A receita tornou-se corriqueira e anda de boca em boca – “sem uma mudança da mentalidade a coisa não vai lá”. A “coisa”, claro está, é a situação do País.
A frase que passou a emoldurar quase todas as conversas, tornou-se tão democrática que se ouve tanto da boca de um doutorado como da de um simples e iletrado borra-botas.
Somos assim. Somos um conjunto de seres humanos, que embora diferentes têm em comum a mania de dar sentenças.
Somos exímios em dar palpites, os melhores em apontar erros, mas uma manifesta doença congénita faz com que vejamos o argueiro no olho do vizinho e não a trave que temos no nosso.
Mas haverá alguma maneira de modificar esta nossa maneira de ser, esta espécie de mola interior que nos faz saltitar e que transforma cada um de nós numa espécie de faz-tudo?
Somos assim e pronto. Fanfarrões e descomplexados…
Julgamos possuir conhecimentos em todas as áreas – da política ao futebol passando pelas intermédias, medicina, engenharia, arquitectura, literatura, astronomia, ciências ocultas, gastronomia, em todas elas temos sempre que meter o bedelho!
Sobre todas opinamos, damos palpites e até receitas…
Diz-se por aí que temos falta de médicos. Mentira. Num domingo, à saída da missa, queixem-se de uma dor nas costas e logo verão a quantidade de esculápios que anda por aí ao deus-dará e a quantidade de diagnósticos que logo vos farão!
Na política nem se fala. Não há bicho-careta que não critique os ministros. Mais o das Finanças e da Saúde. O primeiro, porque é quem manda no dinheirinho e o segundo, porque, supostamente, é o que faz andar o esqueleto! Os outros apanham por tabela, mas não se livram, no entanto, de que lhes chamem nomes feios muitos deles pondo até em causa questões de maternidade.
E no Futebol? Os doutorados nessa prática são mais que muitos. Fanáticos, sofredores, adivinhos, e todos com vastos conhecimentos na ciência do pontapé. E todos difíceis de consenso… Vão lá dizer a um benfiquista que o Porto é o maior, ou a um sportinguista que o Benfica vai ser campeão!
Por tudo o que fica dito e escrito julgo que a tal mudança de mentalidades, de que muito se fala, nunca acontecerá.
Como acima disse, somos assim e ponto final. Há factores hereditários de que não podemos livrar-nos. Cada um de nós guarda dentro de si uma mistura de genes herdados dos nossos antepassados que tanto nos podem transformar em santos, em heróis, em aventureiros, como em trapaceiros, vigaristas ou corruptos encartados. Como disse um dia Salazar, “felizmente que não temos petróleo…” Se o tivéssemos ainda seríamos pior, penso eu.