segunda-feira, agosto 31, 2009
P A U S A S
Como já muitas vezes aqui tenho escrito, somos um povo com uma mentalidade ímpar e com uma filosofia de vida difícil de igualar. Choramingas, trapaceiros, invejosos, fingidos, bazófias, manhosos, todos esses papéis sabemos desempenhar como nenhuma outra raça!
Dizem que somos um povo mandrião, mas isso não é verdade. Se mais não trabalhamos é porque o subsídio de desemprego e outros que tais, asseguram uma vida repimpada, sem que andemos a dar o corpo ao manifesto…Aliás, o que a malta quer é emprego, trabalho não...
Mas como já não bastasse a vida folgada de grande parte dos indígenas cá do rectângulo, acrescentou-se e legalizou-se esse tal “descanso” e pôs-se-lhe o nome de “férias”.
E há uns anos a esta parte, como de um preceito evangélico se tratasse, todos se tornaram cristãos, e adoptaram-no. Não tanto por convicção, mas porque parece ter-se convencionado que quem não fosse para fora, mesmo cá dentro, não era cidadão de corpo inteiro.
E então, mal se cumprimenta o amigo, a pergunta já está na câmara, pronta a disparar: - «Então que tal essas férias?!...»
Se o indígena responde que não, que é coisa que não faz ou que não pode fazer, logo o perguntador, armado em conselheiro, lhe explica a vantagem desses período de lazer: - «Olhe que as férias fazem bem à saúde, ao espírito; faz bem fugir de tudo isto, mudar de ambiente...»
É verdade que não só o corpo como o espírito necessitam de um repouso, de uma paragem, para retemperar forças e arejar ideias. Só que as férias de hoje, em muitos casos, em vez de descontraírem, aumentam ainda mais a tensão do dia-a-dia.
Salvo raras excepções, muitos regressam de férias mais fatigados do que quando foram... Mas como é moda e não se pode ficar atrás do vizinho, haja o que houver, fique o que ficar, haja ou não posses para o fazer, há que "fugir", fazer a trouxa e ir até qualquer parte. De preferência até à praia. As filas, o calor, nada disso conta, pois que férias são férias e é até de bom-tom e confere uma certa importância ir de férias. Há ainda quem goste de "emoldurar o estatuto"e atravesse mares, e rume a lugares paradisíacos e exóticos onde gastam pipas de massa e ingurgitam, toda a espécie de mixórdias, gabando-se depois de terem gozado à farta e de terem comido manjares divinais!...
Apesar de toda esta “má-língua” já devem ter percebido que eu não sou uma excepção à regra e que também vou de férias!
Quando Algarve se escrevia só com um L, costumava ir para a “Praia dos Tomates”, que na altura estava na moda, e era frequentada quase só pelos graúdos. Agora como já tem nome estrangeiro, fico-me pela “Praia dos Nabos”. É mais genuína, mais portuguesa… e mais barata.
Até ao meu regresso «façam o favor de serem felizes», como dizia o nosso saudoso e inesquecível Raul Solnado, que Deus haja…
domingo, agosto 30, 2009
MARCAS
No interior daqueles que chegaram a homens sem nunca terem sido meninos, há marcas do passado que jamais se diluirão e que acabam, mais tarde, por servir de lenitivo, de compensação e até de refúgio, sejam quais forem os sobressaltos e os desencontros das nossas vidas. Por mais que queiramos não conseguimos nunca apagar esses traços, essas pegadas que marcaram o começo da nossa existência.
Há sempre um episódio que perdura eternamente – uma vontade insatisfeita, uma aspiração que realizámos, um castigo injusto, uma paixão infantil, um sonho que se desfez e muitas esperanças também!
E é quando a caminhada já vai longa, quando a intensidade das paixões diminuiu, quando as horas deixaram de nos escravizar e as modernas encruzilhadas da vida nos confundem, é então que procuramos o tal refúgio. E nele reflectimos, meditamos, analisamos e, quase sem querer, voltamos atrás e recordamos...
E é nesses momentos mágicos, quando o silêncio impera e refreia o pensamento, que a imaginação, à rédea solta, viaja no tempo, segue as pegadas e perde-se no sótão poeirento das nossas memórias...
Mas nem sempre o reencontro com o passado é pacífico. A vida não volta à infância e muitas vezes as lutas que interiormente travamos por querermos adaptar a aiveca do arado à moderna charrua do tractor, só nos trazem desgostos e frustrações. São lutas inglórias...
É que a diferença entre os marcos de pedra do passado e as balizas electrónicas do presente é abismal. Incomensurável!...
Protagonista dessas pelejas, muitas vezes, mesmo antes de começar, deponho as armas, tão diferentes se me afiguram os métodos do combate e as armas do "inimigo"!
Ademais, não se pode parar o tempo. Temos de viver uns com os outros e é difícil escapar às atmosferas sociais do tempo que passa. Sem renunciar ao passado, tento ser homem do presente. Mas sempre com a aldeia de antigamente a pular-me no coração. Aquela aldeia de olhos postos em Deus, em que se fechava um negócio com um aperto de mão e uma palavra de honra. Foi nesse mundo que me fiz homem, que aprendi a partilhar, que aprendi a cumprir a doutrina da solidariedade, do respeito mútuo, da lei da honra. Ali interiorizei para sempre o valor da amizade e a cultura dos princípios da moral sem necessidade de folhear volumosos livros nem estudar complicados tratados de filosofia política ou outra.
Diz-se que a maior parte dos velhos vive de recordações. É natural que assim seja, pois quando já não se pode conservar a alegria da infância e a embarcação começa a desmantelar-se de tanta tempestade ter enfrentado, há que construir outra... Uma espécie de jangada feita com os pedaços mais resistentes que escaparam do naufrágio e vogam ao sabor das ondas traiçoeiras deste mar imenso que é a vida.
segunda-feira, agosto 24, 2009
OS MISSIONÁRIOS DA "MILL HILL" EM BASANKUSU
A Diocese de Basankusu foi criada em 28 de Julho de 1926 pelos missionários de Mill Hill, oficialmente denominada Sociedade Católica “São José para as Missões Estrangeiras”.
