“Chá”
e dinheiro
Reza a História que por volta do século
XVII, a filha do nosso rei D. João IV, ao contrair matrimónio com Carlos II de Inglaterra,
- e a juntar à cidade de Bombaim, na Índia, que levava como dote - levou também
o hábito de tomar chá, hábito até aí desconhecido em terras de Sua Majestade
britânica.
Muito embora tenham sido os ingleses os
"inventores" do chá das cinco, foram no entanto os portugueses que
trouxeram a planta do Oriente e a introduziram na Europa. A princípio, a bebida
proveniente da infusão das folhas do arbusto, era só privilégio das casas mais
abastadas cá do Reino. Tomar chá conferia assim um certo estatuto de nobreza que,
ao longo dos tempos se foi divulgando até que a expressão "tomar chá"
começou a ser sinónimo de educação e boas maneiras...
Estou daqui a ver a cara de escárnio de
alguns leitores que consideram “essa coisa” de etiqueta e boas maneiras como
resquícios do passado, daquele passado que as suas fanatizadas mentes não
admitem seja lembrado!
Bom proveito lhes faça tal
interpretação, mas cá p'ra mim continuo a pensar que a vida social só faz
sentido quando é regulada por princípios de conduta que permitam distinguir o
homem civilizado do homem das cavernas. Não porque ele não mereça o devido
respeito, mas ou se evolui verdadeiramente em todos os sectores da sociedade ou
se continua a comer com as mãos e a limpar o ranho à costa da mão. Recuo em
que, evidentemente, ninguém está interessado...
Mas vem este prólogo a propósito do
"vale tudo" que reina por aí, a começar pela classe dirigente que
chega ao ponto de não saber comportar-se com frontalidade, nem conservar o
aprumo e a compostura que o desempenho dos cargos que ocupa lhe impõe. À mais
pequena escaramuça, estala o verniz, e assistimos, por vezes, a situações
deveras caricatas para não dizer vergonhosas.
O “chá” que se possa ter tomado em
pequeno ajuda muito, mas não basta. É preciso, pela vida fora, continuar a
aperfeiçoar o nosso comportamento e saber enfrentar, civilizadamente, todas as
situações.
Para baralhar ainda mais e usando
armadilhas sofisticadas, apareceu el-rei D. Dinheiro que sem escrúpulos nem
preconceitos se infiltrou em todos os sectores e se tornou senhor absoluto. E
passa-se por cima de tudo e de todos. É uma espécie de salvo-conduto.
Tudo se compra e tudo é permitido.
Compram-se empregos, títulos, nobreza... E até consciências! A afabilidade, a cortesia,
o «bom dia», a «boa tarde», o «se faz favor», e outras formas de civilidade
caíram em desuso. Nada disso interessa. A importância do cidadão passou a ser “avaliada”
ou pelo lugar que ocupa (muitas vezes mal!) ou pela sua conta bancária. O
dinheiro passou a ser uma espécie de lixívia, um tira-nódoas cada vez mais
usado...