Em noite de
insónia
Li, há muitos anos, e tantos que
já me não lembro do nome do autor, que «o sono é a antecâmara da morte....» E
será então por isso que os velhos dormem pouco temendo que o tal “fantasma da
gadanha” que incessantemente lhes ronda a porta, os apanhe desprevenidos e os ceife no meio de algum sonho
cor-de-rosa?...
Não sei. Mas, a mim, não é o medo
que me sobressalta, nem o pressentimento de qualquer coisa ruim que se aproxime
e me possa fazer mal. Não é nada disso, porque a lei a que temos de obedecer
tem a assinatura de Deus. E basta-me essa convicção para não ter medo...
Mas durmo pouco. Talvez porque o
corpo já não precisa de tantas horas de repouso. Acordo muitas vezes a horas
mortas, olho o relógio, e quando a manhã ainda vem longe e o sono teima em não
voltar, parece que as horas se tornam ainda mais compridas... Lá fora tudo é
silêncio e quietude!
Até o relógio da torre em que
outrora a maçaneta martelava o sino, e as badaladas nos iam avisando da
passagem do tempo, está agora calado, emudecido, porque na sociedade moderna a
lei a isso obriga. São noites de insónia, de angústia, de temores.
De vez em quando, no sossego
nocturno, até os estalidos da madeira dos móveis, lembram alguém que bate à
porta, que quer entrar, que quer fugir da noite. Também a brisa fria que sopra
lá fora, faz rodopiar as folhas que se deslocam, e cujo barulho se assemelha a
passos de gente que se aproxima. E imagino a escuridão misteriosa e
imprevisível. Ao longe, o uivo de um cão traz de volta crendices e medos de
infância...
E é nessa espera infindável que
invejo os santos! Invejo-os, porque no seu isolamento, todos os medos se diluem,
e os altares servem de cama, pois é lá que adormecem as almas que estão em paz
com Deus.
Noites longas, infindáveis,
silenciosas...
Porém, quando esses silêncios
trazem consigo recordações, então, de olhos fechados, deixo-me levar nas asas
do pensamento. E como o sonho alimenta o gosto pela vida, ando às voltas dentro
de mim, percorro caminhos já percorridos, visito locais já visitados, recordo,
volto atrás, vou ao sótão, revolvo montanhas de pó, sempre na esperança de
encurtar as horas. E continuo rodando pelos caminhos da vida, ora subindo, ora
descendo, ajudado por um sorriso ou travado por um lamento.
De repente, no silêncio da noite,
um galo cantou... Abro os olhos e por uma frincha da persiana, o espreguiçar da
manhã anuncia-se por um fio de luz que beija a renda do lençol. Acabou-se a
noite. Mais um dia...
Não obstante os defeitos que me
pesam na alma e os pecados que antes de me penitenciar envenenam os dias de
angústia, cada amanhecer reforça mais a minha fé, e faz de mim um homem
verdadeiramente feliz!
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