Era uma congregação de missionários, sacerdotes e leigos, que se dedicavam à propagação do Evangelho entre os povos não evangelizados.
Foi fundada em 1866 em Mill Hill, no noroeste de Londres, por H. Vaughan que desempenhou um papel importante no Uganda em 1894 quando se tornou um protectorado britânico.
Esta congregação espalhou-se por toda a África, sobretudo no ex-Congo Belga na província do Equador, situada a noroeste do país, confinando a noroeste com a República do Congo Brazaville, a oeste com a República Centro Africana. A capital da província do Equador é Mbandaka, ex – Coquilhatville.
Em Basankusu ergueram uma catedral da qual falarei mais à frente…
segunda-feira, agosto 17, 2009
RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - A partida
A PARTIDA NO NAVIO MISTO “AMBOIM”
O Congo belga, na década de 1950, mercê do seu desenvolvimento devido à exportação dos seus produtos – marfim, borracha, café, cacau, óleo de palma, diamantes, cobre, cobalto, zinco, estanho, ouro, madeiras e outros produtos, era um dos países da África tropical com o mais elevado nível de vida.
A sua população, constituída por bantos, sudaneses, pigmeus e cerca de 200 grupos étnicos, na sua maioria pertencentes a crenças animistas, além de numerosos católicos e protestantes, rondava os 34 milhões e espalhava-se por uma superfície de cerca de 2.345.000 Km2.
Nessa altura o país gozava de uma tranquilidade absoluta e até 1959, podia viajar-se por todo o território, quer através de "estradas" de terra batida bem conservadas, transpondo pontes construídas em madeira, atravessando rios por intermédio de jangadas, quer pelos barcos da Otraco (Office des Transports Congolais) que chegavam aos sítios mais importantes, ou por avião. Não existia qualquer hostilidade para com o viajante e as populações autóctones recebiam-nos sempre com bastante carinho e alegria.
A bordo do navio misto Amboím, deixei Lisboa, numa tarde triste de Outubro. Rumámos ao porto de Leixões onde passámos uma noite com o mar tão agitado que não consegui pregar olho.
Partimos um dia depois, e durante 20 dias, até Luanda, não vimos terra! A bordo, quase todos os passageiros faziam a sua primeira viagem por mar. E, consequentemente, poucos foram os que não "deitarem a carga ao mar".
O apetite era pouco e a comida também não era famosa. Foi, pois, com grande alegria que acostámos ao porto de Luanda, onde me esperava o Duarte que fazia a tropa num quartel da capital angolana. Abracei-o com alegria, pois crescemos juntos, brincámos juntos, fizemos diabruras juntos e, além disso, éramos primos.
Desde que tinha saído de Lisboa, não mais tinha comido refeição que me soubesse! Por isso no dia do desembarque, na messe dos oficiais, para onde o Duarte me tinha convidado, o almoço foi divinal! Um ágape de deuses!... Foi a primeira vez que comi papaia! Que adorei...
Depois de ter passado alguns dias em Luanda à espera do dia em que o avião que fazia a ligação Luanda-Leopoldville chegasse, lá embarquei rumo à capital do Congo belga – Kinshasa.
No mesmo voo seguia Fernando Curado Ribeiro, que ia tomar conta dos programas em português emitidos então pela Rádio da capital. Recordo-me que trocámos impressões sobre várias coisas, mas o que mais nos preocupava eram os mosquitos!...
Nessa época, a febre da malária era muito temida e todos receavam a picada do famigerado mosquito anófele.
Recordo que nesse tempo todas as camas eram cobertas com um mosquiteiro para evitar os seus "ataques" nocturnos.
O avião aterrou no antigo aeródromo de Ndolo quase dentro da cidade. Ali me esperavam dois sócios da Companhia que me tinha contratado – a Macodibe.
Publicado no Jornal de Tondela, Edição 910 de 25-9-2008
domingo, agosto 16, 2009
RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - Explicação aos leitores
A respeito das notas que temos vindo a publicar sobre África e porque convém conhecer, ainda que resumidamente, esse território africano de que se fala, segue-se um pequeno texto assinado por Elisée Bj’elongo e publicado em Esperanto na Revista holandesa “Kontakto”e traduzido pelo Clube de Esperanto de Campos (Brasil) sob o título “Como nasceu a República Democrática do Congo”:
«Tudo teve início no começo do século XIX, quando o mundo começou a interessar-se pela África. Por volta de 1850 o Congo independente atraiu o interesse de povos da raça branca, principalmente alemães, que vieram à procura de minerais e para fins comerciais. Durante a Conferência de Berlim em 1884/1885 o Congo foi doado à Bélgica, que explorou o país como quis. Os cidadãos deviam trabalhar à força. Pouco a pouco a coisa tomou outro rumo. O Congo tornou-se propriedade do rei Leopoldo II. Ele apropriou-se do Ruanda-Urundonusumburam, que veio a ser posteriormente Ruanda e Burundi. Essas duas últimas dependeram, principalmente, da cidade de Leopoldo (actual Kinshasa), para sua administração. Quanto mais a cidade de Leopoldo prosperava, mais o rei Leopoldo enriquecia. Felizmente, ele era muito trabalhador e construiu muitas cidades bonitas. A cidade de Leopoldo tornou-se uma das maiores e mais bonitas cidades da África daquela época. Construíram-se não só muitos apartamentos para missionários, mas também muitas escolas primárias e secundárias.
Como aconteceu a Independência
Até aos anos 50 do século XX o Congo tinha muitos intelectuais que se interessavam pela política do território. Emery Patrice Lumumba tornou-se primeiro-ministro do primeiro governo independente, cujo presidente era Joseph Kasavubu. Este último, também militar graduado, foi usado pelos brancos enquanto Lumumba lutava ao lado do partido MNC (Movimento Nacional Congolês) pregando o africanismo e exigindo a independência do país. Fundaram-se alguns outros partidos, como por exemplo, o ABACO. Entre outras coisas e pela acção desse famoso cidadão os brancos decidiram, finalmente, libertar o Congo. A 30 de Junho de 1960, foi proclamada a independência do país, que, posteriormente, foi denominado República Democrática do Congo.»
