domingo, janeiro 17, 2010

É Domingo e chove...


Da minha janela...
É Domingo. Chove. Continua a chover… Um Inverno com muita chuva, dias pardacentos, uns frios outros mornos, mas sempre com esta humidade peganhenta, que nos afecta psicologicamente e nos torna ainda mais deprimidos.
Lembro-me dos Invernos da minha infância e recordo os homens que mesmo com chuva e frio, à força da enxada, preparavam a terra para semear o pão. Homens que com as próprias mãos moldavam a paisagem, reflectindo no quadro vivo da Natureza a sombra da sua presença.
Esses homens sem nome, e as mulheres fiéis e submissas que lhes davam os filhos – filhos lavradores, soldados, marinheiros, pastores, operários e, de vez em quando, um médico, um advogado, um juiz, um engenheiro e um padre que os baptizava, casava, acompanhava, e os absolvia de todos os pecados na hora da morte.
Esses homens que com as próprias mãos, ergueram as suas casas para abrigar e proteger a família dos frios de Inverno e construíram as suas capelinhas onde entronizavam os seus santos.
Esses homens dos quais hoje apenas resta a memória e que enfrentaram com coragem as tempestades da vida da mesma forma que ajoelhava humildemente na capela que construíram.
Esses homens que praguejavam ou rezavam com a mesma naturalidade com que semeavam ou colhiam; que festejavam o nascimento de um filho, que transportavam o andor do Padroeiro, que enterrava os seus mortos com a mesma angústia com que viam as suas colheitas destruídas pelas forças da Natureza!
Hoje, perante todo o progresso, toda a maquinaria moderna, mais admiro essa gente, compreendo a sua gesta heróica, e curvo-me perante todos os seus sacrifícios. Revivo com ela os seus momentos de alegria e de tristeza, porque essa é a herança sagrada que nos legou e com ela a sua presença continua viva em cada parede que lhe sobreviveu, em cada palmo de terra que amanhou e se transformou no pão que a alimentou.
São todos esses homens de então, de todas as madrugadas, de todas as chuvas, de todas as neves, que fizeram do desconhecido a aldeia que hoje habito, que abriram a pulso os caminhos que hoje percorro, ou percorremos todos, nesta aldeia que é Portugal.
É quase meio-dia e continua a chover. Nesta ronda pela infância e adolescência muita coisa ficou por dizer, mas uma vez por outra gosto de revisitar o passado…
Servindo-me das palavras de Margarite Yourcenar: “Quando amamos a vida, amamos o passado, porque ele é o presente tal como sobreviveu na memória humana…”

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