Li, há dias, numa revista da
especialidade, que muito em breve todos os meios de transporte, quer aéreos,
quer terrestres, poderão circular sem a ajuda de qualquer piloto ou motorista.
Não há dúvidas que o futuro pende cada
vez mais para a abstracção e à medida que o tempo vai passando, a tecnologia
avança, fazendo com que, em cada dia que passa, o ser humano seja substituído
por mais uma dessas inovações tecnológicas.
Com as passadas gigantes da robótica e
da inteligência, com toda esta automação como irá ser o futuro, sobretudo, no
que diz respeito ao lugar do homem na sociedade?
Talvez tal facto seja encarado pelos
mais novos sem grandes sobressaltos, mas para aqueles que, como eu, nasceram e
cresceram no tempo dos antigos transportes – como a zorra, o carro de bois, a
charrete e o automóvel Ford T, etc. etc. – confesso, que esses “agentes
digitais inteligentes” me levam a grandes e inconclusivas reflexões!...
E é por isso que quando esta realidade
tecnológica me baralha e me impede de acompanhar a rápida evolução a falta da
possibilidade intelectual de compreender o mundo em que vivo, rebobino o meu
filme a preto e branco, que está ainda gravado na memória, sento-me no velho
cadeirão e assisto ao desfilar das imagens:
E lá está o lavrador de tamancos
manchados com bosta de vaca, aguilhada no ombro, soga na mão, guiando o carro
de bois; o ferreiro de mãos negras e de cara sarapintada, malhando o ferro na
bigorna; o merceeiro de bata cinzenta e lápis atrás da orelha, fazendo um cartucho
de papel almaço e aviando o freguês; o padre vestido a preceito, gola da labita
puída pelo rígido cabeção, conversando com o regedor; o médico, chamado à
pressa, malinha na mão, sempre sorridente, incutindo esperança; o advogado de
falas compassadas e modos afáveis, tentando conciliar dois habitantes
desavindos por questões de extremas em pinhais; a professora, exigente na
aprendizagem dos alunos, fazendo da profissão um sacerdócio; o funcionário
público, de mangas postiças, as famosas mangas-de-alpaca, ainda imbuído dos
verdadeiros princípios da sua missão de servir e o administrador, bota cardada,
conversando com alguns habitantes da aldeia no exercício do seu cargo, mais por
honra do que por dinheiro…
Interrompi a rodagem da velha fita de
celulóide e, recordando as personagens do velho filme, tentei fazer uma
comparação com as da actualidade no seu constante avanço tecnológico.
Impossível!...
E tão impossível como comparar o carro
de bois do Ti Zé Manel com um automóvel sem motorista ou o trabalho do Ti Zé
Ferreiro com um robot da Auto Europa!
Mas nada há que fazer para suster o
avanço da tecnologia, alguma, inibidora da socialização….Mesmo em casa, quando
concluímos que os nossos netos conhecem melhor os seus amigos virtuais do que
os elementos que constituem a família…