Os acontecimentos e relatos que têm vindo a ser publicados dizem respeito ao espaço compreendido entre 1950 e 1980, data a que deixamos aquele País africano. Embora já o tenhamos feito anteriormente, para uma melhor compreensão, socorremo-nos de notas colhidas em várias fontes, nomeadamente na Wilkipedia.
A região é ocupada na antiguidade por bantos da África Oriental e povos do rio Nilo, que ali fundam os reinos de Baluba e do Congo. Em 1878, o explorador Henry Stanley funda entrepostos comerciais no rio Congo, sob ordem do rei belga Leopoldo II. Na Conferência de Berlim, em 1885, que divide a África entre as potências europeias, Leopoldo II recebe o território como possessão pessoal. Em 1908, o Estado Livre do Congo deixa de ser propriedade da Coroa e torna-se colónia da Bélgica, chamada Congo Belga.
O movimento nacionalista tem início nos anos 50 sob liderança de Patrice Lumumba. Em 30 de Junho de 1960, o Congo conquista a independência com o nome de República do Congo – em 1964 é acrescentado o adjectivo "democrática". Lumumba assume o cargo de primeiro-ministro e Joseph Kasavubu, a Presidência. A maioria dos colonos europeus deixa o país. Em Julho de 1960 eclode uma rebelião contra Lumumba, liderada por Moïse Tshombe. Antes do final do ano, Kasavubu afasta Lumumba do cargo de primeiro-ministro num golpe de Estado. Lumumba é sequestrado e assassinado em Janeiro de 1961. Tropas de diversos países (incluindo o Brasil) são enviadas pela ONU para restabelecer a ordem, o que ocorre em 1963, com a fuga de Tshombe. As tropas da ONU retiram-se em Junho de 1964. Dias depois ocorre uma reviravolta: Tshombe regressa e assume a presidência com apoio da Bélgica e dos EUA. Em Novembro de 1965, ele é derrubado num golpe liderado por Mobutu Joseph Désiré.
Mobutu estabelece uma ditadura personalista, tornando o país um estratégico aliado das potências capitalistas na África. No início dos anos 70 lança sua política de "africanização", proibindo nomes ocidentais e cristãos. Como parte da campanha, muda em 1971 o nome do país para Zaire e da capital para Kinshasa (ex-Leopoldville). Ele próprio passa a se chamar Mobutu Sese Seko Koko Ngbendu wa za Banga, que significa "o todo-poderoso guerreiro que, por sua resistência e inabalável vontade de vencer, vai de conquista em conquista.".
(Excerto do meu caderno “A minha África”)
Publicado no Jornal de Tondela – Edição 909 de 18-9-2008
sábado, agosto 15, 2009
RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - A chegada do barco
A primeira coisa a retirar era o saco do correio. As notícias da terra distante: as cartas (quando vinham...) e os jornais e revistas que embora com atraso (às vezes de um mês!) vinham matar saudades e dizer-nos o que se passava pelo mundo. Era depois a vez de ir espreitar os géneros alimentícios que nos tinham mandado da Sede em Basankusu. Tudo enlatado: bacalhau em embalagens zincadas; farinha em tambores herméticos; latas de leite em pó; latas de várias conservas, sobretudo sardinhas portuguesas; batatas do Kivu numa espécie de cestos que faziam lembrar as folhas da piteira; garrafões de vinho português (nessa altura com a marca "Ródão") e também garrafas de cerveja, de origem belga ou holandesa e que vinham acondicionadas em caixas de madeira que continham 48 garrafas de 75 cl. Era a cerveja que nos refrescava "acudia" ao calor dos trópicos. Bebia-se muita e, muitas vezes, porque matava mais a sede, acompanhava a refeição. O uísque era uma bebida pouco usada no interior e, geralmente, só se bebia à noite após a última refeição.
Procedia-se depois à descarga da restante mercadoria e outros produtos empregados nas várias fabricações: tambores de 200 quilos de soda cáustica, garrafões de 50 litros de ácido fórmico, sacos de cimento, chapas de zinco, etc., etc.
O barco continuava depois a subida até ao seu último porto. Três dias depois voltava novamente para carregar os produtos destinados a consumo do país ou à exportação.
Muitas vezes, sobretudo quando as águas começavam a baixar a estadia do barco era abreviada e o carregamento tinha de ser feito de noite.
Com a caldeira sempre à pressão para fazer mover o gerador cujo holofote, de que já falei, iluminava a margem onde se desenrolavam os trabalhos com vista ao carregamento das barcaças, era grande a azáfama e, muitas vezes chegávamos a casa e só tinha tempo de tomar um duche antes de fazer a chamada do pessoal da extracção da borracha, que tinha lugar entre as 4 e 4 e meia da manhã. Houve um tempo em que o encarregado do sector comercial a residir temporariamente no N'gongo, o Grilo, me acompanhou nessas andanças e era quando acabávamos o carregamento ou descarregamento que levávamos uma garrafa de uísque quase até ao fim!...
Por tudo isso, o barco desempenhava papel importante na existência de todos aqueles que viviam no interior do Congo, um pouco isolados do Mundo. Entre 1950 e 1960, os comandantes dos barcos, todos eles de nacionalidade congolesa e formados por belgas, eram muito competentes e desempenhavam a sua missão com muito saber e honestidade.
Muitas vezes pedi a esses homens que me comprassem e trouxessem da capital livros ou outras coisas de que necessitava e eles sempre o fizeram sem reservas e com desinteresse, exprimindo sempre o seu contentamento por nos serem úteis!
Esqueci os seus nomes mas, pelo menos com dois deles, muitas vezes conversei acerca do futuro do país. Juntos, partilhávamos as mesmas dúvidas quanto à sua independência...
