Hoje lembrei-me de meus Avós
maternos: de minha Avó Umbelina e de meu Avô Ezequiel. Não me perguntem porquê.
Não sei explicar….
E recreei aquele quadro que
tantas vezes vi: os dois sentados na cozinha onde, na lareira, três panelas de
ferro, daquelas antigas, com três pés, ferviam. De uma delas escorria, pelo seu
bojo, uma espécie de baba, que apagava as brasas quando chegava à pedra da
lareira.
Minha Avó, tenaz em punho,
apanhava-as e metias num pote de barro preto que estava junto a uma arca onde
se guardava a lenha. Terminada a recolha de todas as brasas, minha Avó punha o
testo na panela e, como é evidente, elas apagavam-se e ficavam de reserva para,
no dia seguinte, serem novamente utilizadas juntamente com outra lenha. No
poupar é que vai o ganho…
Num canto, uma trempe que
servia para suportar a frigideira quando havia qualquer coisa a fritar e uma
vasilha em barro preto, a chocolateira, como lhe chamavam, para fazer o café.
Café que era uma mistura onde predominava a cevada. Era interessante como a Avó
preparava a beberagem: enchia o recipiente de água, punha ao lume e quando
estava prestes a ferver, deitava duas colheres da mistura, metia uma brasa
incandescente dentro, tirava, esperava que a borra assentasse no fundo e estava
o café pronto a ser bebido!
Meu Avô cofiava as suas
compridas barbas brancas e parecia absorto na contemplação das espirais de fumo
que subiam, rodopiavam e desapareciam depois pela velha chaminé. A seus pés, a Cartuxa,
a gata já velhinha, dormia tranquilamente.
Numa saleta contígua à cozinha
havia uma enorme mesa antiga com uma grande gaveta onde se guardava a broa e,
por vezes, num prato, um pedaço de entremeada de porco, com muita gordura e que
era um dos manjares de meu Avô. E com que satisfação ele saboreava o petisco.
Chegava do quintal, dirigia-se à saleta, cortava uma fatia de broa e um naco de
carne com o seu canivete que sempre o acompanhava, sentava-se no escabelo já
todo picado do caruncho e dava gosto, então, vê-lo deliciar-se com o manjar,
regado com uma caneca de vinho da sua lavra!
Levantava-se depois, cofiava
as longas barbas sacudindo ao mesmo tempo as migalhas que pudessem ter ficado
da bucha e começava então outro ritual – a feitura do cigarro.
Uma onça de tabaco holandês,
um livrinho de mortalhas, e eis o Avô a enrolar o tabaco no papelinho. Duas
voltas entre o polegar e o indicador, uma passagem com a língua à guisa de cola
pela dobra… e cigarro na boca.
Duas pancadas na rodinha de
metal que roçava a pederneira e pronto… cigarro a arder normalmente.
Meu Avô Ezequiel era um homem
corpulento, que com a sua estatura, longas barbas brancas e o nariz adunco,
fazia lembrar um rabino!
Voltarei brevemente com outras
recordações do meu Avô das barbas…
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