As três idades
Todos nós temos três idades: a idade que está no do B. I.
ou no cartão de cidadão, a idade que aparentamos e a idade com que nos sentimos.
Esta última é, sem dúvida, a mais verdadeira, aquela de que
devemos servir-nos para continuar a caminhada. Seguindo esse raciocínio, são
necessários três números para nos definir. Por exemplo, quanto a mim,
considero-me um 90-80-70!
Descodificando: do primeiro número, atribuo metade a cada
perna; o segundo, – que é geralmente o número com que os meus amigos me
presenteiam de vez em quando – penduro-o no espelho só para me divertir com o
outro “senhor” careca e de cara enrugada, que a lâmina de vidro polida
reflecte; o último número, o setenta, é o que se sobrepõe aos outros dois. É o
“combatente” aquele que, sempre vigilante, tenta impedir que o primeiro, o mais
gordo, – o 90 – me esmague sob o seu peso!
E é assim com esta espécie de triângulo numérico às costas,
que continuo a fazer o meu dia-a-dia. Evidentemente que para pôr em prática
esta “filosofia” é necessária a ajuda de vários factores: saúde, tolerância,
paz interior, humildade, boa disposição e, sobretudo muita Fé!
Li há dias num texto de um escritor italiano que a velhice
seria o calvário da vida. Concordei em parte, pois chegar a velho sem saúde,
sem ninguém que olhe por nós e entregue apenas à solidão, deve ser, de facto,
um enorme e triste calvário!
Pelo contrário, ter a sorte de envelhecer com saúde, com uma
boa família por perto e os amigos em redor, é uma bênção de Deus.
É certo que quando olho os lugares vazios dos familiares ou
dos amigos que partiram, há sempre uma dor pungente que me invade. O coração
bate mais forte, mas apenas por uns momentos. Depois, estranhamente,
tranquiliza-se e parece conformar-se perante a inexorável lei da vida.
À dor que me invade nesses instantes ora se sucedem
recordações e saudade, ora me agitam sonhos de esperança que me transportam
para longe – uma viagem em que o mistério do tempo tanto me acusa como me
reconcilia com Deus.
E então é a Ele que me entrego. É a Ele que peço perdão
pelos momentos em que a revolta me dominou e me fez esquecer a Sua infinita
bondade.
E é a Ele que agradeço tudo aquilo que me tem dado até
hoje: alegrias, tristezas, sofrimentos e sobretudo o dom da fé – essa força
invencível que ‘faz cantar os mártires na morte…’
Todas as coisas boas ou ruins que passei na vida foram
lições que aprendi. As ruins guardo-as na memória e as boas, guardo-as no
coração...
Divaguei, e fugi do assunto. Mas vou parar por aqui, porque
os dois últimos conjuntos de algarismos começam já a discutir e podem
zangar-se, abalar, e deixar o 90 a falar sozinho….
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