Excerto do caderno “A minha África”
Publicado no J. T. Edição n.º 907 de 04 de Setembro de 2008
sexta-feira, agosto 14, 2009
RECORDAÇÕES DE ÁFRICA - As ligações com o Mundo
Nos meus primeiros tempos de África, entre 1950 e 1953, o único traço de união com o Mundo era o barco da Otraco (Office des Transports Congolais) que, de quinze em quinze dias, fazia o percurso entre Leopoldville e Befori, local até onde o Maringa era navegável.
O barco saia de Leopoldville, escalava vários portos fluviais, entre eles Coquilhatville, Basankusu, Baringa, Samba, Ekukula, Mompono, Ngongo, seguindo depois para Befori.
Era por barco que recebíamos tudo: mercadorias, diversos produtos, alimentação e... correio! Pode imaginar-se, pois, a alegria com que esperávamos o barco. Muitas vezes ele chegava de noite, e se ouvíamos a sirene, era difícil conciliar mais o sono até de manhã, ansiosos que estávamos para saber notícias.
Importa dizer que os barcos eram movidos a vapor e em vez de hélices eram impulsionados por uma espécie de dobadoira feita de tábuas. Moviam-se lentamente e demoravam mais tempo a chegar pois navegavam contra a corrente que era forte. Todos os barcos possuíam dois quartos para passageiros com casas de banho e uma pequena sala. Quem neles viajava tinha que levar mantimentos para a viagem. Um cozinheiro do barco fazia a comida.
Tive ocasião de viajar num deles de N'gongo até Basankusu com minha mulher que se dirigia ao hospital de Basankusu para o nascimento do meu primeiro filho, o Jorge. Foi uma viagem de três dias. De noite e apesar de os barcos terem um gerador e um potente holofote que se acendia logo que começasse a fazer escuro, a navegação não era aconselhada. Então o comandante, um congolês, já com prática e conhecimento do trajecto, fazia a navegação de maneira a que chegássemos a um porto fluvial ao lusco-fusco e o barco ali permanecia durante a noite.
Atreladas ao barco havia duas enormes barcaças onde eram acondicionados os produtos com destino a Leopoldville: borracha, óleo de palma, coconote, café, cacau, copal, etc.
Por vezes, durante a noite acontecia que não conseguíamos dormir motivado pelo barulho dos habitantes das aldeias próximas, que vinham ao barco comprar diversas bugigangas e beber cerveja ou as bebidas tradicionais – o "lotoko", uma espécie de aguardente fortíssima feita a partir da fermentação do milho ou o vinho de palma, obtido através da fermentação do suco da palmeira.
A tripulação do barco fazia também comércio com artigos que traziam da capital e que constituíam novidade para as populações do interior: relógios, espelhos, isqueiros, tecidos, etc. etc.
A viagem no barco durante o dia era encantadora. A paisagem nas margens mudava constantemente e, além de várias aves, entre as quais papagaios, patos, galinholas, os macacos, com as suas piruetas nas árvores que bordejavam o rio, constituíam um espectáculo deslumbrante!
Algumas vezes avistavam-se crocodilos refastelados ao sol nos bancos de areia aqui e ali. Mas voltando à chegada do barco, ela constituía o único acontecimento que vinha quebrar a rotina dos dias que eram sempre iguais.
(Excerto do caderno “A minha África”)
Publicado no J.T. n.º 906 de 28 Agosto 2008
quarta-feira, agosto 12, 2009
OS FILHOS DA "CUNHA"
Os filhos da cunha
Os filhos da cunha são, geralmente, mal preparados, mandriões, e vaidosos. E mesmo quando protegidos por um “canudo” à guisa de bóia de salvação, nem assim conseguem flutuar e disfarçar a sua incompetência.
Os filhos da cunha têm acesso aos tachos mercê da influência de um amigo, de um compadre, de um condiscípulo ou até mesmo da amásia de um primo do presidente ou do director-geral.
Raramente entram por dinheiro, mas a sua entrada fica registada e mais tarde pode ser-lhes pedida uma contrapartida que varia conforme o sexo.
Os filhos da cunha vivem bem, não têm preocupações, dormem a sono solto, não têm necessidade de contar as moedas pretas e, no fim do mês, recebem um salário que não merecem, mas que lhes é devido pelo seu estatuto de funcionários do “Instituto da Cunha”.
Têm gabinete próprio, uma extensão telefónica, uma mesa a abarrotar de papéis que uma filha da cunha lhes traz diariamente. Mas que não consultam… Ali ficam até que os interessados os reclamem. Quando não, catrapus, lixo com eles!...
Os filhos da cunha têm um estatuto próprio e o seu protector ou protectora asseguram-lhes uma impunidade absoluta. Geralmente não entram em conflitos, não trabalham, mas também não têm opinião.
Os filhos da cunha são subservientes e bajuladores na presença do protector, mas críticos e mal-agradecidos na sua ausência.
Os filhos da cunha são, regra geral, adeptos de um clube de futebol da primeira divisão, mas em ambiente desconhecido nunca denunciam, por questões que lhes foram impostas, a sua verdadeira cor clubística – é de bom-tom agradar a gregos e troianos e nunca provocar discussões que conduzam a indagações sobre a maneira como entraram para a Instituição.
Os filhos da cunha, no capítulo da política, usam o método camaleónico: mudam de cor conforme mudam as ideologias – dizem com todos, quer seja com os que estão no Governo, quer com os que lhes fazem oposição. E é por isso que, geralmente, sobrevivem a todas as mudanças de regime embrulhados nas suas capas furta-cores.
Os filhos da cunha não são, no entanto, todos iguais. Uns são mais espertos do que outros. Enquanto uns se acomodam e se contentam com o lugar e vencimento que têm, outros tentam voar mais alto e chegam a atingir grandes altitudes….
Os filhos da cunha são cada vez mais e encontram-se por todo o lado, mas em maior número nas grandes empresas, nas autarquias, nos hospitais, nas direcções-gerais e até mesmo nos ministérios.
É uma “praga” difícil de exterminar, porque muitos deles, entretanto, vão procriando e, assim, os filhos da cunha nunca acabam…
O EMIGRANTE...
