quarta-feira, janeiro 25, 2012

ÀMANHÃ PODE JÁ SER TARDE...


Eis uma frase que adoptei como lema nos anos 60 e que ainda hoje me serve de guia. Em 1965 escrevi-a num papel e mandei-a copiar para uma chapa de ferro, que depois, e à guisa de brasão, encimei com uma casa em miniatura, no interior da qual coloquei uma lâmpada, que irradia luz.
Como na língua do País onde então me encontrava não existia o til, o copista substitui-o por um acento circunflexo.
Na altura pensei corrigir o erro, mas perante o sorriso de satisfação do “artista” quando me entregou a “obra”, desisti de o fazer. Afinal a gralha até tinha a sua piada, pois o amanhâ com o chapéu ficaria mais protegido das “intempéries” da vida!
Durante anos o “brasão” manteve-se afixado numa espécie de pátio da casa onde habitei. Era um espaço interior a céu aberto, com canteiros de flores e duas buganvílias, uma branca outra vermelha, e numa das paredes a casa do “Jacó”, um papagaio, que me dava os bons dias, mal abria a porta. Era lá que tomávamos o pequeno-almoço naquelas manhãs inesquecíveis de África!
À tarde, quando regressava do trabalho e entrava, o cumprimento não se fazia esperar: “Olá Manel!” – saudava ele numa imitação muito bem conseguida e complementada por várias vénias.
No meu regresso à terra natal trouxe-o comigo, mas não durou muito tempo. Talvez porque a variação do clima o tivesse fragilizado, a coccidiose pôs termo à sua vida. E confesso que a perda daquele velho amigo foi para mim um grande desgosto.
Mas, como tudo na vida, a divisa em questão tem uma história: Logo no início dos meus trabalhos no Continente Negro, e apesar de me encontrar num dos locais mais recônditos daquele País, longe de tudo e de todos, o primeiro dinheiro que ia ganhando, aplicava-o em variados utensílios de casa e em livros. Passados alguns anos pode dizer-se que tinha tudo o que é necessário numa casa -utensílios de uso diário, uma boa baixela, uma biblioteca onde podia esclarecer dúvidas, um rádio, por intermédio do qual, em onda curta, ouvia as notícias da Pátria distante, e até, confesso, coisas supérfluas.
No entanto, muitas vezes privávamo-nos de utilizar o que tínhamos para não estragar ou para, eventualmente, nos acompanhar aquando do regresso definitivo!
Guardávamos tudo quase religiosamente. Até que um dia… ficámos reduzidos à roupa que tínhamos vestida. Perdemos tudo! As convulsões políticas na região fizeram com que ficassem apenas as paredes da casa…
E eis o motivo por que a partir daquela data nunca mais deixei o certo pelo duvidoso, isto é, nunca mais deixei de sorver todos os momentos da vida e sempre que posso,“vivo o hoje como se fosse o último dia da minha vida”, porque...«Amanhâ pode já ser tarde...!»


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