sábado, novembro 29, 2014

EM DIA DE REFLEXÃO


Domingo pardacento e frio. Dia de recordar os que já partiram. Muita gente no Campo Santo. Muitas flores, muitas velas, orações e algumas lágrimas – de saudade e de remorsos também.
Lágrimas verdadeiras e sentidas por aqueles que partiram reconfortados com o carinho dos que ficaram, e de remorsos daqueles que em vida lho negaram…
Refiro-me aos homens e mulheres que em vida viveram sepultados no coração dos familiares como que amortalhados antecipadamente na frieza, na indiferença, no abandono, sofrendo carências de toda a ordem!
A melhor forma de celebrar as pessoas amadas é estimando-as em vida e não através de objectos decorativos de cariz religioso. É na sua vivência do dia-a-dia que devemos tratar com carinho aqueles que amamos.
Infelizmente, na sociedade consumista em que vivemos, as pessoas, a partir de uma certa idade são relegadas para segundo plano e muitas vezes abandonadas pelos seus familiares.
Mas há de tudo nesta multidão que põe flores, que acende velas, que ajoelha junto de campas rasas ou contempla orgulhosamente ricos mausoléus de mármore encimados por doiradas e reluzentes cruzes!
Mas é assim o nosso mundo. Um mundo de fingidos e de hipócritas. De Judas e de falsos Samaritanos.
O que importa é parecer. Mesmo que não se seja nem se possa vir a ser. Não há regras, não há códigos de conduta, nem cartilha que sirva de orientação. Cada qual se rege pelas suas próprias “convicções”… Que não podemos criticar. A liberdade de pensamento e de acção são bens inalienáveis de qualquer cidadão.  
Porém, com o amontoar dos anos aprendi que há sentimentos tão íntimos e pessoais que por uma questão de respeito por nós próprios, devemos evitar de os exteriorizar, guardando-os dentro de nós como pertença só nossa, como é o caso das nossas angústias e das recordações dos que nos deixaram.
E no meio daquela multidão dei comigo a reflectir nas palavras de Santo Agostinho: ‘Flores e lágrimas são alívio dos vivos, mas não refrigério dos mortos…»
Muitas vezes esses arranjos florais não são mais do que manifestações hipócritas à intenção dos vivos. Os mortos não falam, não vêem e é neste dia que muitos tentam “reabilitar-se perante os que ficaram, ofertando flores e choros como compensação de tudo o que lhes negaram enquanto vivos. E a esses basta uma simples cruz para simbolizar como foi a vida… 

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