Sosseguem os leitores que não vou falar do homem nu que numa das rotundas de Tondela simboliza o Emigrante. Nada disso...
Vou falar, isso sim, dum homem bem vestido, bem cuidado, bem-falante, bem acomodado na vida, e um contador de anedotas que não deve ter rival cá no rectângulo.
Sempre gostei muito de anedotas, mas com uma preferência especial para aquelas que se referem a alguns políticos.
Aliás, os políticos a que me refiro, são já em si uma anedota, pois qualquer dicionário nos diz que ela (a anedota) é a narração rápida dum facto jocoso ou uma particularidade divertida ou imaginária.
E eles (os tais políticos) não passam disso mesmo: são tão divertidos e, sobretudo, tão imaginativos que constroem um mundo à sua medida e maneira, e julgam-se os seus donos e senhores.
Vaidosos e narcisistas é vê-los e ouvi-los a arengar as multidões contando estórias do arco-da-velha...
Nesta espécie de pré campanha para as presidenciais – que até agora se tem centrado mais em ataques pessoais do que na preocupação de salvaguardar o futuro de Portugal – tenho ouvido várias anedotas e historietas, mas a que serviu de mote para esta minha divagação de hoje foi aquela em que o Dr. Soares, numa das suas rondas pelo país e interpelado por um emigrante disse ter sido também, ele, emigrante!...
Não disse onde nem o que fazia, nem se foi a salto ou se partiu apenas com uma mala em cartão.
E também não explicou a razão ou o motivo que o levou a “apoderar-se” de uma palavra cujo significado nada tem a ver com o seu exílio dourado em Paris, se foi esse o intuito que parece ter transparecido da sua afirmação.
Para muitos, o caso pode não ter grande importância. No entanto, para os verdadeiros emigrantes, para aqueles que emigraram por necessidade, que emigraram em busca de melhores dias, que trabalharam duramente para depois regressar e construir casa, e sobretudo para os que depois de muito trabalho dor e sofrimento, perderam tudo, para esses, as palavras do candidato à presidência foram deveras infelizes. E inoportunas…
Por mais sábio que se seja, há coisas com que se não deve brincar – os sentimentos dos nossos semelhantes.
Pessoalmente não gostei que o Dr. Mário Soares usurpasse a palavra. Não gostei da comparação. Talvez não tivesse a mesma reacção se fosse outro político a fazê-lo. Mas dita por ele…
Lembram-se do homem que disse que todos tínhamos o direito à indignação?!...
CARTAS SEM "SÊ-LO"...
Meu Caro Mário Alberto:
Permita-me que o trate assim. Familiarmente. Apesar de não termos andado juntos na escola somos aproximadamente da mesma idade. Penso que tal facto me autoriza a usar esse tratamento.
Resolvi escrever-lhe porque como o senhor disse uma vez “as pessoas têm direito à indignação”. E eu estou indignado com o que têm dito a seu respeito.
Então lá porque o bilhete de identidade está desbotado e as letras começam a sumir-se é caso para nos colocarem no sótão onde só temos por companhia o pó e as teias de aranha?
Anda um homem durante uma vida inteira a fugir das bruxas, a lutar pelo bem dos outros, a libertar os oprimidos, a viajar, a dar conferências pelo mundo fora, a dar lições de austeridade e aulas de política e de repente, querem que calcemos as pantufas e que de charuto na boca deixemos correr o marfim?
Isso é que era bom! Tá bem, tá!...
Por tudo isso, meu caro Mário, apesar de não jogarmos no mesmo clube sinto-me no dever de nesta altura do “campeonato” lhe manifestar a minha solidariedade, porque acho muito bem que prove que a “Brigada do Reumático” a que pertencemos, tem ainda muito para dar.
Andam por aí esses rapazotes a fazer asneiras e nós, os mais idosos e mais fixes, lá porque nos cresceu a barriga e os pés nos pesam, vamos deixar que eles continuem a esvaziar os cofres e a dar com tudo isto em pantanas?!...
Não queriam eles mais nada! A continuar este regabofe e com estes recrutas a esbanjarem tanto, onde iríamos buscar dinheiro para que os “nossos ex-qualquer coisa”continuassem a receber as chorudas reformas e a manter o seus “estatutos” de nababos?
Também o quero felicitar pelo seu sentido de antecipação e ter escavacado e feito em fanicos, alegremente, alguns dos seus compagnons de route e não só…Mas nisso eu duvido que não tivesse havido uma manobra de diversão e até uma certa marosca. Mas adiante!...
Nestas coisas da política conta mais o oportunismo do que propriamente a razão. E também conta muito a aventura!...
E a propósito de aventuras tenho lido quase tudo o que têm escrito a seu respeito e já ouvi até quem encontrasse alguma semelhança entre a sua corrida e alguns episódios do Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha nomeadamente aquele do encontro com os dois “exércitos de ovelhas” que afinal não passavam de dois inofensivos rebanhos de caprinos, mas que mesmos assim foi sovado pelos seus pastores…
Enfim, factos que traduzem bem a inveja daqueles que a gente sabe… Mas isso não conta. Mesmo o Sancho, aquele do conto, do “Quadrado” é trova que o vento leva.
Continue a correr e se não ganhar o primeiro lugar no pódio, pode gabar-se de ter dado uma lição a esses fils à papa novatos e imberbes que andam por aí a fazer de contas que são políticos.
Sim, porque para dizer a verdade, continuamos a viver numa espécie de situacionismo anterior a 1974, embora o disfarcemos com pretensas reviravoltas. Eu pelo meu lado ainda não consegui ver nenhuma revolução moral ou cultural.
O que tenho visto é sempre a mesma coisa: o recrudescimento cada vez maior dos vira-casacas e dos oportunistas.
Consigo, e à terceira, será que isto muda como diz o provérbio?!...
Não voto em si, porque como acima disse, não somos do mesmo clube. Mas pode contar com a minha simpatia, porque fiquei contente por saber que, como eu, há outros velhotes que continuam a ter sonhos lindos…
Publicado no Jornal de Tondela em 03 de Agosto de 2005
CARTAS SEM "SÊ-LO"...
