Quando
somos surpreendidos com o anúncio da morte de alguém que nos é querido ou de
alguém a quem estamos ligados por laços de amizade, há sempre um espaço de
tempo, um vazio, uma espécie de incredulidade que medeia entre o sonho e a
realidade!...
E
são sempre as mesmas expressões que, espontaneamente nos saem dos lábios: «Quem
diria que isto ia acontecer…» «Parece um sonho!...» «De um momento para o outro
somos nada!...»
Mas
é assim a Morte: imprevisível, traiçoeira e inesperada!...
E
a pensar em tudo isso lembrei-me de uma lenda búlgara que li há anos e que vou
contar:
Diz-se
que certo dia Deus mandou a Morte ao mundo buscar a alma de um pai de família.
A morte pegou do seu gadanho e dispôs-se a cumprir as ordens do Senhor. Bateu à
porta e logo a dona de casa que era muito benfazeja, lhe ofereceu pousada e lhe
pôs a mesa para que comesse.
-
Não preciso de nada! - Respondeu a desconhecida. Venho apenas buscar a alma do
teu marido.
Seguiu-se
grande pranto: - «Ai que fico desgraçada sem pão para os meus filhinhos!» -
bradava a esposa. - «Ai que ficamos orfãozinhos!» - choramingavam as crianças
agarrando-se à Morte e pedindo-lhe que as atendesse...
E
então a morte comoveu-se e deixou-os em paz. Entrou depois no Paraíso,
disfarçadamente, julgando que Deus se esqueceria do recado que dera. Mas o pai
do Céu não tardou a chamá-la a contas: - «Onde está a alma que te mandei
trazer?» A morte desculpou-se a tremer:
-
«Ó Senhor eram tantas as lágrimas e as súplicas das criancinhas que não tive
coração de deixar aquela família em tamanha tristeza e penúria. Lembrei-me que
seria mais acertado tirar do mundo tantos outros que nada produzem e que não
fazem falta...»
E
Deus com o rosto severo mandou de novo:- «Desce ao fundo do mar e apanha a primeira pedra que encontrares...»
A
morte obedeceu e trouxe a pedra. - «Abre-a ao meio e diz-me quem criou o
vermezinho que lá mora?» - «Fostes vós, Senhor!» - «Quem o alimenta?» - «Sois
vós, Senhor!»
-
«Ora se eu cuidei de um vermezinho que se cria no fundo do mar, pensas que me
esquecerei dos filhos dos homens?!...»
E
continuou: - «Doravante serás cega para não veres se são grandes ou pequenos,
casados ou solteiros os que te mandar buscar. Serás surda para não ouvires os
seus lamentos e serás muda para não dizeres ao que vais...»
E
desde então a morte ficou cega, surda e muda e quando chega, vem disfarçada e
ninguém a conhece... Aqui fica a história. E apesar de não passar de uma lenda, ela esconde, debaixo do seu manto de fantasia, uma realidade à qual ninguém pode ficar indiferente.
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