segunda-feira, agosto 17, 2009

RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - A partida





A PARTIDA NO NAVIO MISTO “AMBOIM”

O Congo belga, na década de 1950, mercê do seu desenvolvimento devido à exportação dos seus produtos – marfim, borracha, café, cacau, óleo de palma, diamantes, cobre, cobalto, zinco, estanho, ouro, madeiras e outros produtos, era um dos países da África tropical com o mais elevado nível de vida.
A sua população, constituída por bantos, sudaneses, pigmeus e cerca de 200 grupos étnicos, na sua maioria pertencentes a crenças animistas, além de numerosos católicos e protestantes, rondava os 34 milhões e espalhava-se por uma superfície de cerca de 2.345.000 Km2.
Nessa altura o país gozava de uma tranquilidade absoluta e até 1959, podia viajar-se por todo o território, quer através de "estradas" de terra batida bem conservadas, transpondo pontes construídas em madeira, atravessando rios por intermédio de jangadas, quer pelos barcos da Otraco (Office des Transports Congolais) que chegavam aos sítios mais importantes, ou por avião. Não existia qualquer hostilidade para com o viajante e as populações autóctones recebiam-nos sempre com bastante carinho e alegria.
A bordo do navio misto Amboím, deixei Lisboa, numa tarde triste de Outubro. Rumámos ao porto de Leixões onde passámos uma noite com o mar tão agitado que não consegui pregar olho.
Partimos um dia depois, e durante 20 dias, até Luanda, não vimos terra! A bordo, quase todos os passageiros faziam a sua primeira viagem por mar. E, consequentemente, poucos foram os que não "deitarem a carga ao mar".
O apetite era pouco e a comida também não era famosa. Foi, pois, com grande alegria que acostámos ao porto de Luanda, onde me esperava o Duarte que fazia a tropa num quartel da capital angolana. Abracei-o com alegria, pois crescemos juntos, brincámos juntos, fizemos diabruras juntos e, além disso, éramos primos.
Desde que tinha saído de Lisboa, não mais tinha comido refeição que me soubesse! Por isso no dia do desembarque, na messe dos oficiais, para onde o Duarte me tinha convidado, o almoço foi divinal! Um ágape de deuses!... Foi a primeira vez que comi papaia! Que adorei...
Depois de ter passado alguns dias em Luanda à espera do dia em que o avião que fazia a ligação Luanda-Leopoldville chegasse, lá embarquei rumo à capital do Congo belga – Kinshasa.
No mesmo voo seguia Fernando Curado Ribeiro, que ia tomar conta dos programas em português emitidos então pela Rádio da capital. Recordo-me que trocámos impressões sobre várias coisas, mas o que mais nos preocupava eram os mosquitos!...
Nessa época, a febre da malária era muito temida e todos receavam a picada do famigerado mosquito anófele.
Recordo que nesse tempo todas as camas eram cobertas com um mosquiteiro para evitar os seus "ataques" nocturnos.
O avião aterrou no antigo aeródromo de Ndolo quase dentro da cidade. Ali me esperavam dois sócios da Companhia que me tinha contratado – a Macodibe.
Publicado no Jornal de Tondela, Edição 910 de 25-9-2008

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