Senhor Governador:
Na impossibilidade de o fazer pessoalmente, porque V. Exa. não iria querer perder o seu precioso tempo com o Zé-ninguém que sou, e também porque apesar de se chamar Constâncio é, no meu entender, uma pessoa bastante “inconstante”, portanto difícil de saber em que “onda” está, resolvi enviar-lhe esta carta.
Sei de antemão que não se dará ao trabalho de a ler, mas o simples facto de a escrever, de extravasar o que me vai na alma, são como que uma espécie de lenitivo, um desabafo para esta mágoa que sinto ao ver desmoronar-se o Portugal que também ajudei a edificar e só Deus sabe com que sacrifícios!
Depois, senhor Governador, cheguei a um ponto que não sei em quem acreditar…
Será que os boateiros (o senhor incluído) têm razão quando dizem que isto de finanças vai mal, ou pelo contrário nadamos num “mar de rosas”, num mar de dinheiro, em que “uns tantos” se podem dar ao luxo de o gastar à tripa forra?
Este aperto do cinto, este sufoco em que a maior parte dos portugueses vive não será a consequência das vossas leviandades, das vossas faltas de escrúpulos, da vossa vaidade, da vossa incompetência e da vossa irresponsabilidade?
A ser verdade o que li nos jornais, admite-se que em ano e meio o Banco de Portugal tenha gasto com a frota de automóveis a quantia de 1,2 milhões de euros?
Será admissível que uma Instituição que deveria dar o exemplo de contenção desbarate tanto dinheiro com popós topo de gama, das mais variadas marcas e com os mais refinados extras para satisfazer a vaidade dos funcionários?
E é honesto também que passados três anos essas viaturas, de elevado preço possam ser adquiridas pelo seu utilizador apenas por dez por cento do custo inicial?!...
Apesar do meu calhambeque ser já do século passado, não foi a inveja que me levou a escrever.
Foi a revolta, a raiva e o desespero ao ver este velho Portugal a afundar-se devido a um punhado de sabotadores que não cessam de lhe fazer buracos no casco, sem que ninguém, com os pés bem assentes na terra, tenha coragem para estancar esta espécie de “hemorragia programada”!
Todos os dias e de todos os sectores o sangue jorra... É uma sangria constante. E ninguém acode ao moribundo. Pelo contrário. Todos tentam sugar até à última gota!
No Parlamento, na altura da apresentação do relatório anual do Banco de Portugal ao ser questionado acerca de ordenados da administração e quando respondeu dizendo «que trazer aspectos pessoais para a discussão seria ter uma visão errado do país», logo deu para ver que o significado do país a que se referiu não era Portugal, mas apenas e só o vosso país, o pais dos vossos interesses pessoais!
Bem sei que não é só nessa Instituição que há “atentados” à pobreza em que o dinheiro deitado pela porta fora, mataria a fome a muita gente. E o que ainda mais me revolta é que não tenho conhecimento de que nenhum desses senhores que quase todos os dias vêm à Televisão dizer que é preciso apertar o cinto, tenha dado o exemplo, prescindindo, em favor dos pobres, de parte do supérfluo que lhe entra pela porta dentro sem grande esforço.
O que digo nesta carta é o que muitos pensam, mas não ousam dizê-lo. Uns, por causa dos seus “rabos-de-palha”, outros porque poderiam prejudicar o filho, a filha, a nora, o genro, o neto, o compadre, eu sei lá que mais, que comem do mesmo gamelão.
E é por isso que há uns tempos a esta parte se têm vindo a formar, paralelamente, duas classes distintas, uma e outra a posicionarem-se nos dois extremos. Se folhearmos a História encontraremos casos semelhantes. Como alguém disse num discurso dos findos de 1832: “Na economia pública um povo não é feliz, ou desgraçado, na razão do muito que paga, mas sim na razão do bom ou mau uso que se faz do seu dinheiro…»
Publicado no Jornal de Tondela em 21-7-2005
CARTAS SEM "SÊ-LO"...
Senhor Professor:
Já uma vez me referi a V. Exa. aquando da inauguração, em Guimarães, da estátua do nosso primeiro Rei, D. Afonso Henriques.
Lembro-me de que na altura – e a propósito de o povo ter acusado Mestre Cutileiro de ter feito “um busto estilizado e não figurativo de um ser humano com uma espada e um escudo” –, fiquei admirado por não terem consultado o Professor, pois como seu biógrafo poderia dar uma ideia sobre as “parecenças” do Fundador.
Descrevi eu então o Professor como um homem multifacetado, polivalente e furta-cores.
Este episódio situa-se em meados de 2001, mas já nessa altura, mesmo que o tivesse adjectivado com o “furta-cores”, nunca pensei que as suas qualidades miméticas fossem assim tão poderosas.
É obra, Professor!...
Mudar de cor tão facilmente e com tanta descontracção, é façanha que não lembraria ao mais prestigiado e ousado camaleão! Mas “Ousar” faz também parte do seu curriculum, já que prefaciou o livro com o mesmo nome da autoria de Garcia Pereira do PCTP-MRPP. Nos primórdios do CDS acompanhei-o e assisti algumas vezes aos seus comícios que eram sempre baseados na democracia cristã – o alicerce do Partido que fundou.
E quem diria então, senhor Professor, que com esse peso e num movimento tão subtil e descontraído, conseguiria dar tamanho salto e mudar-se com armas e bagagem para o lado oposto da barricada?!...
Depois de ter abandonado sem quaisquer escrúpulos, morais ou políticos o Partido que fundou – e naquela sua outra cambalhota na corrida com Mário Soares para Belém, – parece que estou ainda a ver e a ouvi-lo exclamar, que quem não votasse em si era a mesma coisa que votar nos vermelhos!
Que desconcertante e incompreensível é toda esta série de mudança de convicções e de metamorfoses, Professor!
