saber o que se passava. Respondeu-me o ponto de admiração: «Que se tratava de um plenário convocado a pedido de algumas letras do alfabeto revoltadas com a sua despromoção com a entrada do novo acordo ortográfico. As mais furiosas eram o “C” e o “P”. O “C” não se conformava por o terem suprimido da acção e o “P” reivindicava o seu lugar no baptismo…A entrada do “K” do “W” e do “Y” estava também a ser contestada…»
Instintivamente olhei para a estante dos dicionários e quando pensei na “revolução” que os esperava, perdi o sono de vez. E num acto de solidariedade para com as consoantes que foram suprimidas de certas palavras, comecei a “martelar” furiosamente o teclado do computador, expressando assim, acordado, o meu protesto contra o acordo.
sexta-feira, abril 11, 2008
Senhor Ministro
Excelência
Todos os anos, por ocasião do aumento das pensões, costumo escrever-lhe uma carta. E, apesar de até à data não ter recebido qualquer resposta, teimoso que sou, aí vai mais uma.
Ainda pensei em não lha mandar este ano. Mas quando vi e ouvi o seu secretário de Estado, um tal Pedro Marques, empoleirado no seu galho e acoitado sob o manto da irresponsabilidade pronunciar aquele chorrilho de patacoadas, então não me contive…Como quem atira rebuçados a miúdos, o fulanito queria, todos os meses e durante catorze, enviar 68 cêntimos aos idosos pensando que com isso estava a fazer uma obra de caridade! Com que então se pagassem o aumento extraordinário aos velhotes em Dezembro, eles gastavam-no todo de uma só vez?!...
É preciso não conhecer minimamente as condições de vida em que vivem os milhões de pobres do País para proferir tais insanidades!... Saberá o Senhor Marques que, nalguns casos, para muitos reformados o aumento se traduz nuns míseros cêntimos por dia? Saberá que a pensão de muitos idosos não chega para pagar a conta na farmácia? Saberá o Sr. Pedro que muitos deles trabalharam mais de meio século sem nunca se terem sentado à mesa do orçamento, pagando sempre os seus impostos e nunca “abicharam” um cargo apadrinhado, como é o seu caso?
Se alguns figurões conseguem um montão de notas em poucos anos sem nada fazer, é porque, como diz o ditado, “na terra de cegos quem tem olho é rei...” O nosso Camões morreu pobre talvez porque só tinha um, e em vez da política optou pelos “Lusíadas”. E lixou-se... Dizem que morreu à fome e, paradoxo dos paradoxos, muitos, agora, enchem a boca com o seu nome…
No meu caso e falando de aumentos, não sei ainda o que irei fazer com o meu e o de minha mulher. Mas sou capaz de aceitar a sugestão da patroa que é de constituir uma espécie de fundo de poupança que nos permitiria nas próximas eleições ter dinheiro suficiente para comprar uma lata de tinta preta e pincéis para nos deliciarmos a borrar, nos cartazes de propaganda, as “fuças” dos novos pretendentes ao trono.
Deixe-me também dizer-lhe, Excelência, e reforçando o que acima escrevi acerca do seu secretário, que não seria pior arranjar-lhe outro cargo, pois ele não tem sensibilidade para o que ocupa. Não acha que o que ele disse foi como que um ultraje aos pobres e aos velhos que recebem uma miséria?
Em contrapartida e apesar de a percentagem ser menor, os ricos, porque auferem pensões “astronómicas", agradecem-lhe. Mas não esqueça que os pobres são muito mais. E que o seu número não cessa de aumentar. Cuidado. Nunca ouviu dizer que a “fome não tem lei?...”
Todos nós sabemos que o mal vem de trás. Mas o exemplo deve vir de cima. E não vem... Os esbanjamentos não param. Disfarçados, é certo, mas continuam. Aos pequenitos já nem o cartão de eleitor lhes vale, pois por mais que escolham, menos acertam. É indiscutível que atravessamos uma crise muito grave. Porém, são sempre os que menos têm e que mais precisam, que a pagam... E o senhor Ministro, mais uma vez, exemplificou bem essa dolorosa, imoral e triste realidade!...
domingo, março 30, 2008
Sorria
Para mim, o remédio para andar sempre bem-humorado consiste em aceitarmos as coisas tal como elas se nos apresentam fingindo que era assim que nós as desejávamos. Penso também que se o homem das cavernas tivesse sabido rir, a História teria tomado um rumo muito diferente.