Talvez compreendesse esse mimetismo e essa facilidade de mudar de ideologia e de cor se se tratasse de um jovem ainda com a personalidade em fase de amadurecimento, perdido nesta barafunda de interesses, de vaidades e de ganâncias.
Agora que isso aconteça com uma personalidade que já ocupou altos cargos, inclusive, num Organismo internacional, confesso que nem com sais de frutas consigo “digerir” tão insólito procedimento.
É pena não haver na política uma espécie de “Olimpíadas” circenses onde fossem atribuídas medalhas de ouro aos melhores e mais meritórios e consagrados artistas – aos engolidores de espadas, aos acrobatas, aos contorcionistas, aos equilibristas, aos faquires, aos palhaços…
É pena, dizia eu, pois não faltariam concorrentes e o professor com certeza que não sairia do chapiteau com as mãos a abanar… Talvez até saísse com uma medalha de cada modalidade, quem sabe?!...
Mas falando agora mais a sério, Professor, entristece-me o facto de em cada dia que passa se avolumarem cada vez mais as minhas dúvidas quanto à reposição, no nosso Portugal, da lei da honra tradicional, viril e desinteressada, criadora de homens de um só rosto e de um só parecer, de antes quebrar que torcer…
Um País sem homens de carácter, sem ideal, e dominados apenas pela sede do lucro ou do protagonismo, não pode ter longa vida. Poderá até morrer. E com homens da sua estirpe, não faltarão coveiros para o enterrar.
P.S. Acabam de me informar de que foi nomeado para nos representar no estrangeiro. Um prémio pela cambalhota julgo eu. Será que agora, no novo posto, irá finalmente manter-se firme e hirto ou irá continuar as piruetas até “ousar” atingir o outro extremo?!...
Prudência Professor, pois como diz o ditado, o feitiço pode virar-se contra o feiticeiro….
Publicado no Jornal de Tondela em 06 DE Março de 2005
quinta-feira, agosto 06, 2009
INJUSTIÇAS
Numa notícia publicada na Imprensa de 27 de Julho, passado, podia ler-se que três administradores executivos de uma empresa pública, a Parpública, responsável pela gestão do universo empresarial do Estado, foram contemplados com prémios de gestão referentes ao ano de 2007, no valor de 176,5 mil euros.
Por sete meses de trabalho o Sr. Pires – o presidente – teria recebido um prémio extra de 67.896 euros, enquanto que os senhores Albuquerque e Castel-Branco, foram “recompensados” com a bonita soma de 54.317 euros!
Acrescenta a notícia que a Parpública, que tinha apresentado em 2006 um lucro de 638 milhões de euros, em 2007, não foi além dos162 milhões. Pudera. É que o dinheirinho não é elástico. E com benesses dessa natureza e com outras que, com certeza, se lhes juntaram, não admira que os lucros encolhessem!
Mas lá que vale a pena ser gestor de uma empresa pública, lá isso vale!
E bem vistas as coisas não é preciso saber muita coisa, nem ser craque em matemática para ocupar um desses lugares de excelência. Nada disso. Se a passagem pelo elenco governativo é, muitas vezes, um trampolim para ocupar esse cargo, noutras basta uma cunhazita do ministro, de uma pessoa da sua família ou de um simples cartão da cor do “clube” para ter acesso a esses privilegiados lugares.
Também é necessário ter um coração especial, não ter grandes escrúpulos, nem ouvir muito a voz da consciência e não dar muita importância a essa gentinha que teima em viver com umas miseráveis centenas de euros por mês!
Os problemas desses milhões de gente anónima que trabalhou uma vida inteira, que nunca gozou férias, que enfrentou as inclemências da Natureza, que sobreviveu às ciladas da vida, que comeu o pão que o diabo amassou, não constam do imaginário desses senhores a quem nada falta, que nada fazem, que vivem de benesses e sempre protegidos e acoitados sob a manta do Governo.
Não admira, por isso, e no caso que nos ocupa, que o ministro das Finanças e da Economia, Sr. Teixeira dos Santos tivesse vindo em defesa dos “sortudos”, argumentando que “se o prémio lhes foi atribuído, é porque eles cumpriram as funções para que foram contratados, cumprindo os objectivos que estavam definidos no contrato. O Estado é uma pessoa de bem e respeita os contratos que celebra.”
Com o desemprego a aumentar, a pobreza a disparar, a recessão a espreitar, argumentos como estes põem a nu, de forma inequívoca, os sentimentos morais e solidários das gentes que nos governam!
Tais prémios ou regalias além do escândalo que representam são um insulto, uma ofensa grave, para àqueles que são obrigados a viver com duas ou três centenas de euros por mês.
Por sete meses de trabalho o Sr. Pires – o presidente – teria recebido um prémio extra de 67.896 euros, enquanto que os senhores Albuquerque e Castel-Branco, foram “recompensados” com a bonita soma de 54.317 euros!
Acrescenta a notícia que a Parpública, que tinha apresentado em 2006 um lucro de 638 milhões de euros, em 2007, não foi além dos162 milhões. Pudera. É que o dinheirinho não é elástico. E com benesses dessa natureza e com outras que, com certeza, se lhes juntaram, não admira que os lucros encolhessem!
Mas lá que vale a pena ser gestor de uma empresa pública, lá isso vale!
E bem vistas as coisas não é preciso saber muita coisa, nem ser craque em matemática para ocupar um desses lugares de excelência. Nada disso. Se a passagem pelo elenco governativo é, muitas vezes, um trampolim para ocupar esse cargo, noutras basta uma cunhazita do ministro, de uma pessoa da sua família ou de um simples cartão da cor do “clube” para ter acesso a esses privilegiados lugares.
Também é necessário ter um coração especial, não ter grandes escrúpulos, nem ouvir muito a voz da consciência e não dar muita importância a essa gentinha que teima em viver com umas miseráveis centenas de euros por mês!
Os problemas desses milhões de gente anónima que trabalhou uma vida inteira, que nunca gozou férias, que enfrentou as inclemências da Natureza, que sobreviveu às ciladas da vida, que comeu o pão que o diabo amassou, não constam do imaginário desses senhores a quem nada falta, que nada fazem, que vivem de benesses e sempre protegidos e acoitados sob a manta do Governo.