Até mesmo o nosso primeiro Rei se em vez das palavras feias que dizem ter dito à mãe soltasse uma estridente gargalhada, estou certo que a nossa gasolina não estaria tão cara e Zapatero teria tido mais votos nas últimas eleições!
Perante toda esta balbúrdia e insubordinação que alastra por todo o rectângulo só há uma única arma para lhe fazer face – o riso! Só com uma espontânea gargalhada se pode fazer frente a todas estas "criancices" da nossa gente graúda.
A antiga maneira de dividir a nossa fauna em bons e maus, sinceros e falsos, velhos e novos, sábios e analfabetos, passou à história. Agora, cá no cantinho instaurou-se uma nova era com quatro categorias de indivíduos: - os que mandam, os que fingem que trabalham, os que trabalham de verdade, e os "outros".
Na categoria dos que mandam podem incluir-se não só os donos do poder como também aqueles que por misteriosas artes e manhas se tornaram donos e senhores de fortunas incalculáveis. Na categoria dos que fingem trabalhar, estão aqueles cujos salários lhes "caem" na conta logo a partir do meio do mês; na dos que trabalham de verdade, a percentagem não pára de diminuir e segundo as estatísticas é uma classe em vias de extinção.
Restam os "tais outros", que são os mais felizes: - são alérgicos ao trabalho e não pagam impostos. Ou recebem o RMG, ou estão no desemprego. Ambos, normalmente, fazem uns biscates por fora o que lhes permite viver sem problemas. Criticam o governo em casa, batem palmas na rua, mas a sua ideologia tem mais a ver com dinheiro do que com ideias. Riem-se de todos: dos que mandam, dos que fingem trabalhar e dos que trabalham. Dos que mandam, porque lhes comem as papas na cabeça; dos que fazem de conta que trabalham, porque sabem fingir melhor, e dos que trabalham porque, sem nada fazer, recebem ordenado. Um autêntico reino do riso. Por isso ninguém de bom senso pode levar a sério tanto disparate. E como não podemos lutar contra tantos acomodados e tantos comodistas, resta-nos, como arma, o riso. Riamos, pois, e cultivemos o humor. É a única maneira de prevenir, além de outras doenças menores, as perigosas úlceras nervosas e as fatais doenças cardíacas. Em vez de dar murros na mesa, ria à gargalhada, caro leitor. Nem sempre é fácil, eu sei. Mas já pensou que se o dinheiro fosse só para os inteligentes, os bons lugares para os competentes, a popularidade para os honestos, acha que poderíamos continuar a existir como País?!... É a história da carteira e da consciência. Mas não se esqueça que carteira e consciência são coisas bem distintas. É preferível, por isso, sonhar de vez em quando do que ter pesadelos constantemente.
sexta-feira, março 21, 2008
L'Art de vieillir
Vieillir, se l'avouer à soi même et le dire
tout haut, non pas pour voir protester les amis,
mais pour y conformer ses goûts et s'interdire
ce que la veille encore on se croyait permis.
Avec sincérité, dès que l'aube se lève,
se bien persuader qu'on est plus vieux d'un jour ;
à chaque cheveu blanc, se séparer d'un rêve
et lui dire tout bas un adieu sans retour.
Aux appétits grossiers, imposer d'âpres jeunes,
et nourrir son esprit d'un solide savoir,
devenir bon, devenir doux, aimer les fleurs,
aimer les jeunes, comme on aima l'espoir.
Se résigner à vivre un peu sur le rivage,
tandis qu’ils vogueront sur les flots hasardeux,
craindre d'être importun sans devenir sauvage,
se laisser ignorer tout en restant près d'eux.
Vaquer sans bruit aux soins que tout départ réclame,
prier et faire un peu de bien autour de soi,
sans négliger son corps, parer surtout son âme,
chauffant l'un aux tisons, l'autre à l'antique Foi.
Puis un beau soir, discrètement, souffler la flamme
de sa lampe et mourir parce que c'est la loi.
Jean Fabié
tout haut, non pas pour voir protester les amis,
mais pour y conformer ses goûts et s'interdire
ce que la veille encore on se croyait permis.
Avec sincérité, dès que l'aube se lève,
se bien persuader qu'on est plus vieux d'un jour ;
à chaque cheveu blanc, se séparer d'un rêve
et lui dire tout bas un adieu sans retour.
Aux appétits grossiers, imposer d'âpres jeunes,
et nourrir son esprit d'un solide savoir,
devenir bon, devenir doux, aimer les fleurs,
aimer les jeunes, comme on aima l'espoir.
Se résigner à vivre un peu sur le rivage,
tandis qu’ils vogueront sur les flots hasardeux,
craindre d'être importun sans devenir sauvage,
se laisser ignorer tout en restant près d'eux.
Vaquer sans bruit aux soins que tout départ réclame,
prier et faire un peu de bien autour de soi,
sans négliger son corps, parer surtout son âme,
chauffant l'un aux tisons, l'autre à l'antique Foi.
Puis un beau soir, discrètement, souffler la flamme
de sa lampe et mourir parce que c'est la loi.
Jean Fabié
sábado, março 15, 2008
Ave Maria
Ave Maria
Ave Maria
Ceux qui souffrent viennent à toi
Toi qui as tant souffert
Tu comprends leurs misères
Et les partages
Marie courage
Ave Maria
Ave Maria
Ceux qui pleurent sont tes enfants
Toi qui donnas le tien
Pour laver les humains
De leurs souillures
Marie la pure
Ave Maria
Ave Maria
Ceux qui doutent sont dans la nuit
Maria
Éclaire leur chemin
Et prends-les par la main
Ave Maria
Ave Maria, Ave Maria
Amen
Charles Aznavour
Ave Maria
Ceux qui souffrent viennent à toi
Toi qui as tant souffert
Tu comprends leurs misères
Et les partages
Marie courage
Ave Maria
Ave Maria
Ceux qui pleurent sont tes enfants
Toi qui donnas le tien
Pour laver les humains
De leurs souillures
Marie la pure
Ave Maria
Ave Maria
Ceux qui doutent sont dans la nuit
Maria
Éclaire leur chemin
Et prends-les par la main
Ave Maria
Ave Maria, Ave Maria
Amen
Charles Aznavour
sexta-feira, março 07, 2008
Politicamente incorrecto
Politicamente incorrecto
É corrente ouvir dizer – quando alguém se refere à classe política – que cada povo tem os políticos que merece. Admitindo, por hipótese, que a afirmação é verdadeira, que pecado teríamos nós cometido para que Deus nosso Senhor, nos tivesse dado como penitência aturar as traquinices de alguns dos políticos que se sentam nas cadeiras do Parlamento?
Li não sei quando nem em que livro que “a política é como o haxixe que enriquece os que o vendem e embrutece os que o fumam...”
Acho que não pode haver melhor definição para essa “arte”. Os que a praticam percorrem os caminhos da vida em carruagem de primeira classe; os que têm de se sujeitar às suas normas ficam apáticos e embrutecidos devido às exageradas doses de demagogia que inalam sempre que ouvem suas excelências.
Aqueles que na sexta-feira passada viram através da televisão ou leram nos jornais a troca de “mimos” havida entre o Governo e a Oposição (?) devem ter ficado apalermados e ao mesmo tempo esclarecidos quanto à decência, respeito e educação de cada um dos intervenientes na “batalha”. Uma vergonha!...
O Parlamento é, como todos nós sabemos, o espelho da Nação. É ali que se devem discutir os destinos do País, os males de que enferma e os remédios a prescrever para erradicar ou atenuar tais doenças.
Mas o que ali se vê é simplesmente o contrário. Do País não se fala. E se, por acaso, isso acontece, em vez de procurar antídotos para a doença e alívios para o paciente, logo toda a “família” desvia o debate, abandona o interesse nacional e o hemiciclo transforma-se num um lavadouro público.
Insultos, insinuações maldosas, palavras e expressões pouco próprios para o local, enfim, uma falta de decoro tal que, quando vemos, lemos ou ouvimos tais disparates, logo nos assalta uma pergunta: - Com gente desta como pode o País sair do lodaçal em que se encontra?!...