Não admira, por isso, e no caso que nos ocupa, que o ministro das Finanças e da Economia, Sr. Teixeira dos Santos tivesse vindo em defesa dos “sortudos”, argumentando que “se o prémio lhes foi atribuído, é porque eles cumpriram as funções para que foram contratados, cumprindo os objectivos que estavam definidos no contrato. O Estado é uma pessoa de bem e respeita os contratos que celebra.”
Com o desemprego a aumentar, a pobreza a disparar, a recessão a espreitar, argumentos como estes põem a nu, de forma inequívoca, os sentimentos morais e solidários das gentes que nos governam!
Tais prémios ou regalias além do escândalo que representam são um insulto, uma ofensa grave, para àqueles que são obrigados a viver com duas ou três centenas de euros por mês.
sábado, agosto 01, 2009
QUEM FOI D. JOSÉ MANUEL DE CARVALHO?
D. José Manuel de Carvalho nasceu no Tourigo em 16 de Setembro de 1844. Fez o curso do Seminário em Viseu, onde se ordenou. Frequentou depois a Universidade de Coimbra onde se formou em direito. Em Viseu foi professor no Liceu e deu aulas de teologia no Seminário. Apresentado para o Bispado de Macau em 4 de Fevereiro de 1897, recebeu a confirmação papal em 19 de Abril e em 29 de Agosto embarcou para desempenhar o seu cargo na diocese de Macau-Timor.
Por motivo de saúde foi transferido para Angra em 1901, tomando posse da diocese em 1902.
Um dos últimos actos deste prelado foi uma provisão sobre o quinquagésimo aniversário da proclamação dogmática da Imaculada Conceição em 28-11-1904. Esse Ano Jubilar foi condignamente celebrado em 8 de Dezembro desse ano.
Em 24 de Fevereiro de 1904, faleceu repentinamente. Teve um funeral solene com a participação de uma força militar que deu as descargas do estilo, acompanhadas pelo troar das salvas da artilharia do Castelo de S. João Baptista.
Recorde-se que seu sobrinho, o Cónego Maximino Viegas de Matos Carvalho, foi seu secretário particular e seu testamenteiro. A propósito, diz-se que já D. José Manuel Carvalho sonhava com a criação da Freguesia de Tourigo e teria pedido a seu sobrinho que ajudasse na construção de uma Igreja e um cemitério para que esse sonho se pudesse concretizar.
Um outro pedido de D. José Manuel de Carvalho a seu sobrinho, teria sido a construção da actual Igreja em 1943. Só foi pena que a antiga capelinha a Stº. Amaro, um património do século XVII, tivesse sido destruída!...
A VISITA DE D. XIMENES
D. Ximenes Belo, bispo residente e administrador apostólico de diocese de Díli entre 1983 e 2002 e Prémio Nobel da Paz em 1996, esteve no passado dia 5 do corrente no Tourigo. Na véspera, no dia 4, proferiu em Tondela, no auditório da ACERT uma palestra sob o tema “Os Jovens e a solidariedade: razões para a praticar”, como foi já noticiado neste Jornal.
O motivo da passagem de tão ilustre personagem pela povoação relacionou-se com a vontade expressa por D. Ximenes de visitar o lugar onde nasceu D. José Manuel Carvalho, bispo de Macau e Timor e conhecer os seus eventuais familiares.
Acompanhado pelo director da Escola Profissional de Tondela, Dr. João Carlos Figueiredo, o bispo Emérito de Timor-Leste, chegou ao Tourigo cerca das 10h30 de sexta-feira, dia 5, dirigindo-se a seguir para a casa do falecido Cónego Maximino, hoje habitada por uma sobrinha-neta de D. José Manuel Carvalho, D. Maria da Conceição Matos Carvalho que ali vive com sua filha Maria Teresa e com a neta, Celine.
D. Ximenes Belo teve ocasião de trocar impressões com aquela descendente do Bispo de Macau e Timor, apreciar uma fotografia a óleo e ver vários objectos – o livro de curso, fotografias e peças de louça com o brasão -que foram pertença do seu colega que administrou a diocese de Macau e Timor entre 1897 e 1902, data em que foi nomeado para a diocese de Angra do Heroísmo, onde viria a falecer repentinamente na noite de 24 de Abril de 1904, com sessenta anos de idade.
D. Carlos Filipe Ximenes Belo visitou, a seguir, a Igreja paroquial, mostrando-se sensibilizado com o seu interior muito alegre, simples, mas muito convidativo ao recolhimento interior e à oração.
O almoço foi confeccionado e servido no Centro de Dia reunindo na mesma sala e num ambiente familiar, utentes, professoras e alunos da Escola que surpreenderam o Ilustre visitante agitando bandeirinhas dos dois países, Portugal e Timor, gritando, “Paz, sim, guerra não”.
Sentaram-se à mesa de D. Ximenes Belo, o Director da Escola Profissional de Tondela, João Carlos Figueiredo; o Engenheiro Dinis, em representação do Presidente da Câmara Municipal de Tondela; o Presidente e o Secretário da Junta de Freguesia do Tourigo, Amadeu Ventura, e Célio Viegas, respectivamente; o Presidente da Assembleia do Centro Social do Tourigo, IPSS, Nelson de Matos Almeida; os Senhores Padres Armando Costa e Alcides Vilarinho; a Assistente Social Rita Cardoso e o Presidente e Vice-Presidente do Centro Social, Manuel da Costa e António Costa Ventura, respectivamente.
No final da refeição, D. Ximenes Belo, usou da palavra para evocar a figura do seu colega, D. José Manuel Carvalho e agradecer a maneira simples, mas carinhosa como foi recebido, salientando a ornamentação da sala e o saboroso almoço confeccionado pelas colaboradoras do Centro Social.
O Presidente da Junta de Freguesia disse da honra e da satisfação que sentia por tão honrosa presença, agradeceu e desejou ao Bispo Emérito de Timor-Leste muita saúde e felicidades.
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