Sem querer entrar pelos caminhos sinuosos e controversos das ideologias,
nem evocar ou elogiar o passado fazendo dele emblema, devo esclarecer que fui criado no tempo em que ainda éramos camponeses. Camponeses pobres, tementes a Deus e educados no respeito àqueles que também se faziam respeitar. E que se respeitavam uns aos outros. Tempos ingratos, esses. Tempos difíceis, de muito trabalho e pouco dinheiro. Mas talvez por isso, de mais respeito, de mais educação, de mais humildade e de menos vaidade e prepotência.
Como é sabido, não morro de amores pela classe política e, por isso, há quem tente, de vez em quando, colar-me nas costas, à sorrelfa, alguns rótulos: saudosista e velho resmungão são os mais frequentes. Podem continuar a chamar-me mais nomes, porque além de ter as costas largas, nem todas as vozes chegam ao Céu, como diz o ditado.
quinta-feira, março 06, 2008
Na velha capela
Em busca de ajuda
É aqui em silêncio profundo,
À luz da lâmpada cintilante,
Que sinto a força dum outro mundo
Que está longe e muito distante…
Além, dentro daquele Sacrário
Que a luz da lâmpada ilumina,
Está simbolizado um Calvário,
Uma força suprema, divina.
Sou indigno de ver-te tão perto
A Ti luz de bondade e amor.
Sou pecador, mas estou certo
Que tens o coração aberto
Para acalentar a minha dor!
13/12/1948
É aqui em silêncio profundo,
À luz da lâmpada cintilante,
Que sinto a força dum outro mundo
Que está longe e muito distante…
Além, dentro daquele Sacrário
Que a luz da lâmpada ilumina,
Está simbolizado um Calvário,
Uma força suprema, divina.
Sou indigno de ver-te tão perto
A Ti luz de bondade e amor.
Sou pecador, mas estou certo
Que tens o coração aberto
Para acalentar a minha dor!
13/12/1948
Para além da Morte...
A dor que lentamente vai minando
Este meu pobre corpo decadente,
É cada vez mais forte, mais pungente,
À medida que o tempo vai passando.
Pouco a pouco meu mal vai aumentando
Num constante minar de corpo doente
Até que o sofrimento me demente
E, pobre louco, a morte vá buscando.
Eu sei como acabar este tormento:
Bastava apenas um dor mais forte
E, logo após… eterno esquecimento!
Um veneno, uma bala, um simples corte...
Que bom morrer assim, em um momento,
Se não houvesse vida além da morte!...
Aveiro, 1948
Este meu pobre corpo decadente,
É cada vez mais forte, mais pungente,
À medida que o tempo vai passando.
Pouco a pouco meu mal vai aumentando
Num constante minar de corpo doente
Até que o sofrimento me demente
E, pobre louco, a morte vá buscando.
Eu sei como acabar este tormento:
Bastava apenas um dor mais forte
E, logo após… eterno esquecimento!
Um veneno, uma bala, um simples corte...
Que bom morrer assim, em um momento,
Se não houvesse vida além da morte!...
Aveiro, 1948
Mulheres da rua
A horas mortas
Por ruas tortas
Elas bocejam…
Esperam confiantes,
Os seus amantes
Que depois as beijam.
Vendendo o seu corpo
Por preço vil
Habitam cabanas
Um triste covil.
Mostram-se se ao mundo
Com prazer
E num beco imundo
Fazem amor
A valer.
Almas tristes
Despedaçadas,
Elas vendem-se
Pelas estradas.
Um dia que passa
Não tem valor.
Despreocupadas
Nuca cansadas
-Tristeza das gentes!...
Brincam inocentes
Com o amor.
quinta-feira, fevereiro 28, 2008
Provérbios
Enganam-se todos aqueles que pensam que tento, através dos meus rabiscos, dar lições de moral ou ministrar a catequese a quem quer que seja. Nada disso. Soube sempre, durante a vida, assumir com humildade a minha ignorância e tento sempre não pisar o risco do círculo que delimita o meu saber. Muitas vezes tropeço em assuntos que mereceriam ser "arejados", mas porque ultrapassam os meus conhecimentos, retiro-os com jeito do caminho, e passo à frente.
Serve, por isso, este preâmbulo, para pôr as coisas no seu devido lugar informando alguns leitores de que os meus escritos não passam de simples e despretensiosos desabafos. Diz o ditado que "quem não deve não teme" e, por tal facto, penso poder expressar o que sinto cá dentro.
Também não escrevo por vaidade ou em busca de protagonismo, pois como diz também outro ditado "se queres viver tranquilo não acendas muitas luzes no teu caminho"... E é o que faço. E como os tempos já não permitem que se use o pau de marmeleiro, remédio antigo, mas eficaz, resigno-me, e aconchego-me bem sossegado no meu cantinho e, de vez em quando, no silêncio da noite, sem incomodar ninguém, entretenho-me a deitar, borda fora, todo este meu inconformismo acumulado. E escrevo. E confio ao papel o que me vai na alma…
Hoje, por exemplo, ao ouvir as reacções dos vários partidos políticos às palavras proferidas pelo Bastonário da Ordem dos Advogados acerca da corrupção, – esse espécie de sarna que grassa pelo País – mais uma vez tive a confirmação, com bastante tristeza, de que caminhamos a largos passos para a decadência total. De uma forma ou de outra todos sacodem a água do capote. Reina a hipocrisia no reino da Papagália. Todos palram, todos se esquivam, e ninguém tem culpas no cartório, embora o "assunto" tenha sido ventilado vezes sem conta. Mas... todos unidos, todos inocentes. Uns santinhos…
Os nossos valores que assentavam nos princípios da Fé Cristã, do Patriotismo e da Família, pouco a pouco, vão desaparecendo. É o preço que temos de pagar pelo progresso, dizem os entendidos. É assim a Democracia, arengam os outros – aqueles que dela se servem para enriquecer sem esforço, servindo-se dos "buracos" nas leis, alguns deixados propositadamente para eventuais "fugas".
E já repararam que esta maneira de governar só defende os interesses do grande capital e vai retirando aos mais pequenos, não só o produto do seu próprio trabalho como também os direitos e regalias conquistados ao longo de séculos? O que será preciso acontecer para que os burocratas do Terreiro do Paço, abandonem os seus gabinetes climatizados onde se fecham para decretar medidas teóricas, e venham conhecer o verdadeiro País?
E por que não vêm?!... Não de fugida, como é hábito, para inaugurar ou reinaugurar uns quilómetros de betão, mas para ficar algum tempo e poderem inteirar-se das reais necessidades de quem vive longe de tudo...
Mas voltando às palavras do Bastonário da Ordem dos Advogados que motivaram este desabafo de hoje, estou certo de que à semelhança do que tem vindo a acontecer há anos com as inúmeras denúncias sobre o mesmo caso, tudo não passará de simples "fumaça", pois os lobos não se comem uns aos outros. E isso durará enquanto houver "caça" miúda que se apanha com facilidade. E já agora, para terminar, permitam-me que cite mais um provérbio, o da semana passada: «É preciso tirar o dinheiro aos pobres. Eles têm pouco, mas são muitos..."
domingo, fevereiro 17, 2008
sexta-feira, fevereiro 15, 2008
Chefes
Chefes
Não sei se conhecem a história. Ela é velhinha como eu, mas vou contá-la outra vez, mesmo que, ao fazê-lo, corra o risco de que muitos não lhe achem graça nenhuma. Mas não faz mal. Ela aí vai…
Era uma vez um homem que entrou numa loja de passarada para comprar um papagaio. Deu uma volta pelo estabelecimento, olhou os vários palradores expostos para venda e dirigiu-se ao encarregado:
- Quanto custa este pássaro aqui, ó amigo? - Esse, respondeu o interpelado, custa 500 Euros. - É caro o passaroco, respondeu o comprador. -E este aqui? - Esse custa 1.000 euros, freguês, retorquiu o vendedor. - Tanta diferença no preço – estranhou o hipotético adquirente. - É que esse tanto fala português, como francês, alemão ou inglês, explicou por sua vez o dono da passarada. - Então e aquele além? - Aquele vai prós 1.500 euros, mas além de falar várias línguas, sabe também atender o telemóvel…
- E o último lá ao fundo, à direita? - Ah! Esse é pássaro para 2.500 Euros!... Ena pá! E o que faz ele para custar assim tanto dinheiro? - Lá isso não lhe sei dizer, respondeu o vendedor. Mas logo explicou: - O que sei dizer é que aqui na loja todos os outros lhe chamam chefe…
Os que acharam graça podem continuar a ler. Os outros, deixem a leitura, mas não joguem o jornal para o chão. Ponham-no no papelão para ser reciclado.
Antigamente, os jornais, no fim de lidos, tinham vários préstimos: ou rasgavam-se em pedaços e levavam-se para a “casinha”onde serviam para aquilo que imaginam; ou guardavam-se para servir de esteira para pôr a fruta no sótão; ou as mulheres que vendiam sardinha de porta em porta serviam-se deles para embrulhar as ditas; ou os merceeiros poupavam o papel almaço e faziam cartuchos onde metiam o arroz que depois pesavam… e havia até quem os usasse para calafetar as portas e as janelas no Inverno. Vejam lá!...
Assim, o jornal, além da leitura e depois desta terminada, tinha ainda muitos outros préstimos, como atrás se exemplifica. Eram outros tempos e os jornais dessa época não traziam tantos “explosivos” escondidos nas suas páginas. Eram, se quiserem, jornais “biológicos”!
Mas voltemos à história que deu origem a este borrão de hoje. E volto aos papagaios e aos chefes, para vos dizer que somos de facto um País de chefes. Muitos chefes. Chefes como o papagaio da história que nada fazem, nada valem, mas que…por artes de berliques e berloques foram promovidos e colaram-lhe nas costas uma etiqueta de chefe. E ele há chefes por todo o lado. E são tantos que qualquer dia não há quem trabalhe, porque chefe é chefe, e chefe não trabalha. E se hoje me lembrei da história, é porque quando ouço os nossos “chefões” falar de produtividade, de profissionalismo, de competição, lembro-me sempre do papagaio do qual o vendedor nada sabia a não ser que lhe chamavam chefe!...
quarta-feira, janeiro 16, 2008
Ladrões
Como já tenho escrito várias vezes, sou ainda do tempo em que os ladrões eram pobres. Se alguns dormiam debaixo de telha, a maior parte tinha de se acoitar sob o vão de uma escada, num canto de uma velha casa abandonada ou num palheiro distante do povoado onde dormitavam nos intervalos dos “trabalhinhos”.
Era difícil a sua vida naqueles tempos!...
Trabalhavam, sobretudo, a coberto da noite e usavam as mais rudimentares ferramentas, enfrentavam os mais variados perigos, não tinham sindicato que os defendesse e acabavam muitas vezes nas masmorras húmidas duma cadeia comarcã. Vida difícil!...
Todos lhes eram hostis e a sociedade desse tempo defendia ferozmente os interesses do roubado e estava-se marimbando com a sorte do autor do roubo.
E isso era uma injustiça flagrante, pois as proezas arriscadas e por vezes perigosas do ladrão em nada se comparavam com a pacatez e indolência do roubado. E injustiça tanto mais grave quanto era certo que o roubado tinha a seu favor, não só as Companhias de Seguros, como a acção da polícia e a cumplicidade dos magistrados. Acrescente-se ainda que os ladrões faziam parte de uma classe onde não existia a palavra “greve”, pois se a “propriedade é o roubo”, sem ladrões desapareceriam os proprietários, os tribunais, os magistrados e seria o crescimento incontrolável do desemprego, coisa de que não se falava então…
Mas, mudam-se os tempos… e tudo isso pertence ao passado. Foram-se os “pés de cabra”, as gazuas, os alicates e hoje basta uma esferográfica para fazer o “trabalhinho”!
O roubo entrou definitivamente nos nossos costumes com regras e até com estatuto de associação. Hoje é o “desporto” mais em voga e o mais lucrativo – os ladrões são ricos e a profissão estende-se a todas as classes. E quanto maior for o furto, mais importância adquire o seu autor. Há até alguns que possuem títulos nobiliárquicos, sem falar das “excelências” e de outros títulos honoríficos que precedem o nome de muitos desses novos profissionais da ladroagem.
E que ninguém tenha dúvidas, porque a este ritmo tudo leva a crer que graças ao avanço das ciências, da tecnologia e às mil interpretações da moral, só terá futuro quem tiver feito estágio ou adquirido um diploma dessa profissão!
Os velhos tempos acabaram… E volto a citar Almada Negreiros: «É tão indecente estar sóbrio no meio de bêbados, com é indecente estar bêbado no meio de gente sóbria…».
Perceberam?!... Se não perceberam, estou às vossas ordens para explicar.
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